Acompanhando o elevado número populacional, a quantidade de pastores
cristãos, principalmente no Brasil, nunca foi tão grande quanto nas últimas duas
décadas. Isso deveria ser considerado maravilhoso, caso representasse um
aumento significativo de mão de obra qualificada no trabalho da igreja.
Contudo, o aumento numérico de pastores tem sido acompanhado de profunda redução
de qualidade. Pouquíssimos pastores sabem fazer uma exegese ou mesmo uma
análise teológico-bíblica sobre algum assunto ou,
ainda, a exposição de um texto do Antigo Testamento à luz de Cristo, a fim de
demonstrar à igreja sua relação com a história redentora, extraindo dele mais
que lições morais. A leitura superficial de comentários
e a repetição mecânica de temas e correntes teológicas substituíram o trabalho
árduo do ministro que deveria compreender a Escritura com profundidade, a fim
de expor cada texto com fidelidade e excelência.
O pastor tornou-se um “marido de aluguel da igreja”, ou
seja, aquela pessoa que faz tudo dentro da esfera eclesiástica: levanta muro,
varre o salão de culto, capina o jardim e realiza trabalhos gerais dentro de um
prédio religioso; toma chazinho da tarde com as viúvas, “jogando papo fora”, a
fim de substituir os legítimos filhos que não aparecem; diz algumas palavras “bonitas”
em velórios, casamentos e cultos; e ouve as pessoas desabafarem no divã
pastoral, sem poder dizer nada que confronte o ego dos pecadores. Em outras
palavras, o pastor tornou-se funcionário de instituições eclesiásticas, ainda
visto como inimigo dos presbíteros e concorrente de outros pastores. Outros
descobrem na política eclesiástica uma espécie de ministério (só não encontram
base bíblica), talvez, na tentativa de tirar o peso da consciência por deixarem
tanto a desejar no pastoreio da igreja local. A igreja, portanto, deixou de ser
um aprisco seguro onde as ovelhas são bem alimentadas e saciadas em sua sede
por Deus, para tornar-se uma empresa religiosa, alvo de olhos ambiciosos e
campo de guerras civis.
Desta forma, o fenômeno em torno do crescimento numérico de
pastores apresenta-se inversamente proporcional ao seu propósito. Ou seja, o
número de pastores cresce, mas as igrejas se enfraquecem. A profissionalização
do ministério substituiu o “homem de Deus”, profundo conhecedor da Escritura
pelo “administrador eclesiástico”, tão envolvido com política eclesiástica que
não sabe mais para o que foi chamado. A psicologização do ministério pastoral
também trouxe terríveis consequências, transformando as pregações em
conferências sobre autoajuda, incapazes de conduzir pecadores a Cristo. Os
prédios são grandes e bonitos enquanto os púlpitos são pequenos e fracos, razão
pela qual a geração não está pronta para dar “razão da esperança” (1Pe.3.15) cristã
perante o hostil mundo acadêmico pagão presente nas Escolas desde o ensino
fundamental até o PhD das grandes universidades. Os púlpitos enfraqueceram-se
produzindo uma geração carente do conhecimento de Deus, razão porque diversos
irmãos têm nos procurado pelas redes sociais, sedentos da Palavra do Senhor.
É interessante observar que o número de pastores cresceu,
mas o número de igrejas não tem acompanhado o crescimento. Não devemos fazer
uma leitura pragmática, mas esse fenômeno demonstra deficiência no sistema
eclesiástico. Lembro-me de ter ouvido há alguns anos que uma igreja em São Paulo teria 22 pastores concorrendo à “vaga” de pastor
efetivo no local. Há uma procura por “estabilidade e conforto” dentro dos
grandes centros urbanos, fazendo com que haja uma desproporção na distribuição
de ministros pelo país. O número de seminários interdenominacionais, também,
cresceu bastante despertando muitos cristãos a começarem a jornada pastoral por
mera emoção (ou por razões erradas). Então, o número de obreiros continua
crescendo inversamente proporcional à qualidade do ministério pastoral.
Portanto, há bastante tempo que me sinto inquieto com a
realidade pastoral dentro da igreja cristã. E, por essa razão, resolvi, ontem, começar a escrever um singelo livro que trate de questões relacionadas com a crise que a
igreja está vivendo, com o fim de ajuda-la a corrigir erros presentes e evitar
problemas futuros. Nosso desejo com a obra é conduzir diversos irmãos à paixão
pelo legítimo ministério, mas, também, levar outros à percepção mais clara de
que Deus nunca os chamou para servir como ministros. Ambas as reações são
positivas tendo em vista que a melhor forma de servir a Jesus é fazendo aquilo
que de fato Ele nos chamou para fazer; enquanto que a consciência equivocada
com respeito ao chamado pastoral (como acontece com as mulheres) traz grandes
prejuízos para a igreja que será obrigada a estar debaixo do jugo de um líder
não vocacionado.
É importante salientar, também, que o propósito do presente
livro não é contar experiências pessoais dentro do ministério, ainda que
algumas sejam importantes para servir como analogias e exemplos práticos
daquilo que a Escritura ensina. Reconheço, não entanto, que as experiências foram
importantes para a produção desta obra, afinal elas formam o contexto
existencial dessas palavras. Todavia, experiências não são normativas para a
vida pastoral e podem variar bastante, assim como foram muitas e diversas as
experiências dos personagens bíblicos chamados para realizar a mesma obra em
contextos completamente diferentes (Isaías e Amós; Pedro e Paulo etc).
Portanto, o livro será abordado a partir da Escritura Sagrada, a fim de que os
jovens aspirantes ao ministério (e os antigos também) tenham uma base
Escriturística sólida para o exercício de um pastoreio bíblico.
Resolvi escrever para aqueles que pretendem começar a vida pastoral, mas, também, espero que os iniciados com um ministério infrutífero reconheçam a necessidade de marcar novo ponto de partida, adotando uma postura bíblica para seu ministério. Não trago palavras de um pastor
idoso contando experiências para jovens aspirantes ao ministério. Meu objetivo
perpassa minha experiência, pois pretendo conduzir o leitor por meio da
Escritura Sagrada, aplicando a Palavra de Deus ao ministério pastoral, a fim de
que o pastoreio seja completamente alicerçado sobre a Bíblia. Portanto,
desejamos conduzir você a Cristo e em Cristo, a fim de que a jornada pastoral
seja excelente não pelo status que porventura possa representar, mas pela
completude do que significa o ministério pastoral dentro da história redentora
até a volta de Jesus.
Quero, ainda, deixar claro que não sou filho de pastor nem
nasci num lar evangélico como muitos outros. Portanto, não convivi com pastores
dentro do seio familiar nem estive adornado por uma vida cristã desde meu berço.
Desta forma, não estou marcado por experiências “traumáticas” relacionadas ao
ministério pastoral nem venho fazer defesa emocional às questões relacionadas
ao episcopado. Hoje sou pastor presbiteriano com um pouco mais de onze
anos de ministério pastoral e meu olhar para o assunto tanto contempla uma
visão externa quanto interna. Todavia, o propósito desse livro não é defender uma classe “profissional”, mas despertar uma reforma na prática desse
sublime ofício chamado pela Escritura de “excelente obra” (1Tm.3.1).
Por enquanto, faço uso de meu blog, Vox Scripturae, para publicar o livro, entendendo ser a
forma mais eficaz de alcançar pessoas no mundo todo (www.voxscripturae.blogspot.com), afinal nosso propósito é veicular o
conhecimento bíblico necessário para que, com a graça do
Senhor, a geração presente (e futura) possa ter bons líderes (principalmente
pastores). Desta forma, poderemos resgatar o tempo em que o ministro era
respeitado (ou perseguido) como “homem de Deus”, pronto para abrir mão de tudo a
fim de conduzir pessoas a Cristo e em Cristo com fidelidade à Escritura Sagrada
e excelência no exercício do ministério.
O livro abordará dez temas dentro do “ministério pastoral”,
abarcando começo, meio e fim da jornada de um pastor. Como o título indica
(Pastoreio bíblico), as palavras são direcionadas para aqueles que estão
aspirando ao ministério pastoral, porém creio que serão, também, úteis para outros líderes.
Dividiremos o assunto em dez capítulos: 1)
Vocação ou emoção?; 2) Pastor
bivocacionado?; 3) Abnegação completa da vida; 4) A voz profética do
pastor; 5) Sabedoria que vem de Deus; 6) Pregações fiéis e excelentes; 7) Ensinando de casa em casa; 8) Administração eclesiástica; 9) Perigos no ministério pastoral; e
10) A aposentadoria do vocacionado.
No primeiro capítulo (Vocação
ou emoção?), trataremos sobre a vocação de acordo com o ensino bíblico de forma que o
chamado pastoral não seja analisado apenas no âmbito subjetivo, mas, sobretudo,
objetivo. Sem a objetividade do chamado, qualquer pessoa pode subir ao púlpito,
criando diversos problemas para a igreja (conforme tem ocorrido em larga escala
em nossos dias). O assunto inclui tanto o legítimo chamado quanto as impressões
equivocadas daqueles que pensaram terem sido chamados, mas não foram. Por
conseguinte, trataremos, também, do equivocado ministério pastoral feminino,
tendo em vista que o problema começa com uma falsa sensação vocacional (ou seja, emocional).
Outro problema que tem crescido dentro da esfera pastoral é
a ideia de que há pastores bivocacionados (Pastor
bivocacionado?). O termo passou a ser instrumento para justificar a divisão
do tempo pastoral com outras atividades (muitas vezes desnecessárias),
contribuindo com a fraqueza ministerial, pois os pastores não têm “tempo para
preparar sermões”. O problema torna-se maior ao fazer de Paulo o grande culpado
desses ministérios “bivocacionados” (autodenominados de fazedores de tendas). Mas,
será que Paulo era “bivocacionado” ou teria usado um recurso temporário para
suprir uma necessidade imediata e, quando sanada, logo voltou a dedicar
integralmente sua vida à pregação da Escritura Sagrada (At.18.3-5)? Portanto, demonstraremos os
equívocos em torno do tema, abordando a integralidade do ministério desde o
tempo dos profetas do Antigo Testamento.
No terceiro capítulo (Abnegação completa da vida), desejamos abordar a vida pastoral como plano de vida
em que o ministro identifica-se com seu ministério, conforme disse Paulo: “em nada considero a vida preciosa para mim
mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do
Senhor Jesus para testemunhar o Evangelho da graça de Deus” (At.20.24). Portanto,
Deus não chama homens para exercerem uma profissão religiosa, mas os transforma
em pastores de forma integral, ao ponto de o ministério ser confundido com sua
vida. Ser pastor faz parte da vida daquele que realmente foi chamado pelo
Senhor e não há como separar isso.
O quarto capítulo (A
voz profética do pastor) tratará da autoridade do pastor como porta-voz de
Deus em sua exposição fiel da Escritura. O relativismo também alcançou as
igrejas, e junto à desvalorização da liderança, faz com que sermões tornem-se
meras opiniões pessoais. Nosso propósito nesse capítulo é resgatar a autoridade
pastoral associada ao ensino fiel da Escritura. Portanto, há dois lados dessa
moeda: multidões dão crédito para qualquer pessoa que se autodenomine pastor,
como se todos fossem obrigados a atender aos ensinos, mesmo errados, desses homens;
por outro lado, ocorre uma grande desvalorização da mensagem fiel como ensino
autoritário para a vida de todo homem. Nesse capítulo, então, queremos
restabelecer a visão correta sobre a autoridade pastoral, a fim de que os
pastores assumam a liderança com firmeza e fidelidade bem como a igreja ouça,
obedeça e respeite a figura pastoral em seu exercício bíblico.
Lembro-me claramente das palavras (infelizes) de um pastor idoso ditas em sala de aula nos dias em que cursei o seminário:
- “O bom de ser idoso é que a idade recebe a culpa por tudo: Quando se diz algo
bom, as pessoas respondem: que homem sábio; e quando se fala besteira elas
dizem: é a idade, já está caducando”. Dois problemas estão ocorrendo: por um
lado, a idade e suas decorrentes experiências tem recebido mais crédito do que
deveriam receber; por outro lado, a figura do ancião está completamente
desacreditada de forma que não é mais símbolo de conhecimento e moderação, mas
de caduquice. No entanto, a Escritura tanto desassocia experiência de
sabedoria, pois está ultima tem em Deus sua fonte primária quanto exige que os
mais velhos sejam modelo e mestres para os mais jovens (Tt.2.2-5). No quinto
capítulo (Sabedoria que vem de Deus),
faremos uma abordagem teológico-bíblica da sabedoria associada à liderança,
jovem ou não, a fim de que os pastores busquem no Senhor a sabedoria necessária
para exercer o ministério pastoral e resgatem a figura do ancião como símbolo
do bom siso.
O sexto capítulo (Pregações
fiéis e excelentes) será uma exortação à fiel preparação da pregação
seguida de orientações para que o pastor possa preparar sermões fiéis e
excelentes, fruto de estudo dedicado e piedoso adornado com uma plena
dependência do Espírito de Deus. Acompanhei diversos seminaristas (e pastores) dentro
e fora de sala de aula e os vi tornarem-se frutos de uma fábrica de pregadores
em série. Ou seja, todos saem pregando do mesmo jeito, com a mesma estrutura,
incluindo os mesmos erros. O sermão, portanto, passou pela revolução industrial,
deixando de ser uma obra de arte tecida com emoção, convicção, experiências e
muito conhecimento da Escritura Sagrada. Hoje, as pregações são a elaboração de
três pontos sobre alguma coisa que nem os pregadores têm convicção, pois
copiaram de algum comentário famoso. Portanto, precisamos resgatar a arte de pregar.
No sétimo capítulo (Ensinando
de casa em casa), trataremos sobre uma parte importante no exercício do ministério
pastoral: a visitação. O conceito e o propósito da visita pastoral perderam-se
na história da igreja. Sem a concepção correta, a visitação tornou-se, em
grande medida, infrutífera. A igreja gosta da presença do pastor no dia a dia e
faz questão de recebe-lo em casa. Todavia, os cristãos não sabem qual a real utilidade
da visita pastoral. Por essa razão, o simples fato do pastor tomar chá da tarde
na casa de alguém é considerado como um exercício pastoral e é bem provável que
essas “visitas” contabilizem a maior parte dos números informados nos
relatórios anuais. No entanto, essa não era a visita pastoral feita pelos
líderes da igreja primitiva, nem por Jesus (Lc.10.38-42). Portanto, mostraremos
qual o ensino bíblico sobre as visitas pastorais, a fim de que os pastores cumpram fielmente o
propósito de ensinar aos cristãos de casa em casa.
O papel do pastor não é administrar, mas pastorear. Todavia,
tornou-se indispensável certa administração nas instituições eclesiásticas,
tendo em vista sua natureza jurídica. Por essa razão, o oitavo capítulo tratará
sobre a Administração eclesiástica,
a partir do ensino bíblico sobre o assunto. Desta forma, poderemos observar os
limites administrativos que o pastor deverá estabelecer para si mesmo, a fim de não ser sobrecarregado com coisas secundárias. Também, desejamos ajudar os pastores a delegar funções dentro da igreja com o fim de que as muitas atividades extras não desviem seu foco:
pregar a palavra e cultivar uma vida de oração (At.6.1-7).
No penúltimo capítulo (Perigos
no ministério pastoral), abordaremos diversas ameaças que cercam a vida do
pastor. O ministro é homem visado pelo império das trevas e pelo mundo pagão,
pois sua boca proclama constantemente a glória de Deus, odiada por Satanás e,
também, pelos ímpios. Portanto, o mundo torna-se um grande campo minado que guarda
ameaças iminentes, exigindo do ministro cuidado constante no decurso da jornada
pastoral. Solidão, por isso, frequentemente é o lar do pastor, pois, como
Paulo, precisa enfrentar certos desafios, sozinho. Nesse capítulo, falaremos de
alguns desafios que podem aparecer no dia a dia da vida de um pastor.
Por fim, no ultimo capítulo, falaremos sobre A aposentadoria
do vocacionado. Não há um tempo certo para o começo do ministério de
alguém, contudo todos terminam da mesma forma: a morte. As instituições, no
entanto, tem mudado essa concepção bíblica definindo limites diferentes para os
ofícios de presbítero e diácono. Nosso propósito nesse capítulo é discutir o
problema à luz da Escritura e, pela graça de Deus, despertar reformas dentro
das constituições eclesiásticas.
O livro será apresentado aos poucos, capítulo a capítulo, e
pode sofrer melhorias à medida que interage com o publico, afinal questões
levantadas pelos leitores podem suscitar interessantes reflexões sobre o
assunto. É indispensável que o leitor leia a Bíblia ao lado do livro com um
coração humilde e sincero, pronto para ser conduzido pelo Espírito do Senhor a
toda Verdade que é a Escritura Sagrada. E esteja pronto para ser confrontado,
pois diante da Palavra de Deus somos despidos, para um verdadeiro conhecimento de si mesmos,
a fim de sermos vestidos com a couraça da justiça de Jesus e adornados com a
santidade do Espírito de Deus. O Senhor abençoe sua igreja!
Obrigado Pastor por essa obra, vou lê-lo e aguardarei pelos demais capítulos. O Espirito Santo ilumine a vossa mente.
ResponderExcluirAmém! Graças a Deus, Carlos! O Senhor te abençoe, também!
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