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sábado, 3 de outubro de 2015

O que Paulo realmente quis dizer em 1Co.11.2-16?

Quero, entretanto, que saibais ser Cristo o cabeça de todo homem, e o homem, o cabeça da mulher, e Deus, o cabeça de Cristo.” (1Co.11.3)

Boa parte da igreja cristã brasileira dispensa o uso do véu nos cultos. Cabe, então, a pergunta: Por que se dispensa o véu? A resposta é praticamente unânime: O uso do véu era um elemento cultural. Contudo, a compreensão de que o véu foi um elemento cultural está, basicamente, associada à inviabilidade de usá-lo hoje em dia. Por isso, outra pergunta precisa ser feita: Quais foram os critérios utilizados para a definição de que o texto é socialmente condicionado? Além disso, será que o texto está se referindo realmente ao uso do véu? O termo utilizado por Paulo para introduzir o assunto é traduzido por tradições (paradóseis), usado tanto para se referir a más tradições transmitidas por religiosos e/ou hereges quanto para apontar as tradições que o próprio apóstolo ensinava às igrejas (1Co.11.2; Gl.1.14; Cl.2.8; 2Ts.2.15; 3.6). Mas, estas tradições são necessariamente ensinos culturais de uma época, ou também podem se referir aos mandamentos Sagrados estabelecidos e praticados pela igreja? Para alicerçar a defesa da prática do uso de coberta na cabeça das mulheres nos cultos cristãos, o apóstolo Paulo faz uso da narrativa da criação (Gn.2) referente a ordem da criação do homem e da mulher, fala da presença de anjos nos cultos cristãos e por fim, faz menção do uso natural do cabelo longo entre as mulheres e o cabelo curto entre os homens, uso este bem conhecido entre os coríntios. Surge, portanto, a dúvida se Paulo teria realizado tal empreitada para fazê-los preservar uma tradição local, conhecida da região com respeito ao uso de véu em culto, uso do cabelo longo ou curto ou se a preocupação do apóstolo diz respeito ao comportamento dos homens e mulheres em suas relações e as implicações deste relacionamento para o bom andamento da igreja de todas as épocas.
Enquanto alguns consideram o texto socialmente condicionado outros têm mantido a interpretação de que o uso do véu estaria sendo ensinado como ordenança divina para todas as gerações, fazendo uso do véu até os dias de hoje. Mas, alguns estudiosos têm apontado para um caminho um pouco diferente considerando mais profunda a preocupação de Paulo e mais amplas as implicações, reconhecendo um caráter moral, referente aos relacionamentos, no cuidado que Paulo demonstra para com a igreja de Jesus e, assim, com a própria glória de Cristo. Uma vez que o cristão deve viver a vontade de Deus, é fundamental que a igreja procure compreender as ordenanças divinas, a fim de praticá-las conscientemente não ignorando nenhum dos mandamentos do Senhor. Mas, também é importante que não se imponha tradições mal compreendidas e pesadas sobre os ombros da igreja, para não tornar a caminhada cristã mais difícil, desnecessariamente. Com este propósito, será feita uma pesquisa exegética no texto de 1 Coríntios 11.2-16, a fim de procurar fornecer para a igreja um respaldo Bíblico consistente para sua prática coerente com a vontade de Deus prescrita em Sua Palavra. Tal empreitada também auxiliará trabalhos futuros fornecendo possíveis critérios para a leitura de textos normativos, a fim de se descobrir se estes são socialmente condicionados ou se são ordenanças supraculturais para a igreja de todas as gerações.
Pretendemos trazer resposta a alguns problemas exegéticos: Por que o uso do véu foi tratado por Paulo somente na primeira carta aos Coríntios? Somente a igreja de Coríntios deveria praticar esse ensino ou era a única igreja que estava ferindo um ensino dado a todas as igrejas? Qual o background histórico da perícope? Qual o sentido da palavra "tradições" (paradóseis) usada por Paulo no início do texto? Há algum indício no texto que o torna socialmente condicionado? Quais critérios devem ser aplicados para se descobrir se ele é socialmente condicionado? Paulo poderia estar se referindo ao uso do cabelo longo em vez de um véu? Paulo usa o termo cabeça numa perspectiva judaica com o significado de autoridade ou numa perspectiva helênica em que cabeça significa fonte? A expressão "ten kefalen autu" (a sua cabeça) no final do versículo quatro é uma referência a Cristo ou ao próprio homem? Caso o texto seja socialmente condicionado, em que ocasiões ele deveria ser aplicado? Ao utilizar, em seus três argumentos, o texto de Gênesis a respeito da criação do homem e da mulher, Paulo não estaria dando fundamento para uma ordenança permanente? Por que Paulo diz que o homem é imagem e glória de Deus, mas que a mulher é glória do homem? O que Paulo quis dizer quando se refere ao uso do véu por causa dos anjos? A que fenômeno Paulo estaria se referindo ao falar de anjos no culto cristão? O termo "ángelos" deveria ser traduzido por anjo ou por mensageiro? Por que Paulo usa o argumento de que é vergonhoso para o homem ter cabelo comprido? Há quiasmos no texto? E se há qual a sua importância para a compreensão do texto?

CONTEXTO HISTÓRICO DA PASSAGEM
Há três assuntos que formam o contexto histórico da passagem de 1 Coríntios 11.2-16, no que diz respeito ao cotidiano das pessoas dentro da sociedade do primeiro século: O uso do véu por parte das mulheres nas cidades do império Romano e entre os judeus; os costumes referentes ao uso do cabelo tanto da mulher quanto do homem; a imagem e voz da mulher em lugares públicos diante da relação desta com os homens. Além do contexto sócio-cultural da época, há também o contexto teológico que fazia parte do corpo doutrinário da igreja do primeiro século. É necessário, então, perguntar: Qual a visão bíblica repassada para a igreja sobre a relação entre o homem e a mulher? E, por fim, surge no versículo 10, uma referência aos anjos ou mensageiros, dependendo da tradução do termo "ángelos". Qual seria a origem da preocupação de Paulo com a presença de "ángelos" no culto, frente ao uso ou não da coberta por parte das mulheres?
Quanto ao uso do véu, Paulo não criou a determinação, mas conhecia muito bem a prática estabelecida socialmente, pois Tarso, a cidade natal do apóstolo, se destacava na observância desse costume Romano[1]. Além disso, esse também era um costume oriental registrado nas Escrituras do Antigo Testamento. Quando Rebeca se aproximava de Isaque, tendo avistado-o de longe, ela se cobriu (Gn.24.15-21). O véu era usado em lugares públicos, representando a honra da mulher, filhas e esposas, debaixo da liderança do homem, o líder do lar. Em alguns lugares o não uso do véu indicava disponibilidade, ou seja, que a mulher estava solteira, à espera de um marido. As mulheres judias não usavam um véu longo, mesmo assim cobriam também a cabeça. Portanto, ainda que a cidade de Coríntios estivesse inserida dentro do contexto Greco-romano, o costume não está relacionado exclusivamente a Roma, nem muito menos era um hábito de pouca data:

As hebreias não usavam véu todo o tempo, como agora é costume em muitas das terras do Oriente Próximo. Usar véu era um ato de modéstia, geralmente a indicar que a mulher não era casada. Quando Rebeca viu a Isaque pela primeira vez, não estava usando véu; porém ela se cobriu com um véu antes que Isaque a visse (Gênesis 24:65). As mulheres dos tempos do Novo Testamento cobriam a cabeça durante o culto, mas não necessariamente o rosto (1 Coríntios 11:5).[2]

Enquanto as mulheres de costume recatado da sociedade se portavam conforme as tradições agindo modestamente, as mil sacerdotisas pagãs da cidade de Coríntios, prostitutas cultuais colocadas à disposição dos pagãos para seus rituais mundanos aos deuses, com os cabelos descobertos realizavam seus rituais histéricos[3]. Desta forma, os cristãos estavam dentro de uma cultura marcada por hábitos bem delineados que caracterizavam cada status social. Conforme CHAMPLIN, mulheres cristãs estavam abusando da liberdade cristã e escandalizando a sociedade. Além disso, segundo o autor: “muitas mulheres dali procuravam imitar as sacerdotisas pagãs em seus oráculos selvagens, que profetizavam com cabeça descoberta, os cabelos despenteados e esvoaçantes, enquanto proferiam seus oráculos frenéticos[4]”. Portanto, se ao fazerem uso da liberdade cristã, as mulheres deixassem de praticar as tradições sociais causariam escândalos e isso dificultaria o avanço do evangelho, criando uma barreira cultural. Mais grave ainda eram aquelas que repetiam os modos frenéticos de agir das sacerdotisas na hora de profetizar e falar em línguas. Esse comportamento criava uma associação indevida com o culto pagão idólatra, escandalizando os irmãos, principalmente os mais novos na fé.
O modo de se vestir, e também de ornamentar o cabelo, das mulheres romanas era razoável, e quanto maior a classe social mais numerosos e finos eram os adereços. Mais caprichosas eram as mulheres egípcias nos ornamentos do cabelo e corpo. As mulheres judias se vestiam com um pouco mais de modéstia em relação às demais e tinham uma vida social mais tímida do que as romanas, natural da cultura judaica. Segundo HURLEY, era costume das mulheres usarem seus cabelos presos em um coque ao invés de soltos[5]. Além disso, quando uma mulher era acusada de adultério seu cabelo era solto como indicação de sua acusação. Caso fosse inocente, o cabelo era preso novamente.[6] O tamanho do cabelo, ainda que variasse bastante, era comumente longo. Em Israel, nos tempos do Antigo Testamento tanto “os homens, bem como as mulheres, usavam cabelos compridos. Absalão (2 Samuel 14:26) e Sansão (Juizes 16:16-19) tinham ambos cabelos compridos.[7]”. Contudo, essa não era a prática comum.
Havia distinção nítida entre o homem e a mulher na sociedade Greco-romana e, também, judaica. Porém, o cristianismo aproximou diversos grupos sociais: escravo e senhor, homem e mulher, grego e judeu, sem, contudo, ignorar a ordem natural estabelecida por Deus com respeito à hierarquia de governo, que desde o Éden foi estabelecida entre o homem e a mulher: Deus criou primeiro o homem; fez a mulher para o homem; se dirigiu primeiro para o homem quando Adão e Eva haviam pecado; responsabilizou o homem pela queda. Portanto, a distância, equivocadamente criada pela sociedade, entre os homens foi retirada, a fim de que somente a vontade original de Deus prevalecesse nas relações sociais: a igualdade ontológica entre o homem e a mulher feitos a imagem e semelhança do Criador; e, a diferença funcional dentro da ordem estabelecida: a liderança masculina. Desta forma, de um lado a igreja estava diante de práticas sociais comuns dentro do império romano, bem conhecidas de todos os gentios que haviam se convertido. De outro lado, os gentios que se convertiam recebiam novos hábitos por meio do ensino cristão. A igreja deveria administrar com sabedoria as duas coisas. Paulo tinha um grande cuidado com respeito ao comportamento dos cristãos perante a sociedade. De um lado deveriam seguir as tradições, os ensinos apostólicos, de outro deveria usar a liberdade cristã com sabedoria para não chocar a sociedade, pois tudo deveriam fazer por amor ao evangelho. Ou seja, nem toda prática social precisava ser recusada, desde que passasse pelo critério de não ferir as Escrituras, mas deveria ser ponderada, visando o amor a Deus, ao evangelho, ao irmão.
A liberdade cristã é abordada por Paulo quando trata das comidas sacrificadas aos ídolos. O cristão pode ou não comer? Ele exorta a igreja a fazer bom uso da liberdade cristã, ponderando tudo pelo amor (1Co.8.1-13; 10.23-33). Paulo ensina a igreja a usar bem sua liberdade com o propósito de glorificar a Deus. E a igreja de Coríntios tinha problemas na administração da nova vida. Ela estava abusando da liberdade cristã, chocando a sociedade, escandalizando irmãos, atrapalhando, assim, a propagação do evangelho, criando barreiras para a evangelização. O ensino era para todas as igrejas, mas a igreja de Coríntios não estava guardando-o como deveria, enquanto as demais igrejas não haviam criado problema sobre o assunto (1Co.11.16). Vê-se o porquê que alguns assuntos somente foram tratados em Coríntios, como o uso de coberta.
Há alguns assuntos que Paulo escreve em todas as suas cartas: a santificação, por exemplo; e outros que são dirigidos especificamente para algumas igrejas ou indivíduos, tendo em vista a necessidade local. Contudo, Paulo jamais deixou de anunciar coisa alguma proveitosa, antes anunciava todo o desígnio de Deus às igrejas (At.20.20,27), pois se preocupava em ensinar tudo a todas as igrejas: “Por esta causa vos mandei Timóteo, que é meu filho amado, e fiel no Senhor, o qual vos lembrará os meus caminhos em Cristo, como por toda a parte ensino em cada igreja.” (1Co.4.7). Vale salientar, que mesmo os assuntos pessoais deveriam ser lidos pelas demais igrejas, como fez Paulo ao escrever da carta a Filemom. Não somente o principal destinatário deveria ler, mas “a irmã Áfia, e Arquipo, nosso companheiro de lutas, e à igreja que está em tua casa” (Fm.2). Coríntios é uma carta com diversos assuntos exclusivos, em relação às demais cartas, e como Paulo trata dos assuntos por questão de necessidade vigente, eles só aparecem em Coríntios porque eram mal compreendidos ou não praticados. Amor, dons espirituais, casamento, culto, ceia do Senhor, comida sacrificada aos ídolos e ressurreição não eram assuntos que somente a igreja de Coríntios deveria se preocupar, contudo esta igreja estava tendo problemas, teóricos e/ou práticos, em sua relação com esses assuntos, o que provavelmente não estava acontecendo em outras igrejas, pelo menos não em grande escala. Desta forma, a coberta foi tratada em Coríntios por necessidade local, mas também era ensinada a todas as igrejas. E, além disso, a carta deveria ser repassada, como Palavra de Deus escrita para todas as igrejas, para ensino de toda a cristandade (Cl.4.15), tornando o ensino conhecido por todos.
Com respeito ao contexto teológico, as igrejas pastoreadas por Paulo eram ensinadas a lidar com submissão e obediência no que diz respeito ao trato para com as autoridades (Rm.13.1-7; 1Tm.2.1-2). Essa relação começava em casa, pois as mulheres deveriam ser submissas ao próprio marido, como ao Senhor, e, como “a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo submissas ao seu marido.” (Ef.5.22,24; Cl.3.18; 1Pe.3.1). Além disso, não deveriam exercer o ministério do ensino na igreja (1Co.14.34; 1Tm.2.11-15). Apocalipse mostra que surgiram mulheres no meio da igreja procurando ter a primazia, se autodenominando líderes, profetizas que criaram problemas no corpo de Cristo ao não se submeterem a liderança masculina (Ap.2.20).
Mas, a afirmação mais intrigante é a menção aos anjos. Encontra-se no livro apócrifo de Enoque, livro conhecido dos cristãos do primeiro século (1Pe.3.18-20; 2Pe.2.4; Jd.6,14), a referência aos anjos que cobiçaram mulheres no período do dilúvio (Enoque 7.1-2) como uma tentativa de explicar o texto de Gênesis 6.2, pois “vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram”. Seria essa a referência que Paulo estaria fazendo ao afirmar que “deve a mulher ter autoridade de cima da cabeça por causa dos anjos”? Se este é o contexto de Paulo, de fato não é fácil responder, pois não há indicações de que o apóstolo fizesse uso do livro de Enoque. Mas, é certo que o livro era conhecido da igreja do primeiro século e essa indicação se encontra em outras das cartas do Novo Testamento supracitadas. Getty vê nessa citação de Paulo aos anjos, uma referência à Gênesis 6:

O véu deve ser usado pelas mulheres por causa dos anjos (1Cor 11,10), então considerados os guardiões da liturgia, talvez uma referência bíblica a Gn 6,1-4, que descreve a profanação do desígnio da criação humana, quando os filhos de Deus desejaram as filhas dos homens e produziram uma raça de gigantes. Essa atrocidade levou Deus a se arrepender de ter criado o mundo e a jurar destruí-lo com o dilúvio. Assim, Paulo raciocina, ao preservar na cabeça a costumeira “marca de autoridade”, as mulheres assumem o lugar que lhes é devido  na liturgia, subordinadas aos anjos que guardam sua ordem. Dessa forma, não há perigo de que as mulheres sejam uma distração, nem para os homens, nem para os anjos.[8]

Na carta aos Coríntios, os anjos são telespectadores da vida humana. Paulo afirma, em 1Coríntios 4.9, a respeito da vida apostólica, que “Deus nos pôs a nós, os apóstolos, em último lugar, como se fôssemos condenados à morte; porque nos tornamos espetáculo ao mundo, tanto a anjos, como a homens.” De outro lado, a igreja haverá de julgar os anjos no dia do juízo final, uma referência, provavelmente aos anjos caídos (1Co.6.3). A relação entre homens e anjos é relativamente próxima.
HURLEY sugere que a menção de Paulo aos anjos seja uma citação das Palavras do Senhor Jesus quando este afirmou que na ressurreição os homens serão como os anjos que não se casam nem se dão em casamento. Os coríntios estariam querendo viver plenamente a nova vida, como se já fosse semelhante aos anjos:

A conduta intimada no capítulo 7, quando colocada ao lado da atenção dada aos anjos por toda a carta, sugere que uma parte do argumento de Corinto pode ter sido baseada nos dizeres de Jesus que "na ressurreição nem casam nem se dão em casamento, mas serão como os anjos "(Mateus 22:30). Sendo como os anjos, não sendo nem homem nem mulher, em Cristo Jesus (Gálatas 3:28), os coríntios podem ter decidido que no evangelho, consistentemente realizado, permite que não há distinção entre homem e mulher. Baseadas nisso, as mulheres iriam deixar seu cabelo para curto no culto de adoração, proclamando assim seu novo estado.[9]

Outra sugestão é dada por MARSH que aponta para a possibilidade de que Paulo esteja fazendo referência a adoração dos anjos que, conforme Isaías 6, também cobrem o rosto em reverência a Deus.[10] O problema, é que somente as mulheres deveriam cobrir a cabeça, e não o rosto, enquanto os homens não deveriam ter qualquer coberta sobre a cabeça. Há várias sugestões apontadas para o contexto teológico dessa passagem. Mas, a análise será realizada adiante. Neste momento, o fundamental é que as possibilidades contextuais tenham sido traçadas.

CONTEXTO LITERÁRIO DA PASSAGEM
I Coríntios é uma das cartas do Novo Testamento que encontra concordância entre os estudiosos sobre a autoria Paulina e seu estilo epistolar. “Questões como estilo literário, vocabulário e conteúdo confirmam a comum autoria de Romanos, Galatas, I e II Corintios.”[11] E mesmo que a autoria Paulina não seja posta em dúvida, alguns estudiosos sugerem que 1 Coríntios seja uma colagem de diversos ensinos paulinos, por causa de sua natureza fragmentada. Contudo, o fato de que Paulo está respondendo ao relatório que chegou às suas mãos explica bem o porquê do caráter fragmentado da carta[12]. A obra é uma carta, uma das mais pessoais do Novo Testamento, e todos os assuntos abordados, como 1 Coríntios 11.2-16, fazem frente as necessidades da igreja. O que se vê, então, é que a igreja de Coríntios tinha muitas e diferentes dúvidas e necessidades, e elas moldaram o conteúdo da carta de Paulo que procurou dar resposta para tudo.

CONTEXTO CANÔNICO DA PASSAGEM
Assim como o restante da Carta de 1 Coríntios, a passagem é uma resposta direta de Paulo a necessidades vigentes da igreja, conforme informações que o apóstolo recebeu. O apóstolo aborda questões bastante pessoais da comunidade que ele havia plantado. Sua abordagem é argumentativa, defendendo por meio de proposições os ensinos que a igreja deveria receber como Palavra de Deus. Não há quiasmos no texto, mas tópicos principais que são desenvolvidos em subtópicos, comumente em três argumentos. Os fundamentos para todos os argumentos estão nas Escrituras do Antigo Testamento e nas Palavras de Jesus repassadas para a igreja por meio dos apóstolos, as testemunhas primárias da vida, ministério e ensino de Jesus. Nos capítulos 11 a 14 de 1Coríntios, o apóstolo aborda diversos aspectos do culto: o uso de coberta, a Ceia do Senhor, o uso dos dons nos cultos públicos, guiado pelo amor, exortando a igreja a fazer tudo com ordem e decência. Paulo recebeu notícias da igreja por meio da carta que ele recebeu das mãos de alguns irmãos de Coríntio, e esta carta não só informava as perguntas que surgiram entre os coríntios, mas também o comportamento da igreja e de alguns indivíduos e grupos. Portanto, a passagem em análise deve ser lida dentro do contexto do culto público, como uma palavra de correção frente à denuncia que Paulo recebeu sobre o comportamento dos irmãos.

JUSTIFICAÇÃO DOS LIMITES E DIVISÕES DA PERÍCOPE
Infelizmente, como muitos outros textos, 1 Coríntios 11.2-16, não foi bem distribuído em versículos. O primeiro versículo do capítulo 11  pertence ao assunto anterior, que trata do bom uso da liberdade cristã, sendo a conclusão deste. Os coríntios deveriam usar a liberdade cristã com amor, assim como Paulo o fazia. Após ter argumentado acerca do uso da liberdade, Paulo lembra aos coríntios que eles viram nele o modelo quanto ao assunto, pois Paulo tudo fazia por amor. Por isso, conclui exortando-os: “Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (1Co.11.1).
O início da nova perícope no versículo dois, do capítulo onze, começa com a conjunção coordenada de transição grega "de" (mas). Há uma mudança de assunto, mesmo que a liberdade cristã ainda esteja sobre a mesa, afinal esse era um dos principais problemas da igreja: o abuso da liberdade cristã. Agora essa liberdade será abordada dentro do culto, conforme as tradições que Paulo havia ensinado à igreja. O apóstolo começa um novo assunto se referindo às "paradóseis" (tradições) que ele havia entregue para a igreja. E para introduzir o assunto, antes de abordar as questões que precisavam ser corrigidas dentro da igreja, o apóstolo primeiramente elogia os irmãos por guardarem várias das "paradóseis" que haviam recebido. Entre duas exortações (1Co.10.23-11.1 e 1Co.11.2-16), Paulo faz um elogio, proporcionando uma suave passagem entre os dois assuntos.
Entre as "paradóseis" que a igreja havia recebido, uma delas estava sendo negligenciada: a questão da coberta que é tratada nos versículos dois a dezesseis. O versículo dezesseis encerra o assunto com um aviso contra aqueles que não gostavam de se submeter aos ensinos apostólicos. No versículo seguinte, em 1Co.11.17, o apóstolo dá início a um novo assunto, agora não elogiando a igreja por causa de seu comportamento com respeito à Ceia do Senhor. Assim, Paulo dá gravidade ao assunto, atraindo a atenção dos leitores, para o que será abordado em seguida. Contudo, o macro assunto ainda é o mesmo: a liberdade cristã dentro do culto público, que só será encerrado apenas no final do capítulo quatorze. Assim, o texto começa com um elogio e é encerrado antes do “não elogio” de Paulo, que iniciará o assunto seguinte. A perícope, então, é delimitada assim: 1 Coríntios 11.2-16

BREVE REVISÃO DE LITERATURA
Não há dúvidas entre os comentaristas de que o contexto no qual as Palavras de Paulo deveriam ser praticadas era o culto público. Contudo, alguns atestam que sua aplicação não está restrita ao ambiente cúltico. É dentro do contexto do culto que Paulo tratará de vários assuntos nos capítulos 11 a 14 de 1 Coríntios. Em sua introdução, o apóstolo louva a igreja de Coríntios “porque lembraram e continuam lembrando tudo de mim, e assim como entreguei para vocês as tradições, estão recebendo”. MORRIS não comenta a estranheza que causa o elogio de Paulo à igreja, tendo em vista as inúmeras exortações que Ele faz aos Coríntios pelo mau comportamento individual (1Co.8.9-13), coletivo (1Co.1.11) e cúltico (1Co.11.17-21), mas CLARK observa bem que a carta menciona muitas faltas da igreja, “incluindo ataques contra o próprio Paulo”[13]. CLARK, então, sugere que alguns pequenos grupos estavam se desviando dos ensinos, mas a maioria era “relativamente fiel”[14] Conforme, SCHREINER, o versículo 2 não se encaixaria em seu contexto a não ser que “funcione como uma introdução de cortesia antes de Paulo começar a criticar os Coríntios em certas práticas”[15]
No versículo três, Paulo traz a ordem hierárquica que será a base para sua argumentação sobre o uso da coberta na cabeça. Ainda que o texto em grego não comece e termine exatamente com o termo, "Kristos" (andros he kefale ho Kristos estin kefale de gpsnaikos ho aner kefale de tu Kristu ho Theós), conforme KISTEMAKER, Cristo começa e termina o argumento, tornando a ideia completa, e “a progressão dessas três cláusulas com a palavra repetitiva cabeça levanta questões centradas no sentido dessa palavra”[16] Esta disposição destaca a proposição central (“O homem é a cabeça de uma mulher”), mas também a amarra à suas margens de forma que Cristo se torna o modelo tanto para autoridade do homem quanto para a submissão da mulher. A mulher, então, deve cobrir a cabeça e o homem não. 
Após observar o contexto judaico do texto, CLARK afirma que o cobrir da cabeça não seria uma referência ao véu, mas ao uso do cabelo longo:

Embora o costume oriental fosse véus ou mantos para mulheres, e embora algumas palavras nos últimos dez versículos pareçam referir-se a tais coberturas, torna-se evidente agora que cabelo, e não chapéus, é a questão importante. Deus deu às mulheres cabelos compridos no lugar de véus.[17]

MORRIS, no entanto, afirma que o homem não cobrir a cabeça “era algo novo para Paulo, o cristão”[18], tendo em vista que “os judeus sempre oravam de cabeça coberta”[19], e afirma que a cobertura na cabeça da mulher “assegura o seu próprio lugar de dignidade e autoridade. Ao mesmo tempo, ela reconhece sua subordinação”[20]. Conforme MORRIS, o uso natural do cabelo longo não é um substituto da coberta de tecido. Para ele “a natureza dá em símbolo a necessidade de uma mulher manter coberta a cabeça em ocasiões apropriadas”[21]. SCHREINER entende que o texto está lembrando por meio da cultura local o ensino Bíblico de que o homem deve se portar como líder no contexto familiar e a mulher lhe deve ser submissa.[22]
KISTEMAKER compreende que Paulo faz uso daquilo que é comum na época de Paulo. Seu foco está no princípio de que Paulo “quer que uma mulher seja distintamente feminina com respeito ao cabelo e à roupa, e assim cumpra o papel que Deus tencionou desde a criação”[23] Ainda que KISTEMAKER entenda que a palavra grega "anti" deva ser traduzida por: “em vez de”, afirma que “Paulo insta com as mulheres coríntias para que usem uma cobertura da cabeça além de cabelo comprido como símbolo de honrarem o marido e mostrarem submissão a eles.”[24]
Conforme PAYNE, o pano de fundo histórico da carta aos Coríntios era a cultura pagã greco-roma, mas também as convenções judaicas, a respeito do homossexualismo masculino e a prostituição feminina. Paulo está tomando cuidado para que os irmãos não usem a liberdade inadequadamente e terminam sendo identificados com os imorais da época. Assim, quanto ao uso de coberta, “geralmente era considerado vergonhoso para o homem usar cabelo longo afeminado. Cabelo afeminado era comumente ridicularizado como vergonhosa por causa de sua associação com a homossexualidade”[25]. Desta forma, Paulo não estaria se referindo a qualquer uso de véu ou chapéu para o homem ou para a mulher, mas ao uso do cabelo. Sua preocupação era que os cristãos não fossem associados aos imorais pagãos da época. Também as mulheres deveriam ter cuidado na forma como usavam o cabelo, uma vez que “cabelos soltos retratam festanças vergonhosas”[26]. O descuidado faria com que as irmãs fossem tratadas pela sociedade vergonhosamente como se fossem prostitutas. Desta forma, o teor de 1 Coríntios 11.2-16 é moral e não estava relacionado somente aos cultos cristãos, mas à presença deles perante a sociedade onde “cabelo afeminado no homem simbolizava a homossexualidade, e os cabelos soltos das mulheres simbolizavam liberdade sexual”[27].
Contrastando com os estudiosos já citados, MARTIN, focaliza sua atenção sobre os versículos 14 e 15 e faz uma abordagem sobre o “argumento natural”[28] do apóstolo entendendo que Paulo está contrastando a masculinidade representada pelo testículo do homem com a feminilidade da mulher que é demonstrada em seus longos cabelos, por isso o cabelo é a glória da mulher. Conforme MARTIN:

Paulo adequadamente instrui as mulheres quanto ao serviço de Deus para cobrirem o cabelo, uma vez que faz parte da genitália feminina. De acordo com o argumento de Paulo, as mulheres podem orar ou profetizar na adoração pública, juntamente com os homens, mas somente quando ambos estão decentemente trajado.[29]

ANÁLISE DO TEXTO
Tendo conhecido algumas interpretações diferentes do texto de Coríntios 11.2-16, passemos para a análise da perícope, a fim de se oferecer uma interpretação consistente e respostas coerentes às questões levantadas.
A igreja de Coríntios estava guardando diversas "paradóseis" que Paulo havia ensinado, contudo, nem todos estavam sendo cuidadosos quanto a prática de tudo. Nos evangelhos o termo "paradóseis", onde aparece oito vezes, possui um sentido negativo, sempre se referindo à tradição dos escribas e fariseus que estavam substituindo a prática dos mandamentos de Deus. Já nas cartas Paulinas, onde aparece cinco vezes, somente em colossenses 2.8, a referência é negativa, e diz respeito aos maus ensinos, denominados de “tradições de homens”, ensinados por hereges que perturbavam a igreja. Em 2 Tessalonicenses, Paulo se refere aos ensinos apostólicos, à semelhança de 1 Coríntios 11, que deveriam ser cridos e obedecidos. Essas tradições eram regra de fé e prática e deveriam ser seguidas à risca: “Mandamo-vos, porém, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo o irmão que anda desordenadamente, e não segundo a tradição que de nós recebeu.” (1Ts.3.6). Em todos os textos, "paradóseis" corresponde aos ensinos que deveriam ser obedecidos como norma para os fiéis, tanto com relação aos judeus como cristãos. A diferença entre os textos que usam o termo está no conteúdo ao qual ele faz menção, o conteúdo da "paradóseis". Os doutores de Judá haviam criado regras, com base em suas interpretações das Escrituras, que se distanciavam bastante da Palavra de Deus, afastando o povo da verdadeira piedade segundo as Escrituras. Mas, as "paradóseis" que os apóstolos ensinavam eram segundo o ensino de Cristo e conduziam para Cristo, apontando para o homem a nova vida. A igreja deveria ter cuidado com o tipo de tradição que estava ouvindo, ter “cuidado para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo e não segundo Cristo” (Cl.2.8). Portanto, a igreja deveria ter cuidado com as más tradições, enquanto deveria permanecer firme e guardar as tradições ensinadas pelos apóstolos, “as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa.” (2Ts.2.15). Desta forma, o conteúdo que seria tratado em seguida era de teor normativo para todas as igrejas e Paulo vem lembrar isso aos Coríntios.
Conforme mencionado anteriormente, as cartas possuem, em grande medida, circunstancialidade quanto aos assuntos tratados. Mas, quando plantava uma igreja ou visitava as igrejas já organizadas, Paulo sempre teve cuidado de ensinar toda a Palavra de Deus, “jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa” (At.20.20). No entanto, nem todas as igrejas seguiam os ensinos conforme haviam sido instruídas. Surgiram grupos diversos que criavam polêmicas dentro das igrejas, não querendo se submeter aos ensinos. Então, após receber informações sobre as igrejas quanto a forma como cada uma estava vivendo o cristianismo, Paulo escrevia para elas, relembrando o que aprenderam e exortando a perseverarem no ensino apostólico. Na medida em que cada igreja possuía suas dificuldades próprias, os assuntos são desenvolvidos com particularidade, de acordo com a necessidade. Por isso, para que se possa ter uma noção do corpo doutrinário ensinado pelos apóstolos, é preciso unir todas as cartas, somando os ensinos que foram expostos à medida que alguma igreja não estava sendo fiel na fé e prática do ensino apostólico. Todos os ensinos das cartas compõem a regra de fé e prática para a igreja. São circunstanciais quanto às ocasiões em que devem ser aplicados certos assuntos: família, culto, relação profissional, saúde, ministério pastoral etc. Mas, são universais quanto ao alcance das gerações que devem observar, de acordo com as circunstancialidades, cada ensino das cartas. O uso de coberta sobre a cabeça só é tratado em Coríntios, por que foi a única igreja que apresentou algumas dificuldades em obedecer a esta tradição apostólica, afinal as igrejas não tinham o costume de ser contenciosas (1Co.11.16).
Paulo inicia o assunto lembrando a ordem estabelecida por Deus: o homem está sob Cristo, a mulher está sob o homem, Cristo está sob Deus: “Mas, quero que vocês tenham aprendido e saibam que Cristo é a cabeça de todo homem, mas o homem cabeça da mulher, mas Deus cabeça de Cristo” (1Co.11.3). Nos evangelhos, Jesus deixa clara sua subordinação ao Pai, fazendo tudo para a glória dEle (Jo.4.34; Jo.5.30; Jo.12.49). E, assim como Jesus obedeceu à vontade do Pai, os discípulos deveriam obedecer a vontade de Jesus: “Disse-lhes, pois, Jesus outra vez: Paz seja convosco! Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio.” (Jo.20.21). Desta forma, a igreja está sujeita a Cristo e vive para fazer sua vontade (Ef.5.24), e, assim como Jesus se sujeitou a Deus, a igreja deve se sujeitar a Cristo. Mas, dentro da igreja existe ainda uma subdivisão: homem e mulher. Ao criar o mundo, Deus estabeleceu uma ordem: primeiro Ele criou o homem à sua própria imagem e semelhança, para que este fosse o representante legal de toda a criação: “Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva” (1Tm.2.13). Assim, a ordem hierárquica no exercício do governo estabelecida por Deus é: Deus, Cristo, homem, mulher. Esta ordem não desprestigia a essência dos seres, mas determina sua responsabilidade e subordinação. Portanto, não significa que Cristo seja inferior a Deus, mas cumpre seu papel de enviado, subordinando-se ao Pai: “Quando, porém, todas as coisas lhe estiverem sujeitas, então, o próprio Filho também se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos.” (1Co.15.27-28). Da mesma forma, não significa que a mulher seja inferior ao homem, mas este deve cumprir seu papel de representante, liderando a mulher, conduzindo-a com amor, como um líder que cuida dos seus. “Contudo, nem o homem independente da mulher nem mulher é independente do homem, no Senhor. Porque como a mulher veio do homem, assim também o homem vem através da mulher, mas tudo vem de Deus” (1Co.11.11-12). Portanto, nos argumentos de Paulo, cabeça é aquele que tem autoridade para liderar, que governa o outro numa ordem funcionalmente hierárquica. Uma das razões para o estabelecimento desta autoridade está no fato de que aquele que é a cabeça é também a fonte, origem de onde procedem seus liderados. Desta forma, Deus enviou Cristo e é seu Pai; Cristo é criador do homem e enviou a igreja; e, foi do homem que a mulher procedeu e para o homem foi criada. A primazia natural justifica o direito de autoridade sobre o liderado.
A "paradóseis" que a igreja deveria praticar expressava a ordem estabelecida por Deus na relação entre o homem e a mulher. Por esta razão, Paulo começa a perícope com o fundamento teórico. Mas, o assunto será abordado dentro da esfera do culto público: “Todo homem que ora ou que profetiza tendo a cabeça coberta está desonrando a sua cabeça. Mas, toda mulher que ora ou que profetiza com a cabeça descoberta está desonrando a sua própria cabeça; porque é como se a tivesse deixado raspada. Porque se uma mulher não se cobre então tosquie-se, mas se é vergonhoso para mulher o ter se tosquiado ou rapar-se, se cubra.” (1Co.11.4-6). Paulo afirma que o homem não pode cultuar a Deus com alguma coisa sobre sua cabeça, isso desonra a Cristo que é a cabeça do homem conforme versículo anterior, afinal o homem está sob a liderança do Senhor Jesus. Mas, a mulher que cultua sem nada sobre a cabeça desonra a própria cabeça[30], ou seja, a si mesmo, assim como é vergonhoso para a mulher estar com a cabeça raspada. Até aqui o texto não diz o que não pode estar sobre a cabeça do homem, mas deve estar sobre a cabeça da mulher, pode ser qualquer coisa, pois o termo "peribolaion" (coberta) só aparecerá no versículo 15 para contrastar com o cabelo da mulher. Algumas mulheres estavam querendo ser iguais aos homens em seus costumes, justificando o novo comportamento pelo uso da liberdade cristã. Assim, não usavam a coberta da cabeça. Paulo, então, parece ser sarcástico com essas mulheres, dizendo: se vocês querem ser iguais aos homens, dizendo não haver mais distinção, então, por que não raspam o cabelo como os homens fazem? Ter o cabelo raspado é uma vergonha para qualquer mulher, pois a expõe a ridículo. Afinal, a mulher possui uma vaidade própria e raspar o cabelo não é um adereço que exiba beleza. Agir como um homem, ou seja, sem cobrir a cabeça seria tão vergonhoso quanto o raspar a cabeça, desonrando-se a si mesmo. CHAMPLIN aponta para outro fator cultural:

Ora, a cabeça rapada era algo repugnante para os judeus, porque as adulteras sempre tinham a cabeça rapada, como castigo e sinal de seu crime. (Ver Num. 5:18). As mulheres escravizadas também tinham seus cabelos rapados; e as mulheres em luto as vezes faziam outro tanto; mas isso não era normal para as mulheres que estavam em seu estado natural e livre.[31]

O ensino apostólico não é sem fundamento. Então, Paulo dá os argumentos: “Porque um homem não deve cobrir a cabeça, por ser a imagem e glória de Deus, mas uma mulher é glória de um homem. Porque não veio o homem da mulher, porém a mulher veio do homem, e porque não criou o homem por meio da mulher, porém a mulher por meio do homem” (1Co.11.7-8). Paulo traz três argumentos: 1) o homem foi feito à imagem de Deus, mas a mulher foi feita a imagem do homem; 2) o homem foi criado primeiro, mas a mulher veio a existir a partir do corpo do homem; 3) a mulher foi feita para ser auxiliadora do homem. Os três argumentos mostram a primazia do homem sobre a mulher, não quanto a essência, pois são da mesma natureza, mas quanto funcionalidade. As mulheres cristãs deveriam reconhecer a distinção que havia entre o homem e a mulher, concedendo a honra devida à liderança masculina, tanto familiar quanto eclesiástica. Sendo assim, a mulher não poderia querer ser igual ao homem, pois Deus os fez distintos, e sobre os ombros do homem pôs a responsabilidade da liderança que deve ser reconhecida pela mulher.
Uma das afirmações mais difíceis vem a seguir: “Por causa disto, deve a mulher ter autoridade de cima da cabeça por causa dos anjos.” (1Co.11.10). Como já fora dito, em Coríntios os anjos assistem aos homens. Em Atos dos apóstolos, um anjo vai ao encontro de Paulo para avisá-lo do naufrágio e confortá-lo garantindo que ninguém morreria. (At.27.23). em 2 Coríntios, Paulo fala do “anjo de Satanás” que foi enviado para o esbofetear, a fim de que o apóstolo não se ensoberbecesse (2Co.12.7). Em Gálatas, Paulo diz que os anjos colocaram a Lei nas mãos de Moisés (Gl.3.19). Em 1 Timóteo, o apóstolo fala que os anjos viram Jesus (1Tm.3.16) e mais adiante conjura o jovem pastor Timóteo, diante de Deus, Jesus e também dos anjos eleitos, a guardar os ensinos apostólicos (1Tm.5.21). Os anjos, portanto, estão ativos assistindo o espetáculo humano. A grande questão é: em que os anjos seriam incomodados por causa desse assunto? Por que a mulher deveria ter um sinal de autoridade diante dos anjos? Afinal não há razão para traduzir o texto por mensageiro, se referindo a alguém que da parte do império ou de uma igreja, ou do próprio Paulo seja enviado para a igreja de Coríntio. Todas as vezes em que o termo "ángelos" aparece é para se referir a anjos, quer bons ou maus. O que não aparece em Paulo é a referência à possibilidade de que os anjos possam ser seduzidos pelas mulheres, como o apócrifo de Enoque, citado por Pedro e Judas, faz menção. Como espectadores da história humana, os anjos são testemunhas das ações dos homens como o Antigo Testamento testifica. Diversas vezes, Deus aponta para alguém levando informações para Ele: quando Caim mata Abel (Gn.4.10); antes do Senhor destruir Sodoma e Gomorra (Gn.18.21); quando Israel clama a Deus por causa do sofrimento no Egito (Ex.2.23); com respeito às blasfêmias de Senaqueribe (2Rs.19.28); sobre a maldade de Nívive (Jn.1.2); e, até no Novo Testamento os anjos acompanham a vida de cada cristão dando testemunho de tudo perante Deus Pai (Mt.18.10).
A maior frequência do termo "ángelos" ocorre nas cartas aos coríntios. Das quatorze vezes em que aparece nas cartas paulinas, seis delas estão em 1 e 2 Coríntios. A igreja dava muita ênfase aos anjos em sua busca constante por coisas “espirituais” e “celestiais”. Fazendo uso desta ênfase dada pela própria igreja, Paulo lembra para as mulheres “espirituais”, que queriam desfrutar da liberdade cristã sem obedecer às "paradóseis" apostólicas, que os anjos eram testemunhas do comportamento desobediente, irreverente e inapropriado delas. Portanto, já que os anjos estavam presentes nos cultos públicos, os cristãos deveriam se comportar adequadamente com toda modéstia, adorando a Deus como convém.
Como já fora dito, a distinção estabelecida entre o homem e a mulher não diz respeito à essência da natureza de um e do outro: “Contudo, nem o homem independente da mulher nem mulher é independente do homem, no Senhor. Porque como a mulher veio do homem, assim também o homem vem através da mulher, mas tudo vem de Deus.” (1Co.11.11-12). A relação entre o homem e a mulher é de mutualidade em muitos aspectos, numa igualdade ontológica. Nem o homem pode arrogar autonomia, querendo viver sem a mulher, nem a mulher pode querer ser independente do homem, pois assim como a mulher foi criada a partir da costela do homem (Gn.2.18-25) também o homem nasce da mulher. E a própria concepção depende de ambos criando um vínculo de co-dependência para sua proliferação. Somente Deus é autônomo, independente, autossuficiente. Todas as criaturas são codependentes e dependentes de Deus. Por que, então querer arrogar liberdade autônoma, quando no dia a dia da vida humana há uma necessidade do outro? Desta forma, nem o homem deveria se sentir superior a mulher nem a mulher inferior ao homem, pois Deus é o mesmo Senhor de todos, e todos dele procedem. Para se sentir importante dentro do corpo de Cristo, a mulher não precisa, nem deve, querer ser igual ao homem, pois cada qual cumpre sua função e, assim, todos glorificam a Deus, quer liderando quer sendo liderado, tanto a mulher com a coberta na cabeça quanto o homem sem a coberta para a glória de Deus.
Tendo argumentado, Paulo faz uso de suas famosas perguntas retóricas, ou seja, perguntas óbvias diante das quais não se esperam outras respostas por parte dos leitores. Ele pergunta “Em vós mesmos julgai se é adequado uma mulher descoberta orar para Deus; ou a natureza própria não ensina a vocês que o homem que usa cabelo longo é desonroso para ele?” (1Co.11.13-14) São duas perguntas, uma relacionada à mulher e outra ao homem e a resposta natural que se espera é: Não é adequado, não é honroso. Desta forma, já que a igreja sabia que não era adequado para uma mulher está descoberta na oração, então, por que algumas mulheres insistiam em se descobrir? E se o homem usar cabelo longo é desonroso, por que alguns insistiam em agir inadequadamente? A questão aqui vai além do culto, pois Paulo apela para a natureza das coisas. E, conforme o apóstolo, o natural para o homem é usar cabelo curto. O natural é aquilo que foi estabelecido por Deus. O termo "físis" aparece quatorze vezes, das quais Paulo utiliza onze vezes. Nas cartas paulinas "físis" significa aquilo que é natural: o modo de se fazer relação sexual (Rm.1.26); a moralidade do ser humano (Rm.2.14); a homem nascer incircunciso (Rm.2.27); os judeus serem descendentes de Abraão (Rm.11.21); os ramos naturais de uma árvore (Rm.11.24 – em analogia); o ser chamado de judeu por nascimento (Gl.2.15); o fato de não existirem outros deuses (Gl.4.8); o pecador está debaixo da ira (Ef.2.3). Assim, também, Paulo chama de natural o uso do cabelo curto no homem e do cabelo longo na mulher. Sendo assim, ao distorcerem o ensino apostólico, eles estariam andando contrário à natureza, o que não agradava ao Criador que fez todas as coisas para serem conforme ele as estabeleceu.
O uso do véu era comum em diversas culturas ao redor da igreja e os cristãos não deveriam provocar escândalos contrariando essas culturas, desnecessariamente. Nisto Paulo tinha sido modelo para eles (1Co.4.16; 11.1), pois fazia de tudo para atrair pessoas a Cristo, por meio de um comportamento humilde e sincero, administrando a liberdade cristã com sabedoria:

Porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível.  20 Procedi, para com os judeus, como judeu, a fim de ganhar os judeus; para os que vivem sob o regime da lei, como se eu mesmo assim vivesse, para ganhar os que vivem debaixo da lei, embora não esteja eu debaixo da lei.  21 Aos sem lei, como se eu mesmo o fosse, não estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo, para ganhar os que vivem fora do regime da lei.  22 Fiz-me fraco para com os fracos, com o fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para com todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns.  23 Tudo faço por causa do evangelho, com o fim de me tornar cooperador com ele. (1Co.9.19-23)

Contudo, as mulheres cristãs não precisavam usar o véu, pois o cabelo, desde sua criação, foi dado por Deus como símbolo de sua submissão ao homem: “Mas, a mulher que usa cabelo longo é glória para ela; porque o cabelo foi dado em lugar de cobertura.” (1Co.11.15). Então, já que o cabelo foi dado em lugar de uma coberta, a mulher não precisa usar a coberta, mas tem obrigação de manter os cabelos longos, que é o instrumento natural para representar sua submissão ao homem. Este é o único versículo no qual aparece de fato o termo "peribolaion" (coberta, véu, mantilha). E neste verso, Paulo não está ordenando seu uso, muito pelo contrário está dizendo ser desnecessário usar o véu já que a mulher possui uma coberta natural que é o cabelo grande. Em se tratando de liberdade cristã, as mulheres de Coríntio poderiam se alegrar com o fato de que não era necessário usar o véu nos cultos, ainda que não devessem promover escândalos na sociedade caso fosse melhor usar o véu em algumas determinadas culturas para não impedir o avanço do evangelho. Mas, mesmo sem usar o véu por causa da liberdade cristã, deveriam ser submissas ao homem, diante de Deus, e, então, usar o cabelo longo. Infelizmente, nem todos recebiam as instruções com humilde subordinação, mas levantavam questões de “velhas caducas” (1Tm.4.7). Por isso, Paulo adverte a igreja: “Mas, se alguém está pensando ser contencioso, nós, tal hábito, não temos nem as igrejas de Deus.” (1Co.11.16) Alguns deveriam se achar inteligentes demais por estarem sempre levantando questões no meio da igreja. Porém, Paulo os chama de contenciosos, pois suas questões não edificavam a igreja, antes traziam contendas entre os irmãos. O assunto tratado em Coríntios também havia sido recebido pelas demais igrejas que nenhuma questão haviam levantado contra o ensino apostólico. Mas, em Coríntio algumas pessoas deveriam se envergonhar por não estarem sendo instrumento para o crescimento espiritual do povo de Deus, mostrando sabedoria no uso correto da liberdade cristã também dentro do culto.
Ainda que 1 Coríntios 11.2-16 trate do uso do cabelo: curto no homem e longo na mulher, como representação respectiva da imagem e semelhança de Cristo no homem e da submissão feminina ao homem; contudo, o assunto que permeia todo o texto é a relação de submissão que a mulher deve ter em relação ao homem. O uso do véu, comum nas diversas culturas da época conhecidas dos cristãos de Coríntio, e o uso do cabelo longo na mulher, como as mulheres cristãs deveriam usar, são expressões da submissão feminina à liderança masculina. A igreja estava repleta de problemas na área do relacionamento humano (1Co.1.10-17; 3.1-9; 6.1-11; 8.9-13; 10.23-33; 11.2-16; 12.12-31; 13.1-13) e um dos problemas dentro dos relacionamentos entre os Coríntios era que: mulheres diziam que em Cristo eram iguais aos homens, não precisando, portanto, se submeter a eles. Isso fez com que algumas delas nem usasse o véu nem o cabelo longo, pois não queriam a fragilidade e submissão feminina, mas a autonomia, liderando a si mesmas. Por esta razão, Paulo diz que não é vergonha a mulher usar cabelo longo, símbolo de sua submissão ao homem, mas sim glória, tanto em sua beleza quanto em seu fiel cumprimento à vontade de Deus.

MENSAGEM PARA A ÉPOCA DA ESCRITA
Paulo exorta a igreja a se comportar adequadamente segundo os princípios das Escrituras. Este comportamento era fundamental para que Deus fosse glorificado corretamente nos cultos e para que não houvesse impedimentos para a propagação do evangelho. O mau comportamento da igreja perante a sociedade poderia criar barreiras para a propagação do evangelho promovendo escândalos. Além disso, a ordem social é prejudicada, pois sem a presença de líderes todos agiriam com autonomia e as famílias, bem como a igreja, ficariam sem direção objetiva, fazendo cada qual o que considerasse melhor, transtornando assim os relacionamentos humanos. Quando o homem e a mulher se submetem a cumprir seu papel, tanto de líder familiar e/ou eclesiástico quanto de liderado, a própria igreja que estava repleta de contendas encontraria a paz e uma única direção que havia sido dada pelo apóstolo Paulo, plantador da igreja, e repassada pelo pastor que a dirigia. Isso seria bom para a igreja e promoveria o bom testemunho do evangelho glorificando a Deus perante todos, cristãos e não cristãos. As mulheres, então, deveriam ter cabelos grandes e decentemente ornamentados, pois isso agradava a Deus que criou a mulher com tais distinções, bem como não chocaria o contexto social no qual a igreja estava inserida. Assim, também os homens deveriam ter aparência masculina.

MENSAGEM PARA TODAS AS ÉPOCAS
As bases do texto não são socialmente condicionadas nem a ordenança nele exposta. O ensino é essencialmente supracultural e revela a vontade de Deus desde os dias do Éden. Portanto, o que Paulo está ordenando para a igreja de Coríntios é também o que todas as igrejas de todas as épocas devem obedecer. O comportamento do homem e da mulher instituído por Deus é para todas as gerações, bem como o cuidado da igreja para não promover escândalos perante a sociedade. O homem é distinto da mulher em seu aspecto funcional outorgado por Deus assim como a mulher é distinta do homem e deve reconhecer seu lugar dentro da criação. O cabelo curto do homem lhe é natural, devendo ser mantido assim. Os casos excepcionais do Antigo Testamento tinham propósito bem definido, mas uma vez extinguidos tais casos, o homem passa a viver o padrão: o cabelo curto. Da mesma forma a mulher, usando o cabelo longo, está mostrando não só beleza, mas submissão às lideranças instituídas por Deus. Seu comportamento deve ser descente e modesto, dando bom testemunho do evangelho para o mundo, se submetendo aos ensinos com toda obediência, pois isso é agradável a Deus.

TEOLOGIA DO TEXTO

1. Implicações para a Teologia Bíblica
A revelação Bíblica ocorreu de forma progressiva e orgânica, ou seja, foi dada pouco a pouco, desenvolvendo os conceitos paulatinamente, dentro do contexto local, fazendo uso dos recursos da época enquanto dava respostas às necessidades vigentes, e, ao mesmo tempo, estando sempre harmonizada com o todo da revelação divina. Os fundamentos para todo aperfeiçoamento doutrinário estão no Pentateuco, a Lei de Moisés. Os livros do Pentateuco eram a base para toda pregação profética do Antigo Testamento e continua sendo no Novo Testamento. Paulo também faz uso do Pentateuco para alicerçar seus argumentos doutrinários, mostrando como a vontade de Deus foi revelada desde os dias anteriores à queda. Ao fazer uso do texto pré-queda, Paulo afirma que a relação de submissão da mulher não é um status relacionado à queda de Adão e Eva, como se fosse uma maldição (Gn.3.16). Portanto, as bases para as relações sociais não são socialmente condicionadas, e sim determinadas por leis naturais instituídas por Deus. Portanto, as bases se mantiveram intactas durante toda a revelação e o cuidado da igreja é voltar para elas. É desta forma que outros textos que tratam sobre o relacionamento entre o homem e a mulher devem ser vistos, à luz de Gênesis 1 e 2 quando tudo ainda era perfeito e o pecado não ofuscava a vontade de Deus. A história das relações entre homens e mulheres não deve prejudicar a leitura Bíblica sobre o papel do homem e da mulher dentro da sociedade, pois os pecados e atrocidades cometidos não invalidam a vontade original prescrita no início da criação de tudo.

2. Implicações para a Teologia Sistemática
1 Coríntios 11.2-16 contribui na sistematização do conceito Antropológico Bíblico, apresentando a visão paulina do homem e da mulher. Nele, o homem e a mulher são iguais em essência perante Deus, pois ainda que a mulher tenha sido feita do homem, foi feita da mesma essência em corpo e alma. Por isso, não há maior ou menor, mas dois seres feitos a imagem de Deus para a glória de Deus. Por outro lado, o texto aponta a diferença funcional que existe entre o homem e a mulher. Não se trata de hierarquia eclesiástica, mas cosmológica. O homem foi feito primeiro do que a mulher para liderá-la; foi a matéria prima da mulher para receber a honra devida a um progenitor; e, recebeu a mulher como dádiva graciosa do Senhor, para guiá-la pelo caminho em que deve andar. Dentro desta igualdade ontológica e diferença funcional, o homem e a mulher cumprem a vontade de Deus mantendo a ordem do cosmo e atendendo para o bom funcionamento da sociedade.

3. Implicações para a Teologia Prática
Há certa resistência da mulher em reconhecer que a liderança social foi confiada ao homem, quer seja familiar, eclesiástica ou política. Essa resistência está relacionada aos massacres que a mulher sofreu da parte do homem por um longo período da história, e que, na verdade, ainda que tenha diminuído, não cessou completamente e em muitas nações, a mulher continua sendo muito hostilizada. O cristianismo é a solução para este problema, não porque torna a mulher igual ao homem, mas porque chama o homem e a mulher a viverem em Cristo a vontade de Deus estabelecida nos dias do Éden: que o homem lidere a mulher em amor e a mulher se submeta com ternura numa relação de igualdade diante de Deus. A mulher cristã deve reconhecer a liderança masculina e se alegrar com o fato de que Deus libertou homens das trevas para viverem para a glória do Senhor como líderes que pastoreiam a família, a igreja e a sociedade como modelo do rebanho. E para ajudá-los devem se submeter com ternura orando pelo bom exercício do papel do homem. Por sua vez, o homem deve ter o cuidado para não ser um tirano no exercício de seu papel, antes deve ser cuidadoso e amoroso, mas também firme e fiel a Deus para cumprir a vontade do Senhor com integridade.
Além disso, a forma como o homem e a mulher devem se comportar, inclusive na aparência, tem que ser agradável ao Senhor e Deus que estabeleceu isso na própria natureza de ambos, pois é natural para o homem ter o cabelo curto, bem como é natural para a mulher ter o cabelo longo. Portanto, os cristãos não devem criar contendas, para satisfazer aos caprichos pessoais, conforme sua concepção pessoal da liberdade cristã, mas dar exemplo, seguindo os mandamentos do Senhor.

CONCLUSÃO
A igreja cristã desta e qualquer outra geração não precisa se preocupar com o uso do véu, comum entre várias culturas orientais e até ocidentais. Isto, porque o texto de 1 Coríntios 11.2-16, não é uma defesa do uso do véu, mas tem como propósito lembrar às mulheres cristãs que devem ser submissas aos homens. Paulo também ensina que essa submissão é representada no uso do cabelo longo. Assim como o homem deve refletir a glória de Deus liderando conforme a Escritura, a mulher deve honrar o homem sendo submissa a este.
A nova vida em Cristo não acabou com as diferenças funcionais estabelecidas por Deus desde o Éden. Sendo assim, homens e mulheres devem cumprir, cada qual, seu papel no propósito de oferecer um culto aceitável a Deus e uma vida que o glorifique.



[1] GUNDRY, Robert H. Panorama do Novo Testamento. São Paulo: Editora Vida Nova, 2ª Ed. 1999, p.314
[2] PACKER, J. I.; TENNEY, Merril C.; JR., William White. Vida Cotidiana nos Tempos Bíblicos. São Paulo: Editora Vida, 2001, p.127
[3] CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Editora Candeia, 1995, vol. IV, p. 167
[4] Ibid, p. 167
[5] HURLEY, James B. Did Paul require veils or the silence of women: A consideration of 1 Cor 11:2-16 and 14:33b-36. Westminster Theological Journal 35, no. 2, 1973, p.196.
[6] Ibid, p.199.
[7] PACKER; TENNEY; JR., 2001, p.78
[8] GETTY, Mary Ann, 1 Coríntios. In: BERGANT, Dianne; KARRIS, Robert J., Comentário Bíblico, São Paulo, Editora Loyola, 2001 V. 3, p.210.
[9] HURLEY, 1973, p.201.
[10] MARSH, Paul W. 1 Coríntios. In: BRUCE, F. F. Comentário Bíblico NVI. São Paulo: Vida Nova, 2009, p.1903
[11] CHAMPLIN, 1995, p. 1
[12] CARSON, D. A.; MOO, Douglas J.; MORRIS, Leon. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Editora Vida Nova, 1997, p. 310.
[13] CLARK, Gordon Haddon. 1 Coríntios 11:1-16. In: I Corinthians. Trinity Foundation, p. 168-178. Disponível em http://www.monergismo.com/textos/comentarios/1corintios11_1-16_clark.pdf. Acesso em 02 de abril de 2014, às 21h27min, p.1
[14] Ibid. p.1
[15] SCHREINER, Thomas R. Head coverings, prophecies and the trinity: 1 Corinthians 11:2-16. In: PIPER, John; GRUDEM, Wayne. Recovering Biblical Manhood and Womanhood. USA: Published by Crossway Books, a division of Good News Publishers, Wheaton, Illinois, 1991. Disponível em: http://www.sbts.edu/documents/tschreiner/RBMW_5.pdf. Acesso em 02 de abril de 2014, às 22h16min, p.118
[16] KISTEMAKER, Simon. 1 Corintios. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004, p.507
[17] CLARK, op. cit., p.6
[18] MORRIS, Leon. 1 Coríntios: Introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida Nova; Editora Mundo Cristão, 1986, p.122
[19] Ibid. p.122
[20] Ibid. p.124
[21] Ibid. p.125
[22] SCHREINER, 1991, p.129
[23] KISTEMAKER, 2004, p.533
[24] Ibid. p.533
[25] PAYNE, Philip B. Wild Hair and Gender Equality in 1 Corinthians 11:2–16. Priscilla Papers, Vol. 20, No. 3, 2006. Disponível em https://www.linguistsoftware.com/Payne2006PP1Cor11_2-16.pdf. Acesso em 02 de abril de 2014, às 22h10min. p.9
[26] PAYNE, 2006, p.9
[27] Ibid. p.15
[28] MARTIN, Troy W. Paul's argument from nature for the veil in 1 corinthians 11:13-15: a testicle instead of a head covering. In: Journal of Biblical Literature 123, no. 1: 75-84. Chicago: St Xavier University, 2004, p.75
[29] Ibid. p.83
[30] Se Paulo fizesse menção sobre a cabeça da mulher como referência ao homem, então as mulheres viúvas e solteiras, estariam desobrigadas. Portanto, a variante do texto Majoritário é, também por questões internas, mais coerente do que a variante do texto Crítico.
[31] CHAMPLIN, 1995, p. 170-171

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