“Lameque viveu cento e oitenta e dois anos e gerou um filho; pôs-lhe o nome de Noé, dizendo: Este nos consolará dos nossos trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o SENHOR amaldiçoou” (Gn.5.28-29)
Há personagens da história redentora que não aparecem muito, não venceram gigantes nem fizeram grandes milagres, mas que viveram cheios do Espírito Santo. O maior exemplo deles é João Batista, pois “entre os nascidos de mulher, ninguém apareceu maior do que João Batista” (Mt.11.11). Todavia, esse grande profeta não realizou um só sinal miraculoso (Jo.10.41). Sua obra era o poder da Palavra de Deus que pregara a todo o Israel de seus dias.
Mas, nosso propósito aqui não é falar de João Batista. Queremos olhar para um personagem de menor destaque: Lameque, filho de Metusalém (Gn.5.25-31). Lameque foi o pai de Noé, homem que ficou muito conhecido no mundo por causa da construção de uma arca em que abrigara sua família e os animais para salvá-los do dilúvio. Lameque não ficou conhecido nem é citado como Noé, ainda que este deva sua educação ao pai que o conduziu no caminho do Senhor. Portanto, Lameque é um dos homens de Deus, cheio do Espírito, que passa quase desapercebido pelo leitor da Bíblia.
Pode parecer simples, mas o nome que Lameque deu a seu filho: Noé (Gn.5.29), revela que seu coração guardava a esperança da redenção. Enquanto a cidade hedonista de Caim vivia para satisfazer os desejos do homem, Lameque ansiava pelo descanso redentor, o dia da vitória divina sobre a serpente, conforme Deus prometeu para Adão e Eva, na palavra condenatória a Satanás (Gn.3.15). Portanto, ainda que silenciosamente, Lameque estava olhando para Deus e vivendo pela esperança da salvação.
O difícil contexto em que viveu Lameque nos ajuda a observar melhor a dimensão de sua fé e esperança. Gênesis 4.17-24 nos conta que Caim decidiu formar uma cidade sem Deus, uma cidade totalmente centrada no coração pecador do homem (Jr.17.9), em que o homem era a medida de todas as coisas (Protágoras). Essa cidade cresceu e se tornou bastante tentadora para os filhos de Deus, pois nela podiam encontrar todo tipo de deleites para a carne. E a mais forte das tentações dessa cidade era a sensualidade de suas sedutoras filhas.
A sedução das filhas da cidade de Caim era tamanha que, segundo Gênesis 6.1-2: “se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram”. Os muitos homens que nasceram aos filhos de Deus (Gn.5) não puderam se conter diante da provocante sedução das filhas da cidade de Caim. Talvez, possamos dizer que apenas os nomes citados na genealogia de Sete, conforme Gênesis 5.1-32, se mantiveram firmes e não se misturaram tomando filhas da cidade pecadora.
A cidade de Caim tornou-se demasiadamente atraente e a linhagem dos filhos de Deus, filhos de Sete, não conseguiram resistir por muito tempo às seduções femininas. Ao tomarem mulheres dentre os filhos de Caim, os filhos de Deus se contaminaram aderindo também ao estilo de vida pagão da cidade pecadora. Desse modo, os pecados foram se multiplicando, tornando-se cada vez mais difícil suportar as injustiças, imoralidades, maldades e violências praticadas entre os homens, afinal apenas alguns da genealogia dos filhos de Deus se mantiveram firmes e irrepreensíveis em seus dias.
Lameque foi um dos filhos de Deus que se manteve firme diante das tentações da cidade de Caim, pois manteve seus olhos fitos no Criador, andando com Deus assim como Enoque andou (Gn.5.21-24). Portanto, a vida de Lameque não era fácil e podemos ver bem sua aflição ao chamar seu filho de Noah, uma palavra hebraica derivada de Nuah que significa descanso ou descansar. Lameque estava cansado da presença do pecado no mundo, estava cansado da maldade visível do coração humano. Ele ansiava o retorno do paraíso onde Deus havia colocado Adão (Gn.2.15).
É interessante observarmos que o verbo descansar (Nuah) aparece em Gênesis 2.15 com o sentido de estabelecer, colocar em um lugar: “Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar”. Deus havia colocado Adão em um paraíso, lugar agradável, tranquilo e harmônico, um lugar onde o coração de Adão viveria em paz todos os dias, tanto com Deus como, também, com Eva sua esposa (e, futuramente, com seus filhos). No jardim do Éden, até o trabalho de Adão seria realizado com satisfação, pois tudo contribuía para seu bem (Rm.8.28).
Podemos ver bem a presença graciosa do Espírito Santo na firme esperança de Lameque (1Ts.1.3-4). Por meio do Espírito Santo, e guardando no coração a Palavra de Deus proferida para Adão e Eva (Gn.3), Lameque conseguiu vencer as tentações de sua geração. Lameque nos mostra que em qualquer geração, através da Palavra divina e do Espírito do Senhor é possível vencer o pecado, conforme disse o apóstolo Paulo: “Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si” (Gl.5.16-17).
Ao chamar seu filho de Noé, Lameque profere uma profecia da parte do Senhor: “Este nos consolará dos nossos trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o SENHOR amaldiçoou” (Gn.5.29). Portanto, Lameque possuía o dom profético concedido pelo Espírito Santo. Sendo assim, Lameque confortou e fortaleceu os fiéis de sua geração proclamando a esperança da salvação divina. Ele anunciou o descanso divino para a criação, repouso que aguardamos em Cristo Jesus: “Portanto, resta um repouso para o povo de Deus. Porque aquele que entrou no descanso de Deus, também ele mesmo descansou de suas obras, como Deus das suas” (Hb.4.9-10).
Em parte, a profecia de Lamaque aponta para Noé, por isso também encontramos o verbo descansar (Nuah) em Gênesis 8.4, para se referir ao repouso da arca de Noé em terra firme: “No dia dezessete do sétimo mês, a arca repousou sobre as montanhas de Ararate”. Após cerca de um ano em alto mar, tendo passado quarenta dias e quarenta noites em meio ao maior temporal que a terra presenciou (Gn.7.11-23), Noé e os animais foram agraciados com o repouso em segurança em uma nova terra, purificada do pecado e pronta para ser recomeçada. Assim, Noé foi o instrumento de Deus para recomeçar a vida na terra (Gn.9).
Contudo, a esperança de Lameque não deve ser resumida na morte de uma geração perversa (Gn.6.13). Lameque ansiava pelo repouso que precedia a queda de Adão e Eva, assim como Abraão “aguardava a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador” (Hb.11.10), pois o mesmo Espírito, o Espírito do Senhor conduzia ambos os filhos de Deus. Quando o dilúvio veio, Lameque e todos os verdadeiros filhos de Deus já haviam morrido, mas a esperança de Lameque permanecia viva e haveria de ser cumprida no Filho de Deus, o Cristo, o Salvador. Desse modo, vemos que Noé foi um tipo de algo superior, do verdadeiro e perfeito salvador, Cristo, por meio do qual todo aquele que crê desfrutará do descanso eterno, “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo.3.16).
E você, tem vivido pela esperança da salvação em meio a uma geração corrompida? Uma vida cheia do Espírito Santo sempre conduzirá os filhos de Deus à eterna salvação.
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