Pages

sábado, 6 de maio de 2023

O Deus-Homem (O batismo do Filho de Deus)

 


Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre Ele.” (Mt.3.16)


Durante alguns anos, o profeta João Batista pregou e batizou multidões que se dirigiam a ele confessando seus pecados. Milhares de pessoas afluíram para o deserto, demonstrando, assim, a expectativa messiânica presente naquela geração. Não sabemos por quanto tempo João pregou, mas foi tempo suficiente para ficar conhecido, em toda a Judeia e a Galileia, como profeta de Deus. João Batista tinha praticamente a mesma idade de Cristo, mas iniciou seu ministério algum tempo antes de Jesus que tinha 30 anos quando começou a pregar publicamente (Lc.3.23). O fim do ministério de João foi tão repentino quanto seu início. Sem que ele estivesse esperando, o tempo de sua pregação chegou ao fim com cadeias e morte (Mc.6.17), um dos vários elementos que o assemelham aos profetas veterotestamentários. Pouco tempo após o batismo do Filho de Deus, como se, naquele dia especial, João Batista tivesse passado o bastão da pregação da Palavra divina para Jesus, Herodes mandou prendê-lo: “Ouvindo, porém, Jesus que João fora pre1so, retirou-se para a Galileia. [...] Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus” (Mt.4.12,17).

Já fui questionado diversas vezes sobre o batismo de Jesus. E a principal indagação tem sido: “Por que Jesus foi batizado, já que Ele não tinha pecado?” A importância da dúvida é evidenciada quando reconstruímos o cenário do batismo: o profeta apareceu no deserto da Judeia chamando o povo ao arrependimento e batizando aqueles que confessavam seus pecados, tocados pelo Espírito Santo. Marcos e Lucas afirmam que João Batista pregava “batismo de arrependimento” (Mc.1.4; Lc.3.3). Também, em Atos dos apóstolos, nos é dito que João Batista “realizou batismo de arrependimento” (At.19.4), pois seu propósito era purificar o povo, preparando-o para a chegada do Messias. Todavia, repentinamente, aparece Jesus, o Filho de Deus para ser batizado. Não é sem razão que o profeta ficou perplexo: “Eu é que preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim?” (Mt.3.14). (Mt.3.14). A dúvida de muitos cristãos decorre do fato de que o batismo de João representava a purificação dos pecados, por meio da confissão daqueles que se aproximavam arrependidos após terem ouvido a pregação do profeta. Portanto, por que Jesus foi batizado por João Batista, já que Ele não tinha qualquer pecado? Para responder a questão, iremos recorrer a outro texto:


Tendo Jesus chegado ao templo, estando já ensinando, acercaram-se dele os principais sacerdotes e os anciãos do povo, perguntando: Com que autoridade fazes estas coisas? E quem te deu essa autoridade?  24 E Jesus lhes respondeu: Eu também vos farei uma pergunta; se me responderdes, também eu vos direi com que autoridade faço estas coisas.  25 Donde era o batismo de João, do céu ou dos homens? E discorriam entre si: Se dissermos: do céu, ele nos dirá: Então, por que não acreditastes nele?  26 E, se dissermos: dos homens, é para temer o povo, porque todos consideram João como profeta.  27 Então, responderam a Jesus: Não sabemos. E ele, por sua vez: Nem eu vos digo com que autoridade faço estas coisas. (Mt.21.23-27)


Mais uma vez, os líderes do povo perseguiam Jesus, buscando alguma razão para o acusar e matar, pois tinham inveja do caráter impecável de Cristo e, também, da crescente popularidade de Jesus entre os judeus. Então, os principais sacerdotes se aproximam do filho do carpinteiro, perguntando: “Com que autoridade fazes estas coisas? E quem te deu essa autoridade?” (Mt.21.23). Jesus conhecia a sagacidade daqueles sacerdotes, por isso não lhes respondeu a pergunta. Antes, Cristo propõe outra pergunta, condicionando sua resposta à resposta deles: “Donde era o batismo de João, do céu ou dos homens?” (Mt.21.25). Os sacerdotes perceberam a perspicácia de Jesus e pararam para refletir as possíveis implicações de suas respostas. Eles não estavam interessados em dar uma resposta correta, mas estavam preocupados em passar vergonha diante das multidões. Por isso, consideraram que seria melhor não responder do que arriscar serem humilhados e repelidos pelo povo.

O texto nos diz que os principais sacerdotes e os anciãos não acreditaram em João Batista, por isso não se batizaram. Ser batizado significava, primeiramente, reconhecer que Deus havia enviado um profeta ao povo e que este profeta tinha o propósito de purificar o povo de seus pecados. Ser batizado por João Batista era, antes de tudo, reconhecer a obra de Deus entre os homens. Não se tratava de crer no homem, mas crer que Deus estava falando e operando por meio do profeta. O batismo de João não era um rito com poder purificador, transformador ou justificador. O batismo era um símbolo da fé daqueles que se aproximavam crendo que Deus estava falando graciosamente a seu povo, chamando-os a uma nova vida. Antes de alguém ser batizado, deveria crer que o Senhor estava visitando seu povo e realizando uma obra em seu meio.

De um modo muito especial, ser batizado por João Batista expressava o reconhecimento de que o Senhor estava cumprindo sua Palavra. João era o percussor do Messias, então, ao reconhecerem seu ministério, as multidões estavam se preparando para a presença do Filho de Deus. O ministério de João Batista estava intimamente ligado ao ministério de Jesus. As multidões estavam sendo batizadas para se encontrar com Cristo. Os sacerdotes esperavam que isso ocorresse um dia, mas não creram que já estava ocorrendo, conforme nos mostra o diálogo entre João Batista e alguns sacerdotes e levitas: 


Este foi o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para lhe perguntarem: Quem és tu?  20 Ele confessou e não negou; confessou: Eu não sou o Cristo.  21 Então, lhe perguntaram: Quem és, pois? És tu Elias? Ele disse: Não sou. És tu o profeta? Respondeu: Não.  22 Disseram-lhe, pois: Declara-nos quem és, para que demos resposta àqueles que nos enviaram; que dizes a respeito de ti mesmo?  23 Então, ele respondeu: Eu sou a voz do que clama no deserto: Endireitai o caminho do Senhor, como disse o profeta Isaías.  24 Ora, os que haviam sido enviados eram de entre os fariseus.  25 E perguntaram-lhe: Então, por que batizas, se não és o Cristo, nem Elias, nem o profeta? (Jo.1.19-25)


Nesse diálogo, podemos ver que os judeus aguardavam a presença escatológica de alguns personagens: o Messias, o profeta Elias e ainda outro profeta. Portanto, aquela geração não foi pega de surpresa. Mesmo assim, muitos dentre os judeus não creram nem em João Batista nem em Jesus. A severidade do juízo divino contra os judeus é proporcional ao desprezo deles contra o Filho de Deus. Os judeus tinham todas as promessas e sabiam que o Senhor as cumpriria em algum momento (Rm.9.4-5). Mas, quando Deus começou a realizar a obra preanunciada, eles a desprezaram completamente. O evangelho de Mateus pode ser considerado como: o evangelho contra os judeus. O evangelista demonstra, em toda sua obra, como os judeus se tornaram merecedores de grande condenação (uma referência profética à grande tribulação judaica que começou em 70 d.C.), a começar por Herodes que tentou matar o Filho de Deus, nos primeiros anos de vida de Jesus (Mt.2.1-8,13-18). Assim, a recusa do batismo de João Batista fora uma expressão de incredulidade, e desse modo, muitos judeus, sobretudo a liderança político-religiosa judaica daqueles dias, desprezaram a Deus.

Diante das considerações acima, acredito que você já é capaz de compreender a razão de Jesus ter sido batizado. Mas, ainda preciso fazer uma pergunta: quem é maior, Jesus ou João Batista? Sei que a resposta é óbvia. Contudo, meu propósito é lhe mostrar que o batismo de Jesus não representava a purificação de Cristo, mas a autenticação do batismo de João Batista. Ou seja, não foi João quem abençoou Jesus com seu batismo, mas Cristo quem reconheceu que o ministério e o batismo de João provinham de Deus. E, sendo assim, Jesus estava afirmando que seu precursor havia vindo e realizado cabalmente a obra ordenada por Deus, cumprindo, assim, a Palavra divina, como disse Jesus: “E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é Elias, que estava para vir” (Mt.11.14).

Por isso, assim que Jesus foi batizado, dois eventos ocorreram: 1) João batista foi aposentado de seu ministério através da prisão, pois Herodes o lançou no cárcere (Lc.3.18-20); 2) Cristo deu início a seu ministério, pregando a Palavra de Deus a todos (Mt.4.12-17). O batismo de Jesus tanto reconheceu o ministério de João Batista quanto indicou seu fim, pois já havia cumprido seu propósito. O Filho de Deus havia chegado e estava pronto para começar seu ministério. Portanto, João Batista já havia cumprido sua missão preparando o povo. Ao ser batizado, Jesus estava declarando: “Muito bem, João Batista, você cumpriu com excelência o ministério que lhe fora confiado por meu Pai. O povo foi preparado para me receber. Então, a partir de agora, eu entro em cena e você sai.” 

Além de reconhecer o ministério de João Batista, quando Jesus foi batizado, ele cumpriu a justiça divina, procedendo como Filho obediente que em tudo deveria fazer a vontade do Pai. O batismo de Jesus é uma expressão de obediência, demonstrando que o Filho do Homem creu na obra realizada pelo Pai através do profeta. Como Jesus mesmo afirma: “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra” (Mt.5.17-18). A vontade de Deus era que todos fossem batizados, então Jesus obedeceu, fazendo a vontade do Pai. Cristo não tinha um só pecado para confessar, mas sabia que deveria obedecer a Deus em tudo. Nisso, os fariseus se tornaram mais condenáveis ainda, pois enquanto Jesus foi batizado mesmo sem ter pecados, os fariseus não aceitaram o batismo, porque se achavam justos demais.

Tudo o que Deus faz e diz deve ser crido pelos homens e, sendo mandamento, deve ser obedecido. Portanto, caso Jesus não tivesse sido batizado, Ele teria desprezado a vontade de Deus. Não se tratava de confessar pecados, não se tratava de ter perdão de pecados, pois o Senhor Jesus nunca pecou. A questão era obedecer a Deus, submetendo-se à sua vontade completamente, pois o batismo de João era do céu, não dos homens (Mt.21.25). Jesus deveria cumprir toda a Palavra do Senhor, a fim de ser o Justo e Justificador de todo o que crer. E, em obedecer a Deus cabalmente, Cristo também estaria sendo o perfeito modelo para todos os seus discípulos, o varão perfeito (Ef.4.13). Desse modo, Jesus mostrou ao mundo que não existe qualquer desculpa para não se obedecer a Deus, não existe qualquer argumento plausível para se desobedecer ao Criador. Todos devem obediência ao Todo-Poderoso, seja quem for e em qualquer que seja a situação. Jesus obedeceu a Deus, mesmo quando parecia não ser necessário.


Lucas 3:21-22  E aconteceu que, ao ser todo o povo batizado, também o foi Jesus; e, estando ele a orar, o céu se abriu,  22 e o Espírito Santo desceu sobre ele em forma corpórea como pomba; e ouviu-se uma voz do céu: Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo


A perfeita obediência à Palavra de Deus é de extremo agrado do Pai (1Sm.15.22; Sl.119.4). Quando Jesus se submeteu a ser batizado por João, a voz do Pai se fez ouvida por todos dizendo: “Este é meu Filho amado, em quem me comprazo” (Mt.3.17). Por trinta anos, Jesus fez toda a vontade do Senhor. Cristo nunca teve um só pensamento pecaminoso; não disse qualquer palavra que desagradasse a Deus; jamais fez algo de errado nem teve qualquer vício. Jesus era puríssimo em todos os seus pensamentos, palavras e atitudes. Ao ser batizado, Jesus estava se submetendo à vontade do Senhor e se identificando com os pecadores, para ser o salvador deles, de modo que “aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus” (2Co.5.21). Assim, no batismo, Jesus se fez um com seu povo, a fim de livrá-los dos pecados que, pelo batismo, haviam confessado a Deus. Multidões de judeus reconheceram seus pecados ao serem batizados por João, então Jesus se apresentou a eles como Salvador.

Devemos observar que, por três vezes, o Pai fez ecoar sua voz, testemunhando a presença de seu Filho entre os homens. Deus escolheu momentos importantes do período do ministério de Cristo: A primeira ocorrência aparece no batismo de Jesus, como já mencionamos antes, que marca o início de seu ministério. O momento é de uma glória singular, pois a Trindade se fez presente testemunhando a justiça de Cristo, o Redentor: “E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.” (Mt.3.17). Foi o único momento da história da criação, não apenas da história humana, em que a Trindade se manifestou empiricamente, pois o Espírito Santo apareceu em forma corpórea de uma pomba (Lc.3.22), o Pai fez ouvida sua poderosa voz entre os homens e o Filho de Deus estava presente em carne e osso entre os pecadores.

O segundo momento ocorreu após Jesus dar início à segunda metade de seu ministério. Durante o exercício da pregação da Palavra, Cristo ensinou a seus discípulos quem Ele era (o Filho de Deus) e o que Ele viera fazer (morrer numa cruz, carregando os pecados dos pecadores). Portanto, o ministério de Jesus pode ser dividido em duas partes, segundo o propósito da mensagem que Ele transmitia para seus discípulos: 1) Primeiramente, Jesus ensinou sobre quem Ele era (Mateus 4.12-16.20); 2) E, a partir do momento que os discípulos entenderam e creram que Ele era “o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt.16.16), Jesus começou a ensinar sobre a obra redentora que viera realizar: “Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado no terceiro dia” (Mt.16.21). 

Mateus nos conta que “seis dias depois” (Mt.17.1) de Jesus perguntar: “quem dizeis que eu sou?” (Mt.16.15), ocorreu a transfiguração de Cristo na presença de três dos discípulos: Pedro, Tiago e João: “Falava ele ainda, quando uma nuvem luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem, uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo; a ele ouvi.” (Mt.17.5). Em certo sentido, podemos dizer que a transfiguração ocorreu no meio do ministério, pois Jesus transfigurou-se logo após a mudança de foco de sua mensagem. E foi nesse momento de transição do ensino de Jesus que o Pai falou a alguns de seus discípulos, testemunhando que suas Palavras provinham do alto. 

O terceiro momento em que aquela geração ouviu a voz de Deus, foi próximo à crucificação, cinco dias antes da crucificação (Jo.12.1,12). A semana da paixão de Cristo é repleta de eventos, dentre eles o desejo, de alguns gregos, de falar com Jesus. Enquanto Jesus explica a razão de não receber os gentios ainda, Ele exclama: “Pai, glorifica o teu nome. Então, veio uma voz do céu: Eu já o glorifiquei e ainda o glorificarei.” (Jo.12.28). Os gentios deveriam esperar que o Filho de Deus fosse glorificado, a fim de voltarem para receberem a bênção da salvação. Portanto, três são os testemunhos dados por Deus Pai sobre seu Filho, conforme a Palavra do Senhor havia prescrito em Deuteronômio 19.15: “pelo depoimento de duas ou três testemunhas, se estabelecerá o fato” (Cf.Dt.17.6; 1Jo.5.7-8).

Mais uma vez, então, podemos observar que todos os acontecimentos visavam apontar para Cristo, o Filho de Deus, o Deus-Homem. Em seu batismo, Jesus recebeu o tríplice testemunho de quem Ele era: a voz do Pai ecoou confirmando que Jesus era o Filho de Deus; a presença corpórea do Espírito Santo confirmava que ali estava o prometido Messias; e, até a presença de João Batista testemunhava, da parte dos homens, que Jesus era o Cristo: 


João 1:32-34  E João testemunhou, dizendo: Vi o Espírito descer do céu como pomba e pousar sobre ele.  33 Eu não o conhecia; aquele, porém, que me enviou a batizar com água me disse: Aquele sobre quem vires descer e pousar o Espírito, esse é o que batiza com o Espírito Santo.  34 Pois eu, de fato, vi e tenho testificado que ele é o Filho de Deus.


Portanto, o batismo foi extremamente significativo para Cristo. No batismo, Jesus deu testemunho de João e recebeu o testemunho de Deus e dos homens. No batismo, Cristo mostrou-se obediente ao Pai e se uniu aos pecadores para ser o redentor deles. No batismo, Deus revelou a Trindade e a participação Trina de Deus na obra redentora. E, por fim, o batismo de João fez a transição da antiga para a nova aliança, pois Jesus utilizou-se do mesmo elemento: a água, para instituir o sinal da nova aliança. O batismo de João não seria o sinal da nova aliança, mas o rito de transição que preparou o povo para receber o verdadeiro sinal neotestamentário da aliança entre Deus e seu povo: o batismo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt.28.19).


Nenhum comentário:

Postar um comentário