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sábado, 19 de setembro de 2015

A heresia da ortodoxia

KÖSTENBERGER, Andreas J.; KRUGER Michael J.. A heresia da ortodoxia: Como o fascínio da cultura contemporânea pela diversidade está transformando nossa visão do cristianismo primitivo. Trad. Susana Klassen. São Paulo: Vida Nova, 2014.

Andreas J. Köstenberger é editor do Journal of the Evangelical Theological Society e fundador do Biblical Foundations. Atualmente é investigador sênior e professor de Novo Testamento e teologia Bíblica no Southeastern Baptist Theological Seminary em Wake Forest na Carolina do Norte. De suas obras, estão disponíveis em português: Deus, casamento e família (2011); Heresia da Ortodoxia (2014); Pai, Filho e Espírito (2014), todas da Editora Vida Nova.
Michael J. Kruger é ministro ordenado da Igreja Presbiteriana na América e professor de Novo Testamento e Cristianismo primitivo no Reformed Theological Seminary em Charlotte, Carolina do Norte. Kruger é um dos principais estudiosos das origens do Novo Testamento.
A obra está dividida em oito capítulos seccionados em três partes. Na primeira parte os autores descrevem sucintamente a tese de Bauer-Ehrman, a influência que esta exerceu sobre alguns estudiosos posteriores, e os teólogos que se opuseram. A segunda parte aborda a formação do Cânon do Novo Testamento, demonstrando que a tese Bauer está equivocada ao afirmar que o Cânon foi imposto posteriormente pelo grupo cristão. Por fim, a terceira parte se opõe à alegação de Ehrman de que é impossível conhecer o escopo doutrinário do primeiro século por ter sido alterado pelo grupo prevalecente.
O primeiro capítulo descreve a tese de Bauer-Ehrman de que a ortodoxia que se consolidou não representa o ensino de Jesus e os apóstolos, mas o conjunto doutrinário da hierarquia eclesiástica que se sobrepôs aos demais grupos cristãos. Ao discorrer a apropriação que Bultmann, Ehrhardt, Koester, Robinson e Dunn fizeram da tese de Bauer, os autores expõe os equívocos cometidos na falta de análise mais objetiva dos dados e carência de um maior número de informações que possam comprovar as teorias, tantas vezes alicerçadas na escassez de dados, assumindo, portanto, o caráter de meras conjecturas. Além das resenhas que criticaram a tese de Bauer, Köstenberger e Kruger apresentam concordemente algumas das reações posteriores que demonstraram as falhas do estudo e conclusão do proponente da tese, e de seus seguidores.
No segundo capítulo, “unidade e pluralidade”, os autores refutam o argumento de Bauer: que o cristianismo primitivo era diversificado e que, portanto, a heresia precedeu a ortodoxia. Köstenberger e Kruger, dividem a primeira parte deste capítulo conforme as quatro principais regiões que Bauer considerou possuírem grupos diferentes de cristãos: Ásia Menor, Egito, Edessa e Roma, analisando obras escritas em cada uma dessas regiões. Em seguida, os autores demonstram que a patrística representou a ortodoxia apostólica, consciente de que tinha o papel de transmitir seu conteúdo para a posteridade. Os pais da igreja defenderam e propagaram a “Regra de Fé” cristã, ou seja, as crenças cristãs ortodoxas advindas dos apóstolos. Como fiéis guardiões, eles transmitiram adiante o ensino da Escritura, conservando a “Regra de Fé” para a posteridade.
Concluindo a primeira parte do livro, o capítulo três aborda o tempo em que as heresias surgiram no meio da igreja, e a presença de mecanismos de transmissão do cristianismo autêntico. Para contrapor a tese de Bauer-Ehrman de que a ortodoxia somente se consolidou pela força no quarto século, por meio dos concílios, os autores demonstram que as principais testemunhas que foram rejeitadas por Bauer, os livros do Novo Testamento, são confiáveis e atestam a presença da ortodoxia no primeiro século, não só propagada, mas, também, supervisionada pelos apóstolos. Portanto, Köstenberger e Kruger demonstram que haviam padrões doutrinários que definiam o que era correto se crer sobre a pessoa e obra de Cristo e que a diversidade do Novo Testamento estava dentro da unidade doutrinária fundamental, se constituindo em diversidade legítima da ortodoxia enquanto as diversidades ilegítimas foram combatidas e censuradas severamente.
O quarto capítulo dá início à segunda parte do livro e aborda a formação do Cânon. A tese de Bauer tem implicações sérias para o Cânon do Novo Testamento, tornando o conceito ilegítimo, pois não havendo uma ortodoxia, e sim heresias, não é possível afirmar que haja livros canônicos. Contudo, analisando as três áreas críticas: cânon e aliança; cânon e história da redenção; cânon e comunidade, Köstenberger e Kruger demonstram que o conceito de cânon não foi desenvolvido posteriormente, mas se desenrolou naturalmente dentro da comunidade da aliança, como parte integrante do progresso orgânico da história da redenção.
No quinto capítulo, Köstenberger e Kruger apresentam e analisam evidências históricas, a partir do Novo Testamento, que comprovam que a igreja possuía consciência de que os livros que circulavam em seu meio, escritos pelos apóstolos e por pessoas próximas a eles, tinham a autoridade de Escritura à semelhança dos livros do Antigo Testamento. Os autores também citam diversos pais apostólicos que corroboram com a afirmação de que o conceito de cânon estava bastante desenvolvido no final do primeiro século, comprovando que a tese de Bauer não corresponde às evidências encontradas nas testemunhas mais antigas do cristianismo.
O capítulo seis trata dos limites do cânon do Novo Testamento. Köstenberger e Kruger demonstram que a diversidade de obras apócrifas não exclui a existência de um cânon e que os grupos heréticos, como os gnósticos, foram rejeitados a partir do uso do Antigo Testamento que estava bem consolidado no meio cristão desde o princípio. Além do Antigo Testamento, a igreja já tinha em mãos uma coletânea de livros que haviam sido recebidos como Palavra de Deus, que cedo são mencionados por pais da igreja como Escritura sem qualquer questionamento, enquanto os livros apócrifos nunca se mostraram fortes candidatos ao cânon do Novo Testamento que no início do segundo século já era considerado como cânon fechado, tendo os livros limitados ao período dos apóstolos.
O capítulo sete demonstra que o cristianismo primitivo cresceu em meio à produção e utilização de livros, a partir da tradição Veterotestamentária, desenvolvendo meios confiáveis de copiar e difundir os textos. Köstenberger e Kruger refutam a tese de Ehrman do amadorismo dos copistas cristãos, demonstrando que o cristianismo tinha uma cultura literária bastante sofisticada, tendo em vista seu constante manuseio de Escritos, vista na qualidade dos livros do Novo Testamento, na beleza estética de diversas cópias, na organizada estrutura aplicada à cópia e publicação dos livros e no uso formal do Códice que viabilizou a cópia de grandes blocos do Novo Testamento.
No último capítulo, Köstenberger e Kruger contrapõe o ceticismo de Ehrman, com respeito a fidedignidade do texto do Novo Testamento, demonstrando por meio de quatro teses: 1) a antiguidade e quantidade dos manuscritos; 2) a insignificância da maioria das variações; 3) a confiabilidade da metodologia da crítica textual; 4) a pequena quantidade e relevância das variantes não resolvidas, que apesar da presença de um grande número de variantes textuais pode-se ter certeza de que temos em mãos o texto original e que a mensagem não foi adulterada.

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