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sábado, 3 de dezembro de 2022

Sem amor

 


Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor.” (1Jo.4.7-8)


Adão e Eva viviam muito bem no jardim do Éden. Uma criação belíssima, a natureza em plena harmonia, árvores frutíferas que produziam em abundância. Um verdadeiro paraíso para o homem e a mulher. A terra produzia seu fruto sem obstáculos, pois a bênção de Deus estava sobre todas as obras de suas mãos. Tudo era muito bom refletindo a santidade daquele que tudo criou para sua glória. Todas as coisas eram muito boas, porque o Criador é muito bom. E tudo fora feito com muito amor, porque Deus é amor. Nesse amor, Adão encontrava o perfeito modelo para amar, também. E é esse amor que deve nos constranger a viver uns para os outro, afinal “se não tiver amor, nada serei” (1Co.13.2). 


De todas as bênçãos desfrutadas por Adão e Eva, a maior delas era a presença divina com eles. O Criador não abandonou sua criação, antes Ele a sustenta por suas próprias mãos continuamente. Desse modo, podemos dizer que o Senhor se deu desde o princípio ao estabelecer um relacionamento entre Ele e todas as suas criaturas, principalmente com o ser humano a quem estabeleceu como mediador entre o Criador e as demais criaturas. Deus é a maior e mais importante bênção dada ao homem e à mulher. Tudo o que havia sido entregue para eles decorria do amor de Deus e essa era a garantia de que nunca lhes faltaria nada, pois o amor de Deus não muda (assim como todo seu ser). Deus amava o homem e a mulher e nenhuma de suas bênçãos era maior do que esse amor, como Ele mesmo disse ao apóstolo Paulo: “a minha graça te basta” (2Co.12.9).


No Éden, aprendemos que amar é fazer o que é bom para o outro, pois Deus abençoou o homem com tudo o que é bom. Mas, por maior que seja o amor de Deus no Éden, sua plenitude é revelada no Calvário. É lá que “Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm.5.8). Somente o Calvário revela para nós o pleno significado de amar, pois foi na cruz que Jesus negou a si mesmo para abençoar o pecador escolhido por Ele na eternidade. Foi na cruz que Jesus mostrou que a plenitude do amor se revela no sacrifício, razão para que Paulo elogie os Tessalonicenses que demonstravam um amor abnegado (1Ts.1.3) e ordene:


Efésios 5:25-27  Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela,  26 para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra,  27 para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito.


Amar é fazer o que é certo e bom, como nos diz o apóstolo Paulo: “o amor é paciente, é benigno” (1Co.13.4). Mas, o amor não pode ser resumido em atos de bondade, pois uma pessoa pode fazer o que é bom por mera vaidade, orgulho ou interesse particular. A natureza pecadora no homem se aproveita daquilo que é bom para se gloriar, ou seja, para satisfazer seu ego pecador. É muito comum que lideres (fora e até dentro das igrejas) façam o bem para os liderados com o interesse de aparecer, serem aclamados e conquistar a simpatia do povo. Nesses casos, não há amor na prática do bem, pois o bem realizado visa apenas o benefício próprio. Não há amor em fazer o bem para alguém, visando alimentar a vaidade faminta por glória, elogios e interesses particulares. Não importa quão certo e bom seja aquilo que você faz para alguém, se não houver abnegação não há amor.


Jesus apontou o problema ao criticar sua geração, sobretudo os líderes religiosos daquele dia. Fariseus, escribas e sacerdotes oravam, jejuavam, davam esmolas e praticavam muitas coisas boas aos olhos de todo o povo. Mas, nenhuma de suas obras era praticada por amor a Deus e ao próximo, pois faziam tudo para alimentar o ego vaidoso, soberbo e interesseiro. Sem o verdadeiro amor a Deus e ao próximo, as boas obras não são santas e, portanto, não agradam a Deus. Somente o verdadeiro amor é santo e esse verdadeiro amor se revela em fazer tudo o que é certo e bom ao outro negando a si mesmo:


Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo?  47 E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo?

Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste.  2 Quando, pois, deres esmola, não toques trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.

E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompense

Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa

Praticam, porém, todas as suas obras com o fim de serem vistos dos homens; pois alargam os seus filactérios e alongam as suas franjas.  6 Amam o primeiro lugar nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas,  7 as saudações nas praças e o serem chamados mestres pelos homens.(Mateus 5.46-47; 6.1,2,5,16; 23.5-7)


Portanto, amar é fazer o que é certo e bom para o outro negando a si mesmo. E a maior demonstração do que é amor encontra-se na obra redentora, pois Cristo fez o maior bem de todos negando a si mesmo: morrer na cruz em nosso lugar para pagar a dívida de nossos pecados, a fim de nos dar a vida eterna. Não há vaidade, nem orgulho nem interesse particular nas bênçãos de Cristo a nós. Muito pelo contrário, Paulo nos diz que Cristo “a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz” (Fp.2.7-8).


É fundamental refletirmos sobre a natureza daquilo que praticamos e, também, nas razões e nos propósitos daquilo que fazemos. Amar é fazer o que é certo, pois o amor é essencialmente Santo. Não há pecado no amor, pois o amor é santo, como todos os demais atributos divinos. Amar é fazer aquilo que é bom, pois o amor é essencialmente benigno, por isso Paulo apresenta uma lista de ações que não condizem como o amor: ciúmes, vaidade, orgulho, soberba, desonra, egoísmo, irritação, melindre, injustiça (1Co.13.4-6). Amar é negar a si mesmo pelo outro, pois o amor não visa o próprio benefício, mas o bem do outro. Amar é fazer algo para abençoar despretensiosamente alguém, pois o amor tem como propósito o bem-estar do outro. E tudo isso pode ser resumido no fato de que “Deus é amor” (1Jo.4.8,16).


Viver sem amar é existir sem Deus, pois Deus é amor. Mas, não espere que apenas ateus, assassinos, ladrões e políticos demonstrem falta de amor no coração. Quando Jesus protestou a falta de amor, estava falando de uma geração de religiosos, semelhantes a muitos cristãos de nossos dias. Você pode ser uma pessoa sobremodo ativa como pastor, presbítero, diácono, professor da Escola Bíblica dominical, presidente do Sínodo, do Presbitério ou de uma Sociedade interna, mas fazer tudo apenas por vaidade, orgulho ou interesse particular. Muitos fariseus eram caridosos e devotos, dedicados e até irrepreensíveis, mas Jesus os reprovou, pois não havia amor em nenhuma de suas “boas obras”. Não importa o que você faça na igreja, se não houver verdadeiro santo amor em suas obras, elas serão todas reprovadas por Deus. Por isso, o apóstolo Paulo usou as seguintes hipérboles, falando a uma igreja tão preocupada com os dons espirituais:


1 Coríntios 13:1-3  Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o bronze que soa ou como o címbalo que retine.  2 Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e toda a ciência; ainda que eu tenha tamanha fé, a ponto de transportar montes, se não tiver amor, nada serei.  3 E ainda que eu distribua todos os meus bens entre os pobres e ainda que entregue o meu próprio corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me aproveitará


Então, já que o amor é a maior de todas a virtudes, a ponto de resumir toda a vontade de Deus para nossas vidas (Mt.22.36-40), superando até mesmo a fé e a esperança (1Co.13.13), não pode ser negligenciado em hipótese alguma. Jesus afirmou que seus discípulos seriam conhecidos por todos pela prática do amor de Cristo (Jo.13.34-35). A maior preocupação de um cristão deveria ser o viver o amor, ainda que não venha a fazer nada de extraordinário em sua vida. A respeito disso, Jesus comparou as “grandes quantias” de dinheiro que os ricos depositaram no gazofilácio com as duas míseras moedas (aproximadamente dois reais) que a viúva pobre ofertou ao Senhor (Mc.12.41-44). O amor com o qual a viúva deu seu melhor a Deus tornou sua oferta em um valor imensurável aos olhos de Deus, enquanto os ricos foram desprezados por Cristo, porque tudo o que ofertavam era por mera vaidade.


O verdadeiro e santo amor trabalha na igreja não para ser visto pelas pessoas nem para ser elogiado por elas. O verdadeiro e santo amor não diminui nem prejudica o outro, a fim de investir no próprio crescimento. O verdadeiro e santo amor não divide igrejas, criando grupos de interesses particulares. O verdadeiro e santo amor não supervaloriza bens e estruturas mais do que pessoas. O verdadeiro e santo amor jamais maquina o mal contra o próximo. Não basta falar o nome de Cristo, é preciso viver como Cristo. Não basta fazer algo bom aos olhos dos homens, é preciso fazer tudo verdadeiramente para a glória de Deus. Em todas as gerações, pessoas religiosas fazem as coisas mais absurdas em nome de Deus, porque são guiadas pelos próprios enganos do coração. O verdadeiro amor é santo, pois provem de Deus e, consequentemente, todas as suas intenções e ações são boas, justas e santas.


Portanto, é preciso lembrar as Palavras de Cristo Jesus: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me” (Lc.9.23). Toda a vida de Cristo foi marcada por abnegação, com a qual Ele suportou os muitos pecados das multidões a seu redor. Jesus não se exaltou, não diminuiu as pessoas, não agiu com orgulho ou vaidade, não desvalorizou os pecadores. Antes, Cristo exerceu uma longanimidade sem precedentes, aguentando cada limitação, fraqueza e falha de seus discípulos sem desistir deles por um só momento. E, assim, o Filho de Deus afirmou: “Como o Pai me amou, também eu vos amei; permanecei no meu amor” (Jo.15.9), pois “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim” (Jo.13.1). Foi assim que Jesus nos amou verdadeiramente até a morte, e morte de Cruz (Fp.2.8). É desse modo que devemos amar uns aos outros glorificando àquele que a si mesmo se entregou por nós, fazendo valer em nós as palavras do apóstolo Paulo: “logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl.2.20).


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