“Rogo-vos, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que faleis todos a mesma coisa e que não haja entre vós divisões; antes, sejais inteiramente unidos, na mesma disposição mental e no mesmo parecer” (1Co.1.10)
Morar na mesma casa não é sinônimo de ter comunhão. Isso acontece, porque no ocidente as pessoas crescem em uma sociedade em que o indivíduo é mais importante que o todo (o conjunto, o grupo) enquanto que no oriente, na cultura em que a Bíblia foi escrita, cada pessoa é parte de um todo que deve ser visto como indivisível. Ou seja, assim como não podemos pensar na mão, ou no pé, fora do corpo, também não devemos pensar em uma pessoa fora da família, igreja, sociedade.
O problema da individualização se torna mais evidente quando as famílias financeiramente mais prósperas particularizaram a própria casa. Cada filho tem seu quarto, sua televisão, seu computador, seu escritório, seu carro, seus utensílios, seu sabonete etc. Um come na sala, outro na cozinha, outro no quarto etc. Estão todos sob o mesmo teto, mas cada indivíduo é um mundo isolado.
Compreender a diferença entre estar apenas junto e ter comunhão é importante para sua vida familiar e, também, para a igreja. É possível estarmos juntos a qualquer pessoa, até a mais estranha: no ônibus, no metrô, em um supermercado, no shopping, na universidade, no ambiente de trabalho, no parque etc. Há muitos ambientes compartilhados nas cidades. Isso não significa que os cidadãos tenham comunhão, pois as pessoas estão sendo ensinadas a viver como indivíduos independentes.
Portanto, é bastante fácil ficarmos juntos a diversas pessoas em nosso dia a dia. Boa parte delas não ouvirão o que falamos, não olharão em nossos olhos, não falarão conosco nem mesmo nos cumprimentarão. O ambiente partilhado, no mundo ocidental, não representa a unidade de um povo, pois é visto apenas como objeto que atende às necessidades individuais. Ele não comunica um relacionamento entre as pessoas, muito menos uma unidade entre aqueles que estão dentro dele, apenas se dispõe a atender às necessidades e desejos particulares. O shopping é o ambiente que melhor expressa a falta de significado corpóreo em seu prédio. As pessoas vão ao shopping para satisfazer apetites individuais, de modo que não é necessário que haja uma interação entre elas.
Por essa razão, até mesmo uma casa pode acolher pessoas sem, necessariamente, uni-las em um relacionamento íntimo, a comunhão. De modo semelhante, o prédio de uma igreja nem sempre comunica que as pessoas que fazem parte dele têm um relacionamento íntimo e sólido, o mesmo coração e a mesma mente, e estão pensando umas nas outras como partes de um grande corpo. O problema é mais evidente em diversas igrejas enormes, com milhares de membros, pois, como já ouvimos alguns frequentadores dizer: “Você entra e sai sem ser notado”.
Para tratar a questão da comunhão, precisamos resgatar a visão de corpo. Em países patriotas, o cidadão aprende a lutar, defender e dar a vida por seu país, pois sua família e seu povo são vistos como uma unidade. Esse patriotismo é um resquício da visão bíblica de corpo. Em sua oração sacerdotal, Jesus pede ao Pai que seja gracioso com seus discípulos para que eles sejam um:
Pai santo, guarda-os em teu nome, que me deste, para que eles sejam um, assim como nós. [...] Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim (Jo.17.11,20-23)
O apóstolo Paulo também ensinou os cristãos gentios a viverem em unidade. O ensino bíblico não deveria ser exclusivo para judeus, pois “agora, em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo. Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade” (Ef.2.13-14). Assim, os gentios também deveriam viver como corpo, preservando a unidade promovida pela obra redentora:
Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo digno da vocação a que fostes chamados, com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros em amor, esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz; há somente um corpo e um Espírito, como também fostes chamados numa só esperança da vossa vocação; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos. (Ef.4.1-6).
Vivei, acima de tudo, por modo digno do evangelho de Cristo, para que, ou indo ver-vos ou estando ausente, ouça, no tocante a vós outros, que estais firmes em um só espírito, como uma só alma, lutando juntos pela fé evangélica (Fp.1.27).
Ser parte do corpo é ser parte de algo indivisível. Jesus afirmou: “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer” (Jo.15.5). Conforme falamos anteriormente, cada parte de nosso corpo tem seu sentido no corpo. Não é possível conceber a ideia de mão, senão em sua relação com o corpo. Afinal, as partes de um corpo mutilado ainda são partes daquele corpo, pois não é possível se dividir um corpo. Basta considerar que nenhuma das partes do corpo foram feitas para existir à parte de seu corpo. De forma similar, não é possível pensar no marido ou na esposa, nos pais ou nos filhos a não ser dentro da família. Logo, também podemos dizer que não é possível pensar em cristãos sem conceber a igreja. Por isso, corretamente afirmou Agostinho: “Não há salvação fora da igreja”.
Podemos considerar que a fragmentação da sociedade, da igreja e da família é uma estratégia para o enfraquecimento da vida humana, tornando-a mais vulnerável na guerra. Pessoas que só pensam em si mesmas não lutam com paixão quando a família, a igreja e a nação precisam de soldados valentes para defende-las. E não havendo quem lute não há resistência para aqueles que quiserem atacar. Por isso, está sendo relativamente fácil criar o caos no ocidente, pois cada pessoa está preocupada apenas em salvar a sua própria vida.
Você precisa acordar, a fim de enxergar a realidade como Deus a criou. Deus fez você como parte de um todo, não apenas como um indivíduo isolado. O homem é parte de uma criação maior e Deus deixou bem claro que estar sozinho não era seu propósito: “Disse mais o SENHOR Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea” (Gn.2.18). Deus fez o homem para ser parte de uma família e de um povo. Todos nascem de uma relação familiar (pai e mãe); e, naturalmente, formam um povo maior, as nações (Gn.12.2), pois este foi o propósito do Senhor desde o princípio: “vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por intermédio de Jesus Cristo” (1Pe.2.5).
Portanto, pensar como corpo é ver a si mesmo, e os outros também, como parte desse corpo. O que você faz, faz dentro do corpo e para o corpo, pois seus dons, seu conhecimento, seus esforços, seu tempo, seus bens servem não somente a você mesmo, mas, também, ao corpo, pois você é parte dele: “Não podem os olhos dizer à mão: Não precisamos de ti; nem ainda a cabeça, aos pés: Não preciso de vós. Pelo contrário, os membros do corpo que parecem ser mais fracos são necessários” (1Co.12.21-22). Sua vida é parte do movimento do corpo, no qual está inserida, e tanto é abençoada pelo corpo como é instrumento para abençoar cada parte do todo: “Alegrai-vos com os que se alegram e chorai com os que choram” (Rm.12.15).
Então, não fuja da macro realidade! Pare de olhar apenas para si mesmo! Não somos apenas indivíduos, somos parte de um todo, criados para viver nesse todo. Logo, você deve viver para esse todo que é sua família, a igreja, a sociedade e, até, a criação. É dessa forma que você verá o propósito de seus dons e de seus papeis sociais (marido, esposa, pais, mãe, pastor etc.). E esse todo no qual você se encontra foi criado por Deus. Logo, quando você luta em favor da família, da igreja, da sociedade e da criação, está lutando por Deus, o Criador de tudo, “servindo de boa vontade, como ao Senhor e não como a homens, certos de que cada um, se fizer alguma coisa boa, receberá isso outra vez do Senhor” (Ef.6.7-8). Assim como o corpo espera que cada parte dele contribua com o bem-estar de todos, também a família, igreja, sociedade e criação esperam que você cumpra seu papel como parte delas, contribuindo para o bem-estar de todos.
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