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sexta-feira, 20 de março de 2020

Habacuque (1.12-17) - Diante da vontade de Deus

Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal e a opressão não podes contemplar” (Hc.1.13)

O livro de Habacuque foi construído em forma de diálogo. Não um diálogo comum, como aqueles que aparecem nas obras de Platão ou mesmo em literaturas de ficção. Habacuque ergue a voz em oração e Deus lhe revela sua sentença decretada contra seu povo (Hc.1.1). Após a resposta divina (Hc.1.5-11) à primeira oração do profeta (Hc.1-4), Habacuque volta a falar com Deus (Hc.1.12-17). A Palavra do Senhor dirigida ao profeta o deixou mais inquieto do que antes, pois Deus afirmara que usaria um povo pagão para castigar o povo do Senhor. Deus favoreceria um povo injusto e cruel para castigar as injustiças e maldades de seu próprio povo? Como a injustiça do homem poderia ser instrumento da justiça do Senhor? Já que Deus é tão puro de olhos que não pode ver o mal (Hc.1.13), como, então, suportaria ver tanta maldade entre os filhos dos homens, contra seu próprio povo escolhido? Inclinemos, agora, nossos olhos para o texto de Habacuque 1.12-17:

Não és tu desde a eternidade, ó SENHOR, meu Deus, ó meu Santo? Não morreremos. Ó SENHOR, para executar juízo, puseste aquele povo; tu, ó Rocha, o fundaste para servir de disciplina.  13 Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal e a opressão não podes contemplar; por que, pois, toleras os que procedem perfidamente e te calas quando o perverso devora aquele que é mais justo do que ele?  14 Por que fazes os homens como os peixes do mar, como os répteis, que não têm quem os governe?  15 A todos levanta o inimigo com o anzol, pesca-os de arrastão e os ajunta na sua rede varredoura; por isso, ele se alegra e se regozija.  16 Por isso, oferece sacrifício à sua rede e queima incenso à sua varredoura; porque por elas enriqueceu a sua porção, e tem gordura a sua comida.  17 Acaso, continuará, por isso, esvaziando a sua rede e matando sem piedade os povos? (Hc.1.12-17 - ARA)

Parece-nos que Habacuque esperava uma disciplina mais direta que manifestasse a santa justiça divina, como ocorreu em outras ocasiões que exigiram a intervenção divina: Caim (Gn.4.10-16), Dilúvio (Gn.6-9), Torre de Babel (Gn.11.5-9), Sodoma (Gn.19), Egito (Ex.5-15) etc. Agora, Deus usaria um povo estranho e pagão para castigar seu próprio povo. Que solução seria essa? Como Deus restauraria seu povo destruindo-o por meio de um povo pagão? Já não estava tão ruim a situação social de Judá? Como Deus disciplinaria seu povo por meio de um povo ímpio que fazia pouco caso da justiça e agia conforme seu bel-prazer? (Hc.1.7) O profeta ficou mais perplexo ainda ao receber a sentença de Deus. O Senhor estava pronto para intervir castigando toda perversidade de Israel, mas não da forma como o profeta estava esperando ouvir da parte de Deus.

Nem sempre as respostas do Senhor atendem às nossas expectativas. Paulo nos diz que “a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Co.1.25). O próprio Paulo teve suas orações negadas quando rogou que Deus o livrasse do mensageiro de Satanás (2Co.12.7-9). Muitas vezes, pensamos ter respostas para os problemas, mesmo que não tenhamos a capacidade para solucioná-los. Deus nos revela que nem sempre nossos raciocínios estão em acordo com a perfeita vontade de Deus. O que fazer nesses momentos? É preciso confiar no Senhor! Habacuque não está compreendendo o plano divino para purificar seu povo, todavia demonstra conhecer bem os atributos de Deus, o que lhe proporciona segurança.

Você confia na vontade de Deus ou acha que seus planos são melhores? A ansiedade é uma expressão de insegurança diante da realidade e, portanto, ausência de fundamento sólido no qual possa sentir-se firme e seguro nos momentos difíceis da vida (Fp.4.6). Habacuque deseja entender o plano divino e, por isso, continuará questionando a Deus em suas orações. Porém, o profeta deixa claro que seus questionamentos não são resultado de insegurança nem medo nem dúvida, pois sabe que Deus é uma inabalável Rocha para todos os que esperam nEle. E você, confia no Senhor? Sabe que Deus não abandona seu povo? Seu coração descansa nos eternos planos de Deus? Então, a “a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus” (Fp.4.7).

Em sua nova oração (Hc.1.12-17), Habacuque inicia falando dos atributos incomunicáveis e gloriosos do Senhor: eternidade e imutabilidade. Deus permanece para sempre. Ele não se abala com a história humana nem é afetado pelas ações dos homens. Portanto, os pecados de seu povo não abalavam a Deus, de modo que Este viesse a reagir precipitadamente ou movido por emoções. O Senhor é de eternidade a eternidade e está acima de toda a sua criação, ainda que a governe e a conduza, se relacionando com ela. Deus não age por impulso, não é inconsequente em seus planos e atos. O Senhor é perfeito em todo seu querer. Abaixo, apresentamos duas traduções diferentes do versículo 12, destacando a expressão hebraica: “LÓ NAMUT”. No primeiro caso, o profeta parece mostrar sua plena segurança em Deus (está em acordo com a Septuaginta). Na segunda tradução, o profeta estaria se referindo ao fato de Deus ser inabalável (o plural do verbo estaria concordando com o plural de “ELOAH”).

Não és tu desde a eternidade, ó SENHOR, meu Deus, ó meu Santo? Não morreremos. Ó SENHOR, para executar juízo, puseste aquele povo; tu, ó Rocha, o fundaste para servir de disciplina (Versão Revista e Atualizada – Sociedade Bíblica do Brasil)

Porém, tu existes desde sempre, ó Senhor! És o meu Deus santo que não morre. Ó Senhor, meu protetor, foste tu que escolheste os caldeus para exercerem a tua justiça (Moderna Tradução Portuguesa – Sociedade Bíblica de Portugal)

Nada abala a Deus! Por isso, também, disse o salmista: “O SENHOR está comigo; não temerei. Que me poderá fazer o homem?” (Sl.118.6). Portanto, mesmo em sua perplexidade, Habacuque esboça sua confiança em Deus. Nada aconteceria por acaso. Um povo violento viria sobre Judá, mas Deus o estabelecera para cumprir sua vontade. A Rocha inabalável de Israel firmara a nação adversária (caldeus), instrumento para juízo divino. O Senhor não é expectador da história humana, mas o Soberano Escritor dela. Enquanto os homens se desesperam diante das catástrofes, epidemias, guerras e crises sociais, Deus permanece firme como uma Rocha, sólido fundamento para aqueles que esperam nEle. Como nos diz o profeta Isaías: “Para que se saiba, até ao nascente do sol e até ao poente, que além de mim não há outro; eu sou o SENHOR, e não há outro. Eu formo a luz e crio as trevas; faço a paz e crio o mal; eu, o SENHOR, faço todas estas coisas” (Is.45.6-7).

Habacuque está confuso com a forma como Deus manifestaria sua justiça. Tiago em sua carta nos diz que “a ira do homem não produz a justiça de Deus” (Tg.1.20). Habacuque levanta a mesma questão perante o Senhor. Como Deus manifestaria sua justiça por meio de obras injustas de um povo ímpio? Seria Deus glorificado na injustiça de uma nação pagã? Veremos a resposta do Senhor nos versículos posteriores, no capítulo 2 do livro. O profeta está preocupado que a intervenção divina seja um instrumento para glorificar o NOME de Deus perante todas as nações. Desse modo, a oração do profeta entra em pleno acordo com a oração do “Pai nosso” ensinada pelo Senhor Jesus: “Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt.6.9-10).

O profeta levanta uma importante questão: após os caldeus arremeterem sobre Judá, eles não tributarão glórias e honras ao Senhor, Deus de Israel. Aqueles pagãos invocariam seus deuses de pau e pedra e atribuiriam a eles todo o louvor pela vitória sobre o povo de Deus. Eles confeririam a vitória a suas próprias forças, pois era um povo presunçoso e orgulhoso que confiava em seu próprio braço (Dn.4). O Senhor não seria glorificado entre os povos, antes seria considerado como um deus inferior aos deuses dos babilônios. Como o Deus de Israel poderia aceitar tal coisa? O profeta está preocupado com a glória do Senhor, pois não entende como o Santo de Israel seria glorificado através da arremetida dos caldeus.

É interessante como a escolha que Deus fez de usar os caldeus para cumprir seus propósitos eternos nos faz refletir a escolha que Jesus fez de Judas Iscariotes para que este fosse apóstolo (mesmo sendo um filho do diabo (Jo.6.70-71) e, posteriormente, o traidor. Seria sábia tal escolha? Sim, vemos no desfecho da história. Ou seja, da mesma forma como os planos do Senhor mostraram-se perfeitos em toda a história redentora, também deveriam os discípulos de Cristo confiar em todo seu direcionamento para a igreja. A necessidade dessa confiança mostrou-se maior nos dias em que a igreja esteve lutando contra o império das trevas personificado no império romano, enfrentando adversários que guerreavam injustamente e perversamente (Atos dos Apóstolos, Apocalipse).

Quais as suas preocupações quando as coisas estão ruins a seu redor? Você quer soluções que livrem você do problema de qualquer maneira, ou se preocupa com a forma como as soluções são apresentadas? Jesus nos ensinou a orar desejando a manifestação da glória de Deus (Mt.6.9-13) e não apenas a satisfação de nossas vontades. Um verdadeiro cristão deve amar a Deus “de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força” (Dt.6.5; Mt.22.37) desejando a glória do Senhor acima de suas próprias vontades. Lembre-se que foi exatamente isso que Jesus fez ao orar próximo do momento mais difícil de sua vida: a crucificação: “Pai, se queres, passa de mim este cálice; contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua.” (Lc.22.42). Então, confie você também no Senhor, mesmo quando não compreender o agir de Deus, olhando firmemente para aquele que suportou tudo por amor ao Pai e, também, à sua igreja (Hb.12.2-3). Os planos do Senhor são perfeitos e podem ser vistos na história redentora, desde a promessa dada a Adão e Eva (Gn.3.15) até o dia em que o Cordeiro de Deus consumou a nossa redenção (Jo.19.30). Portanto, confie no Redentor!

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