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sexta-feira, 5 de julho de 2019

Ensine seu filho a não matar

Eu, porém, vos digo que todo aquele que sem motivo se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo” (Mt.5.22)

Em seu famoso “sermão do monte” (Mateus 5 a 7), Jesus apresentou profundas implicações de alguns dos dez mandamentos: o sexto mandamento (Mt.5.21-26), o sétimo mandamento (Mt.5.27-32) e o nono mandamento (Mt.5.33-37 // Lv.19.12), além de fazer menção a Êxodo 21.24, Levítico 19.18, Deuteronômio 6.4-5 entre outros textos do Antigo Testamento. Em seus ensinos, Jesus costumava fazer referência aos principais problemas encontrados tanto entre as multidões quanto entre os líderes dos judeus. Portanto, não foi por acaso que Cristo escolheu abordar apenas alguns dos mandamentos em seu sermão. Tais problemas eram mascarados pela prática mecânica de ritos e tradições, ou seja, havia uma falsa ideia de cumprimento da lei do Senhor, enquanto os mandamentos de Deus eram transgredidos no mais profundo do coração daquela geração religiosa.

Devemos salientar que o propósito de Deus nunca foi salvar pecadores por meio do cumprimento da lei. Conforme Jesus, a lei do Senhor nos mostra a miséria de nosso coração e, consequentemente, nossa incapacidade de adentrar ao reino dos céus por nossos próprios méritos, pois eles não existem: “Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus” (Mt.5.20). Quando Cristo extraiu profundas aplicações dos mandamentos de Deus (Mt.5-7), ele tornou evidente que a justiça necessária ao homem está muito acima da capacidade do pecador. Deste modo, a lei do Senhor não deveria promover um senso de autojustificação, como ocorreu com os escribas e fariseus (Lc.18.10-14), mas a consciência da imensa necessidade da graça e da misericórdia divinas.

Portanto, devemos ensinar aos filhos os mandamentos de Deus evitando, ao mesmo tempo, que o coração deles alimente um orgulho de si mesmos. Para o coração pecador, até aquilo que é bom pode ser motivo para fomentar algum pecado. É possível que uma pessoa ensinada a viver a prática dos mandamentos comece, sem perceber, a orgulhar-se de si mesma considerando-se mais santa que as demais pessoas. Devemos, então, ensinar a prática da Palavra de Deus com um constante cuidado com a disposição do coração, impedindo o cultivo do orgulho. O senso de dependência do Senhor (que leva à humildade) deve ser constantemente alimentado, para que todo bem aprendido e praticado seja límpido e glorifique a Deus, verdadeiramente.

O primeiro dos mandamentos citados por Jesus em Mateus 5 é: “Não matarás” (Ex.20.13 // Mt.5.21-26). Lendo as páginas dos quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), podemos ver que os judeus tinham sérios problemas a respeito da aplicação deste mandamento. Os escribas e fariseus se gabavam de cumprir toda a Lei de Deus (Lc.18.11-12), mas não percebiam que a quebravam profundamente em seus corações (Mt.23). A gravidade do problema pode ser melhor observada em João 18.29-31 que nos revela a ocasião na qual eles entregaram Jesus para ser morto por Pilatos sem qualquer peso na consciência, achando, ainda, que não estavam quebrando o sexto mandamento: “Então, Pilatos saiu para lhes falar e lhes disse: Que acusação trazeis contra este homem? Responderam-lhe: Se este não fosse malfeitor, não to entregaríamos. Replicou-lhes, pois, Pilatos: Tomai-o vós outros e julgai-o segundo a vossa lei. Responderam-lhe os judeus: A nós não nos é lícito matar ninguém” (Jo.18.29-31). Desse modo, os judeus não mataram Jesus com as mãos, mas o mataram no coração, tornando-se assassinos diante de Deus, como disse o apóstolo Pedro: “vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos” (At.2.23).

Tendo em vista a ampla ignorância tanto dos líderes quanto das multidões sobre as implicações do sexto mandamento, Jesus nos deu a correta compreensão e aplicação dele (Mt.5.21-26): “todo aquele que sem motivo se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo”. Conforme Cristo, o coração é a fonte para todo tipo de pecado: “do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias” (Mt.15.19). É dele que procedem a ira indevida e injusta, a maldade para com o próximo, a ofensa contra as pessoas, os desejos de vingança, a inimizade sem qualquer motivo, a tentativa de prejudicar pessoas indesejadas etc. É do coração que surgem sentimentos e desejos ruins contrários ao amor. Antes de alguém matar, seu coração desejou o mal contra o outro e em seu coração já o matou na presença de Deus.

Diante disso, devemos considerar que a briga entre filhos não indica apenas um problema de relacionamento circunstancial, mas, também, a necessidade de se trabalhar os corações. As crianças precisam conhecer o próprio coração, a fim de domina-lo, corrigi-lo e redireciona-lo para o que realmente é bom. Crianças não trabalhadas tornam-se adultos com diversos problemas, de modo que aquilo que aparentemente é simples na infância pode tornar-se bastante complicado na fase adulta. Grandes problemas encontrados em adultos: orgulho, egoísmo, hedonismo, narcisismo, avareza, indisposições etc., não surgem de uma hora para a outra. Tais pecados fazem parte natural do coração pecador desde o nascimento da pessoa e são desenvolvidos (potencializados) durante a vida. Portanto, um dos principais papéis dos pais é evitar que tais pecados se desenvolvam, reduzindo-os ao máximo por meio do fiel ensino da Palavra de Deus, capacitando a criança, em Cristo e para Cristo, a lutar contra todos os maus desejos do coração por meio do poder do Espírito de Deus.

A principal raiz da indisposição do coração contra o próximo é o demasiado amor próprio. Por querer que tudo gire em torno de si mesmo, o coração reage hostilmente ao encontrar alguém que impede o sucesso do egocentrismo em alguma medida. O coração pecador não gosta de dividir, pois quer tudo para si; não gosta de ser corrigido, pois quer estar sempre certo; não gosta de ser menor que outros, pois se acha o mais importante de todos; não se contenta com o que tem, pois se considera digno do melhor; não aceita as pessoas como elas são, pois se acha o padrão de vida para todos etc. Portanto, a principal resposta na luta contra a quebra do sexto mandamento é: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt.22.39) e “ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros” (Jo.13.34). E para que isso ocorra é preciso, primeiramente, negar a si mesmo, ou seja, subjugar o coração ao senhorio de Jesus Cristo (Mt.16.24).

Enquanto o coração da criança, ou do adulto, for senhor da própria vida, encontraremos a tirania de um rei déspota que faz tudo como lhe apraz não se importando com as implicações de suas atitudes (Jr.17.9). Quando o coração pecador domina, Deus é colocado de lado em todas as decisões. Tudo o que importa para o coração tirano é a satisfação de sua própria vontade. Por isso, é preciso destronar tal coração, tirando-o do trono da vida do pecador, a fim de que Cristo seja o único Rei da vida da criança, ou do adulto. Os pais devem ajudar os filhos a entregar o coração ao Senhor Jesus numa disposição consciente contra a tirania do próprio coração. Para isso, é preciso que os pais sejam claros e precisos em mostrar aos filhos que certos comportamentos decorrem da tirania do coração e que, portanto, precisarão lutar contra este coração, fazendo o contrário daquilo que desejam. Não é uma tarefa fácil, mas com insistência e compreensão pode ser bem-sucedida, pela graça de Deus.

Ensine seu filho a lutar contra o demasiado amor próprio amando as pessoas ao redor, em grande medida. Insista em fazê-lo dividir tudo com satisfação, não apenas por obrigação. Mostre que o amor de Deus não diminui (nem dos pais) ao dividi-lo com outras pessoas. Mostre que dar é mais feliz do que receber, ensinando-o a ser feliz com a felicidade dos outros. Ensine-o a falar bem das pessoas, compartilhando coisas boas a respeito dos outros e impedindo que comentários maledicentes ocorram em casa. Faça-o experimentar o prazer pelo bem comum, ou seja, ajude-o a participar de momentos que não foram decididos por ele (e até sejam contrários ao gosto dele), mas que são bons para o conjunto. Ou seja, não apenas fale sobre o amor, mas, acima disso, mostre o amor conduzindo-o a praticá-lo também.

Portanto, para que os filhos aprendam a não matar, precisarão aprender a negar a si mesmos. E no lugar do demasiado amor próprio deverão colocar o amor pelo outro. Essas substituições ocorrerão silenciosamente dentro deles, assistidas unicamente por Deus. Todavia, os pais são de grande importância na condução dos filhos, a fim de viabilizar o processo de substituição daquilo que é mau pelo que é bom. E mesmo que ninguém possa ver o que há dentro do coração, os resultados serão vistos por todos no decurso da vida deles, “porque a boca fala do que está cheio o coração. O homem bom tira do tesouro bom coisas boas; mas o homem mau do mau tesouro tira coisas más” (Mt.12.34-35).

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