“Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão
no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em
tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te” (Dt.6.6-7)
Mais devastador que um bombardeio contra um povo é o ataque
sorrateiro à família, alicerce de qualquer nação. Enquanto houverem famílias fortes,
qualquer raça será capaz de se reestruturar, mesmo após as mais terríveis assolações.
Todavia, uma nação formada por famílias desestruturadas está fadada à ruina
moral e consequentemente ao desastre cultural, político e econômico. Por essa
razão, desde o jardim do Éden, Satanás ataca a família, destruindo, assim, as
bases da sociedade. E todas as vezes em que foi bem-sucedido, a Escritura nos
revela a corrupção de todo um povo (Gn.6).
Portanto, um Estado forte é constituído por famílias fortes.
Ou seja, não é o Estado que deve ser grande e poderoso, mas as famílias que
devem ser saudáveis e inabaláveis. O Estado de Israel era pequeno e
relativamente simples, mas enquanto as famílias estivessem bem estruturadas, a
nação desfrutaria de bem-estar social. Ou seja, um importante fator
determinante para a pequena dimensão do Estado de Israel era a centralidade da
família. Enquanto o Estado supervisionava o cumprimento da Lei do Senhor, as
famílias eram responsáveis pela manutenção diária da vida social. Essa
responsabilidade pode ser vista nas palavras de Paulo que aplica à igreja o
cuidado para com o próximo:
1 Timóteo 5:4,8-9 Mas, se alguma viúva tem filhos ou netos, que
estes aprendam primeiro a exercer piedade para com a própria casa e a recompensar
a seus progenitores; pois isto é aceitável diante de Deus.
8 Ora, se alguém não tem cuidado
dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o
descrente. 9 Não seja
inscrita senão viúva que conte ao menos sessenta anos de idade, tenha sido
esposa de um só marido.
Conforme Paulo, o sustento dos idosos é uma responsabilidade
dos filhos ou parentes próximos. Esse procedimento é educativo e justo, pois
tanto exige a prática do amor quanto a obrigação de honrar aqueles que haviam
sustentado a família por muitos anos, quando os filhos eram ainda jovens. Caso
alguém não tivesse filhos vivos, então a responsabilidade cairia sobre os
parentes mais próximos que deveriam mostrar semelhante amor para com os
familiares (Dt.5.16; 27.16). E, em casos extremos, os cidadãos deveriam mostrar
compaixão para com os necessitados acolhendo-os, assim como Deus acolheu seu
povo livrando-o do sofrimento do Egito e sustentando-o com pão, carne e água
por quarenta anos no deserto (Lv.25.35; Dt.8.1-4). Esse é o sistema bíblico e
orgânico de aposentadoria dos idosos e inválidos.
Levítico 25:35-43 Se teu irmão empobrecer, e as suas forças
decaírem, então, sustentá-lo-ás. Como estrangeiro e peregrino ele viverá
contigo. 36 Não receberás
dele juros nem ganho; teme, porém, ao teu Deus, para que teu irmão viva
contigo. 37 Não lhe darás teu
dinheiro com juros, nem lhe darás o teu mantimento por causa de lucro. 38 Eu sou o SENHOR, vosso Deus,
que vos tirei da terra do Egito, para vos dar a terra de Canaã e para ser o
vosso Deus. 39 Também se teu
irmão empobrecer, estando ele contigo, e vender-se a ti, não o farás servir
como escravo. 40 Como
jornaleiro e peregrino estará contigo; até ao Ano do Jubileu te servirá; 41 então, sairá de tua casa, ele e
seus filhos com ele, e tornará à sua família e à possessão de seus pais. 42 Porque são meus servos, que
tirei da terra do Egito; não serão vendidos como escravos. 43 Não te assenhorearás dele com
tirania; teme, porém, ao teu Deus.
O direito à posse perpétua foi um importante instrumento
para garantir o equilíbrio econômico em Israel. As famílias que conquistaram
suas terras por ocasião da entrada em Canaã tinham a garantia de que essas
terras pertenceriam perpetuamente à família. Para aquisição de novas
propriedades, o povo deveria conquistar novas terras dentro dos amplos limites
constituídos como fronteiras para a nação (Dt.11.24; Js.1.4). Portanto,
conforme o sistema de Israel, a propriedade de uma família somente poderia ser
vendida temporariamente, dando à família o direito de resgatá-la posteriormente
(Lv.25.8-34), impossibilitando, assim, que algumas famílias se tornassem donas
de muitas terras enquanto outras ficassem sem nada (Is.5.8).
A Lei de Israel não impunha uma igualdade, mas impedia a tirania
e o monopólio de algumas poucas famílias. Ou seja, em Israel poderia haver rico
e pobre, mas não deveria haver pessoas tomando conta de toda a terra enquanto
outras viviam na completa miséria. O mínimo aceitável era o sustento necessário
no dia a dia, garantido pelas leis em favor dos necessitados, e o máximo
permitido era o enriquecimento justo, fruto do trabalho árduo, honesto e não
avarento, sem tirar dos outros o mesmo direito de ter o básico para a
sobrevivência: moradia e sustento. O décimo mandamento: não cobiçarás!
(Ex.20.17) acusa a proibição divina do enriquecimento indevido. Ninguém deveria
querer o que é do outro, incluindo a posse de terras. Cada qual deveria
desenvolver sua própria terra. Todavia, seria possível arrendar a terra de
outra família por tempo limitado (Lv.25.8-9) e dela tirar proveito pelo tempo
em que estivesse sob o domínio de quem a adquiriu temporariamente.
A agricultura e a pecuária foram as principais fontes de
sustento dos povos antigos. Contudo, devemos lembrar que outras formas de
trabalho eram possíveis e lícitas: transações comerciais, trabalhos liberais
(professor, médico, jornaleiro, cozinheiro, servidor), produção têxtil,
metalúrgica, de perfumista, de padeiro, de carpinteiro, de joalheiro etc.
(Ex.28.3; 31.1-11; 35.30-35; 1Sm.8.13; 1Rs.10.28). Portanto, as famílias de
Israel poderiam ser bem-sucedidas tanto no bom uso da terra quanto no bom
exercício de suas profissões, pois não era proibido, ao povo de Deus, adquirir
riquezas.
O pequeno livro de Rute, nos mostra a boa relação que
deveria haver entre ricos e pobres. Boaz, o resgatador de Noemi e Rute, era um
homem “de muitos bens” (Rt.2.1) e os
havia adquirido de forma justa e legal, em conformidade com as leis de Israel.
Ele possuía trabalhadores à sua disposição e cumpria sua obrigação como
provedor dos pobres, deixando que os necessitados entrassem em suas terras para
colher os frutos da produção agrícola que caíssem ao chão, conforme ordenança
do Senhor (Lv.19.9-10). Assim, no livro de Rute, a relação entre rico e pobre,
proprietário e trabalhador é boa e agradável:
Rute 2:4-10 Eis que Boaz veio de Belém e disse aos
segadores: O SENHOR seja convosco! Responderam-lhe eles: O SENHOR te
abençoe! 5 Depois, perguntou
Boaz ao servo encarregado dos segadores: De quem é esta moça? 6 Respondeu-lhe o servo: Esta é a
moça moabita que veio com Noemi da terra de Moabe. 7 Disse-me ela: Deixa-me rebuscar
espigas e ajuntá-las entre as gavelas após os segadores. Assim, ela veio; desde
pela manhã até agora está aqui, menos um pouco que esteve na choça. 8 Então, disse Boaz a Rute: Ouve,
filha minha, não vás colher em outro campo, nem tampouco passes daqui; porém
aqui ficarás com as minhas servas. 9
Estarás atenta ao campo que segarem e irás após elas. Não dei ordem aos servos,
que te não toquem? Quando tiveres sede, vai às vasilhas e bebe do que os servos
tiraram. 10 Então, ela,
inclinando-se, rosto em terra, lhe disse: Como é que me favoreces e fazes caso
de mim, sendo eu estrangeira?
Portanto, toda a responsabilidade com o sustento dos pobres
caía sobre as famílias de Israel, exigindo-lhes amor e obediência: “Quando também segares a messe da tua terra,
o canto do teu campo não segarás totalmente, nem as espigas caídas colherás da
tua messe. Não rebuscarás a tua vinha, nem colherás os bagos caídos da tua
vinha; deixá-los-ás ao pobre e ao estrangeiro. Eu sou o SENHOR, vosso Deus”
(Lv.19.9-10). Desse modo, o Estado não ficava sobrecarregado nem precisa
possuir uma superestrutura. Os impostos não precisavam ser altos e as pessoas
eram conscientizadas quanto aos deveres para com o próximo, fazendo-as
praticantes, no dia a dia, do mandamento: “amarás
o teu próximo como a ti mesmo” (Lv.19.18).
A responsabilidade familiar de cuidar dos necessitados foi
aplicada à vida da igreja do Novo Testamento que não deveria se esquecer dos
pobres (At.20.35; Gl.2.10), a começar pelo cuidado “para com a própria casa” (1Tm.5.3-16). Ou seja, as obrigações
familiares impostas no Pentateuco destinam-se a reger a vida de todas as
pessoas, e a igreja deve ser exemplo nisso (At.2.42-47). Os cristãos, chamados
de “família de Deus” (Ef.2.19), tem a
incumbência de cuidar uns dos outros (2Co.9.6-15), assim como Moisés ensinou
para o Estado de Israel.
(Texto selecionado do artigo intitulado: O Estado conforme a
Escritura. Disponível em
http://voxscripturae.blogspot.com/2018/06/o-estado-conforme-escritura.html)
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