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sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Romance e redenção em Rute (3/4)

Disse-lhe Noemi, sua sogra: Minha filha, não hei de eu buscar-te um lar, para que sejas feliz?” (Rt.3.1)

O amor é um grande aliado nas dificuldades da vida. Por causa dele, Jacó suportou trabalhar quatorze anos com Labão, sem reclamar, mesmo sendo enganado diversas vezes, pois a recompensa de seu trabalho era Raquel (Gn.29.20,30). Por amor, Sara aceitou ser levada para a casa de um rei estranho, Abimeleque, correndo o risco de ser defraudada, pois prezava pela vida de seu grande amor, Abraão (Gn.20). O amor nos ajuda a sofer as dificuldades com paciência e torna as lutas mais suportáveis. O amor torna desertos em mananciais e alivia as amarguras desta vida. Rute enfrentou longo período de trabalho no campo, fortalecida pelo amor de Boaz.

A sega da cevada e do trigo haviam acabado (Rt.2.23), e, por isso, Rute não via mais Boaz. Em casa, Rute sonhava acordada, suspirando o desejo de ter continuado trabalhando no campo de Boaz, só para ter a alegria de vê-lo e conversar um pouco mais com ele. Como foram felizes aqueles longos dias de trabalho, pois o amor costuma transformá-los em poucas horas de um dia encantador. O trabalho parecia-lhe mais leve, e as horas eram alegres, adornados com a ternura e os cuidados de Boaz. Jacó também experimentara esta sensação quando trabalhava por Raquel, pois “por amor a Raquel, serviu Jacó sete anos; e estes lhe pareceram como poucos dias, pelo muito que a amava” (Gn.29.20). Mas, infelizmente, não havia mais nada para colher nos campos, e Rute não podia se expor indo à casa de Boaz. Ela era viúva e deveria esperar pelo resgatador. Mal sabia ela que Deus havia lhe reservado uma abençoada família, junto ao piedoso Boaz.

Essa não foi à primeira vez em que Deus fez do casamento um instrumento para o cumprimento de seu propósito redentor. O povo de Deus aguardava a vindo do Salvador por meio do nascimento do Messias, e o ambiente para a manifestação do Filho de Deus seria a família. Os filhos de Deus aguardavam que um homem temente ao Senhor e uma mulher fiel a Deus concebessem “aquele que pisaria a cabeça da serpente” (Gn.3.15). Portanto, o romance tinha um lugar especial dentro da história da redenção, pois esperava-se que o Filho prometido fosse fruto do amor conjugal. Na verdade, Israel não sabia ainda que a “virgem daria à luz” (Is.7.14), mas tinha a certeza que a mulher bem-aventurada que desse à luz o Salvador do mundo, estaria muito bem acompanhada por um homem temente a Deus que a amaria e cuidaria dela.

Tudo estava indo muito bem, mas, por alguma razão, Boaz não tomou nenhuma iniciativa para resgatar Rute. Desde o início, Boaz estava consciente de seu grau de parentesco com Malom, falecido esposo de Rute. Portanto, Boaz sabia que era o resgatador de Rute (Rt.3.12). Talvez a timidez daquele homem fê-lo admirar de longe a bela e virtuosa Rute, sem ter a coragem de tomar qualquer iniciativa, além das cortesias diárias com as quais cativava o coração da jovem; ou, talvez, ele tenha preferido deixar que Noemi e Rute ficassem à vontade para decidir se de fato desejariam ser resgatadas. É provável que ambas as razões tivessem colaborado com a inércia de Boaz, mas sua ciência de que havia outro resgatador mais chegado do que ele e sua idade avançada em relação à juventude de Rute devem ter sido determinantes em sua decisão de não tomar qualquer iniciativa (Rt.3.10,12). Ele não poderia fazer nada caso o outro resgatador tivesse o interesse de resgatar Rute. Por isso, mesmo disposto a resgatá-la, Boaz prefere recuar perante os obstáculos que via a sua frente, mantendo seu estado contemplativo, apenas.

Noemi acompanhou a alegria de Rute, estampada em seu rosto, durante os dias da sega. Por isso, incomodada com a falta de iniciativa de Boaz que até o momento não fizera nada, Noemi arquiteta um plano para unir os dois, definitivamente. O resgate de Rute representaria sustento para Noemi, também, pois ambas seriam cuidadas por Boaz. Porém, foi o desejo por ver a felicidade de sua virtuosa nora (o estabelecimento de sua vida), que Noemi decidiu tomar alguma atitude em favor dela. A inercia de Boaz não foi um obstáculo para Deus realizar sua graciosa vontade na vida de Rute, conforme seu maravilhoso projeto redentor. Portanto, Deus incomoda Noemi, a fim de usa-la para a concretização de sua “boa, agradável e perfeita vontade”.

Neste ponto, a história de Rute assemelha-se, novamente, à história de Jacó. Para que Jacó recebesse a bênção da primogenitura, conforme profecia dada a Rebeca (Gn.25.23), alguns eventos foram importantes. Dentre esses, a mediação de Rebeca fora fundamental para que Jacó alcançasse a bênção de seu pai, Isaque. Rebeca decidiu tomar iniciativa, arquitetando um mirabolante plano para que Jacó fosse abençoado sem que Isaque percebesse (Gn.27.6-23). Semelhantemente, sucessivos eventos, bons e ruins, na vida de Rute, contribuíram para a realização da vontade de Deus. Um deles foi à decisão de Noemi em unir Boaz e Rute, tornando-se uma mediadora dessa união. Em ambas as histórias o Senhor transforma catástrofes em bênçãos e faz uso de mediadores para abençoar aqueles a quem o Senhor havia escolhido para fazer parte da história da redenção (cf., também, a história de José). Desta forma, a Escritura revela-nos que nada pode impedir a concretização da vontade de Deus que tudo faz como lhe agrada. Além disso, os textos revelam que história redentora não é formada por um único momento, mas por um conjunto de eventos sucessivos que compõe seu grande enredo que culmina com o nascimento, vida, morte, ressurreição, ascensão e volta de Jesus.

Decidida a ajudar Rute, Noemi a conduz para um importante encontro, onde Rute apresentaria seu interesse em casar-se com Boaz, seu resgatador. Por alguma razão, Noemi conhecia alguns hábitos de Boaz, e, portanto, sabia que, naquele dia, ele estaria no campo realizando o trabalho de limpar a cevada na eira. Ao fim do trabalho, Boaz descansaria no campo (Rt.3.2), sendo o momento apropriado para Rute agir. Boaz não era o primeiro dos resgatadores em proximidade de parentesco. Por essa razão, talvez, Noemi não quisesse expor o amor de Rute por Boaz, e, por isso, planejou um encontro noturno para os dois, a fim de que ninguém o soubesse. Caso Boaz não a quisesse resgatar, a tristeza de Rute estaria guardada em família. Mas, se Boaz estivesse disposto a resgatá-la, ele se esforçaria por ela, tomando todas as providências cabíveis necessárias. O cuidado de Noemi demonstra que Rute era-lhe como uma filha amada.

O planejado encontro seria decisivo para Rute. Será que Boaz a amava tanto quanto ela o amava? Será que ele estava disposto a lutar por ela? Rute está disposta a fazer sua parte. Então, Noemi a orienta a se arrumar da melhor forma possível para mostrar o quanto estava interessada em Boaz. O valor de Rute já era conhecido do homem, pois ele a acompanhou durante os meses da sega. As virtudes dela já o haviam cativado, mas Rute mostraria seu propósito de entregar a vida inteira aos cuidados dele, e queria dar-lhe o melhor de seu coração e corpo. Noemi instrui Rute a tomar um bom banho, usar perfume e vestir-se de tal forma que não fosse facilmente reconhecida. Com toda essa produção, Rute não deixaria dúvidas de seu interesse no casamento com Boaz. Além disso, Rute deveria ir ao campo sem ser notada, observando ao longe o lugar onde Boaz se deitaria, a fim de proceder com discrição. Todo o processo demoraria um pouco e seria trabalhoso, mas em atitude submissa e disposta, Rute aceita o plano de sua sogra, a fim de pô-lo em prática.

Além de trabalhoso, o plano de Noemi poderia ser perigoso, pois estaria expondo Rute perante Boaz. Os dois estariam sozinhos no campo, durante horas da noite, numa completa escuridão. O que aconteceria quando Rute estivesse exposta para Boaz? Contudo, elas não parecem estar preocupadas com isso. Noemi e Rute já conheciam Boaz o suficiente e estavam seguras quanto a seu caráter. Baoz era um homem temente a Deus, portanto não faria nada que pudesse denegrir a imagem de Rute ou fazê-la sofrer. Elas sabiam que ele a trataria com respeito e amor.

Rute procede conforme tudo o que Noemi disse, e, então, deita-se aos pés de Boaz, aguardando o momento em que ele acordaria com os pés gélidos, pois ela havia descoberto seus pés, a mando de Noemi (Rt.3.4,7). Boaz acorda e toma um susto com a presença de alguém a seus pés. Então, Rute se revela para Boaz, fazendo alusão à razão de estar ali: Ela queria que Boaz a resgatasse, ou seja, que ele casasse com ela (Rt.3.9). O susto que Boaz teve ao ver que alguém estava a seus pés, em meio à noite, não foi tão grande quanto sua felicidade ao ouvir as palavras de Rute (Rt.3.10).

Boaz bendiz Rute com alegria. A atitude de Rute confirmou seu imenso valor, pois ela preferira se guardar para o legítimo resgatador a correr após outros jovens de sua idade (Rt.3.10). Considerando o que Boaz diz para Rute, ele não era jovem como ela. Não é possível saber a idade de ambos, mas a diferença etária entre eles deveria ser significativa. Essa, talvez, tenha sido uma das principais razões pelas quais Boaz preferiu não tomar providências para resgatar Rute. Mas, agora que tinha a certeza de que Rute queria casar-se com ele, o ânimo de Boaz mudou. Ele estava diante de uma joia rara, pois em todo tempo Rute demonstrou ter grande valor (Rt.3.11). E apesar de banhada, cheirosa e entregue nas mãos de Boaz, a virtude de Rute, uma mulher temente a Deus, era a razão pela qual Boaz queria casar-se com ela.

Mesmo desejoso de tê-la em seus braços, Boaz não esconde os obstáculos: havia outro resgatador mais chegado do que ele (Rt.3.12). O alegre momento entre os dois é quebrado pela apreensão da dúvida: será que o outro resgatador teria interesse em resgatar Rute? Caso isso acontecesse, ninguém poderia evitar que Rute se casasse por obrigação. Nesse momento, Rute deve ter entendido a inércia de Boaz. Mas, desta vez ele estava disposto a fazer o que fosse necessário para resolver o problema. Pela manhã, sem perder tempo, Boaz iria atrás do outro resgatador, a fim de tornar clara sua intensão de resgatar Rute. Boaz não esperaria mais, pois estava de todo decidido a receber Rute por esposa. Ambos estavam dispostos a fazer o que lhes cabia para confirmar o casamento, mas somente Deus poderia dar a resposta final para a vida deles. Caso tudo o que estava acontecendo procedesse do Senhor, então Deus confirmaria sua vontade retirando todos os obstáculos, a fim de que Boaz e Rute pudessem casar.

Eles passaram a noite no campo, ou conversando ou dormindo, cada qual em seu lugar, mas não tiveram qualquer contato físico. Boaz preservou a integridade de Rute o tempo todo, pois aguardava a confirmação do Senhor se de fato Rute seria sua esposa. Sua preocupação com a imagem de Rute revela seu temor a Deus e amor pela jovem. Por isso, ele a orienta a acordar bem cedo, a fim de sair sem ser notada. Para evitar as bocas maledicentes, Boaz entrega para Rute algumas medidas de cevada, a fim de que, ao entrar na cidade, as pessoas não levantassem dúvidas quanto à razão pela qual Rute havia ido ao campo de Boaz. Desta forma, ele ajudou Rute a guardar sua imagem perante a sociedade.

Noemi estava à espera de Rute. Ao chegar, Rute conta-lhe tudo o que aconteceu. A reação de Boaz deixa evidente para Noemi que ele estava bastante interessado em Rute. Portanto, não havia mais nada a ser feito por elas. Agora, Noemi e Rute deveriam esperar pela providência do Senhor que, sem que elas soubessem, já estava agindo na vida delas há muito tempo. Apesar do obstáculo à frente, Rute podia se alegrar, pois estava certa de que Boaz estava totalmente decidido a cuidar dela por toda a vida, e, enquanto não resolvesse o assunto, não descansaria (Rt.3.18).

Você já refletiu sobre a bênção do amor? Deus nos fez capazes de amar, capazes de cuidar uns dos outros, capazes de sentir a imensa alegria de ter alguém para partilhar a vida. Isso só é possível porque Deus nos fez a sua imagem e semelhança. Portanto, o casamento é uma bênção de Deus para o homem (Gn.2.18-25), a fim de que possa desfrutar das delícias do amor na presença do Senhor, glorificando e agradecendo a Deus, todos os dias, por sua muita bondade em dar-nos a felicidade do casamento (Sl.127; Sl.128; Ct.8.7).

Para desfrutar o melhor do casamento, os jovens devem preocupar-se em viver uma vida para a glória de Deus, cuidando do próprio caráter, a fim de serem bênçãos, uns para os outros. Homens amorosos, cuidadosos, piedosos, responsáveis e fiéis serão bênçãos para a futura esposa. Da mesma forma, mulheres submissas, amáveis, cuidadosas, trabalhadoras e fiéis serão bênçãos para o futuro marido. Somente assim, ambos encontrarão, um no outro, a bênção necessária para que o lar tenha amor, harmonia e caminhe na presença do Senhor. Portanto, as advertências e as proibições divinas com respeito ao casamento misto, crente com não-crente, são importantes ensinos que visam livrar os jovens da infelicidade de um casamento dividido pelo jugo desigual (2Co.6.14-18). Sendo assim, não se deixe enganar pelas aparências nem deixe que o coração o traia. Ouça a voz do Senhor guardando você dos males deste mundo.


Esperar em Deus é sempre a melhor opção, pois a vontade do Senhor é “boa, perfeita e agradável” (Rm.12.2). Rute poderia ter ido atrás de jovens de seus dias, pois não lhe faltaria oportunidades. Mas, ela preferiu esperar em Deus, aguardando seu resgatador. Seu papel, enquanto espera no Senhor, é cuidar de seu próprio coração, orando em todo tempo, a fim de estar pronto(a) para o dia em que Deus lhe mostrará a pessoa certa para o casamento. Ser bênção para o outro cumpre um importante papel dentro do projeto redentor, pois faz de você um instrumento para conduzir o cônjuge a Cristo. Lembre-se que nada é impossível para Deus. Ele pode usar pessoas e circunstâncias, a fim de que a boa vontade dele seja concretizada em sua vida. Portanto, espera pelo Senhor!

(continua...)

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