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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Romance e redenção em Rute (2/4)

O SENHOR retribua o teu feito, e seja cumprida a tua recompensa do SENHOR, Deus de Israel, sob cujas asas vieste buscar refúgio.” (Rt.2.12)

Deus opera maravilhas por meio daqueles que confiam nEle. Nem sempre as maravilhas do Senhor são agradáveis à primeira vista, mas tribulações também podem ser instrumentos para a concretização da vontade de Deus (Gn.45.5,8). Nas adversidades da vida, Deus prova nosso coração, fazendo-nos conhecer as fraquezas da carne enquanto somos desafiados a confiar no auxílio do Senhor (Dt.8.2-4). Nem sempre encontramos explicações para as tribulações da vida, mas Deus quer que confiemos nEle mesmo assim. Contudo, nossa fé não é um salto no escuro, pois a confiança dos que esperam em Deus deve estar fundamentada nas promessas do Senhor, feitas em Cristo Jesus, sabendo que “Deus trabalha para aquele que nEle espera” (Is.64.4).

Noemi voltou pobre e desamparada para Belém, com sua nora Rute. Todavia, a história de Noemi não acaba assim. A tragédia ocorrida no primeiro capítulo é sobreposta pela graça superabundante de Deus que não desampara seu povo. Semelhante à história de José (Gn.37-50), o mal que sobreveio à família foi um meio para o alcance de um propósito maior: a preservação do projeto redentor. Sem que elas soubessem, Deus estava conduzindo seus passos, a fim de prover graciosa e poderosa salvação para aquele lar, por meio do qual o Senhor preservaria a linhagem de seu Filho, o Messias prometido, aquele que pisaria a cabeça da serpente (Gn.3.15). A história de Noemi e Rute cumpria um importante papel na história redentora, e o sofrimento delas não poderia ser comparado com a glória da salvação que o Senhor suscitaria a partir da genealogia daquelas mulheres (Mt.1.5; Rm.8.18).

Enquanto Elimeleque sai de Belém com receio de ser apanhado pela fome que alcançou a terra de Judá (Rt.1.1), Deus guardou um homem temente para ser o resgatador dele (Rt.2.1). Boaz manteve-se em Belém durante todo o período da fome, demonstrando que sua confiança estava em Deus, e o Senhor o guardou dando-lhe não somente a provisão diária, mas ainda o fazendo próspero (Rt.2.1). É possível imaginarmos as muitas orações daquele homem de Deus que durante a intempérie que sobreveio a Israel, fez do Senhor seu auxílio. Elimeleque morreu, levando sua esposa e nora à miséria, contudo Boaz enriqueceu e cresceu na presença do Senhor. Elimeleque confiou em sua esperteza para fugir do castigo de Deus, que sobreveio a Israel, indo para uma terra pagã, mas Boaz confiou no Senhor, aguardando em Deus a provisão, pois sabia que o Senhor, Deus de Israel, era refúgio certo nas horas de tribulação (Rt.2.12).

Estando em Belém, já acomodadas à antiga casa de Noemi, surge a necessidade natural de encontrarem provisão. Sem homens para sustenta-las, Rute sugere, para Noemi, sua ida aos campos, a fim de apanhar espigas caídas, conforme o direito concedido por Deus aos pobres de seu povo (Lv.19.10). Rute não se mostra arrependida de ter trocado o conforto da casa de seus pais pela dureza de uma vida pobre ao lado de sua sogra, no seio de Israel, o povo de Deus. Rute era uma mulher trabalhadora e esperava que Deus fosse gracioso com ela em sua empreitada para conseguir o sustento diário. Pronta para enfrentar a luta diária, Rute saiu em busca de algum campo.

Sem saber aonde colher, Rute vai para um campo qualquer que “por casualidade” (Rt.2.3) era o campo de Boaz, um de seus resgatadores. Em silêncio, Deus estava operando sua vontade, guiando Rute para o caminho por onde deveria andar. De tantos campos possíveis para colher (Rt.2.8), onde Rute poderia ter sido molestada (Rt.2.22), aquela recém convertida serva do Senhor foi guiada pela graça divina para o campo certo. A história redentora estava em andamento, e Deus estava garantindo seu cumprimento em cada etapa dela. Mesmo que Israel tivesse se colocado longe de seu Deus, virando-lhe as costas durante todo o livro de Juízes (Jz.2.11-23), o Senhor não se apartou de seu povo, a fim de manter firme sua promessa redentora.

Nos livros de Rute e Ester, Deus é o Senhor presente na história agindo silenciosamente na vida de seu povo, a fim de garantir o cumprimento de sua vontade (Et.4.14). Nem sempre Deus opera de formas extraordinárias, manifestando seu poder por modo visível na vida de seu povo. Boa parte do tempo, o Senhor age sem ser percebido, exigindo daqueles que se aproximam dele que confiem em seu poder, fidelidade e perfeita vontade. Esse fenômeno deve acalmar o coração do cristão, a fim de esperar confiantemente em sua graciosa salvação. Jeremias viu a ruina de seu povo e chorou a destruição de Jerusalém, mas não desistiu de esperar pela salvação de Deus. E mesmo que Jeremias não entendesse o desenrolar do projeto divino para purificação da nação, preparando-a para o advento de Cristo, Jeremias descansou o coração em Deus, proclamando que “bom é o SENHOR para os que esperam por Ele, para a alma que o busca. Bom é aguardar a salvação do SENHOR, e isso, em silêncio” (Lm.3.25-26).

Boaz, o resgatador, aparece na história. Ele é um homem piedoso e temente a Deus, abençoador de seus servos (Rt.2.4). Boaz era um homem cuidadoso e logo percebeu que havia alguém diferente em seu campo. É provável que a beleza de Rute tenha chamado sua atenção, fazendo-o se interessar por saber quem era ela. O servo de Boaz informa-lhe tudo quanto sabia sobre Rute. A informação completa deve ser coletada a partir de dois blocos de textos: Rute 2.6-7 e 11-12. Conforme esses dois textos, Rute era uma mulher moabita que decidiu voltar com sua sogra Noemi da terra de Moabe, rejeitando retornar para a casa de seus pais, para ir a uma terra que “dantes não conhecia”, a fim de buscar refúgio no Deus de Israel, e desde a manhã estava trabalhando arduamente para obter suprimento para si e para sua sogra.

As notícias sobre Rute agradaram bastante Boaz. Ele deveria trata-la com amor, pois assim Deus ordenara que seu povo fizesse aos estrangeiros que habitassem no meio de Israel (Lv.19.34). Mas, era o fato de Rute ter-se convertido ao Deus de Israel que a tornava igual aos demais israelitas (Ex.12.48; Nm.9.14). Portanto, Rute não era uma pagã no meio do povo de Deus, mas uma crente fiel adotada pelo Senhor para fazer parte da família de Deus (Ef.2.19). Provavelmente, poucas mulheres em Israel, nos dias de Juízes, possuíam a fé e o caráter de Rute. Então, ciente de que ele era um dos resgatadores de Rute, Boaz deve ter-se interessado pela bela e virtuosa jovem Rute.

Boaz encontra-se com Rute, surgindo um diálogo entre eles (Rt.2.8-13). Ele a trata com cortesia e carinho, preservando a honra de Rute. Seu interesse pela jovem, o motiva a ter um especial cuidado com ela, e Boaz pede-lhe que permaneça colhendo em seu campo (Rt.2.8). Desta forma, Boaz teria a certeza de que ninguém molestaria Rute e ainda poderia observá-la durante o tempo da cega, a fim de conhecê-la melhor. Para que Rute ficasse bem à vontade, Boaz adverte a todos que não mexam com ela. Seu coração parece estar realmente apaixonado, e protege-la era a melhor forma de guarda-la para um possível casamento futuro. Todo conforto necessário é providenciado, e Rute recebe o acesso ao ambiente doméstico onde Boaz e seus servos comiam e bebiam (Rt.2.9). Ele demonstra para Rute que ela não estaria mais sozinha, pois encontrou nele amparo e segurança, ambos providenciados por Deus, como bênção graciosa do Senhor para aquela que confiou sua vida às mãos do Senhor.

Rute ficou perplexa com o tratamento de Boaz, e, humildemente, prostrou-se perante ele. Parece que Rute nunca vira tamanho cuidado e ternura para com uma estrangeira (Rt.2.10). Nem todos os israelitas obedeciam à Lei, tratando com amor e justiça aos órfãos, viúvas e estrangeiros que buscavam em Deus seu refúgio. Mas, Boaz estava tratando Rute como sua parenta, afinal ela havia feito muito bem para seus familiares. Provavelmente, Rute não sabia que sua fé no Deus de Israel a tornava igual aos demais israelitas, herdeira das mesmas promessas feitas a Abraão. Então, Boaz explica-lhe a razão de estar tratando-a com dignidade e especial amor, despertado pelo conhecimento da fé e caráter dela. Para Boaz, Rute era melhor que muitas outras mulheres israelitas, pois seu valor excedia ao de finas joias (Rt.2.11; Pv.31.10). Portanto, Rute não era apenas uma estrangeira, mas uma mulher de Deus, e o Senhor a abençoaria muito por sua fé.

As palavras de Boaz iam além do cuidado de um homem de Deus pelo povo do Senhor. Boaz, falou ao coração de Rute, ou seja, mostrou seu interesse por Rute assim como Siquém mostrara seu interessem em casar com Diná (Gn.34.3: "falou ao coração"). Rute sentiu-se cativada por Boaz, mas não sabia que ele poderia ser seu futuro marido (Rt.2.13). Com as palavras de Boaz, Rute sentiu-se cuidada e amparada. Ela já não se sentia mais como estrangeira numa terra estranha, pois o cuidado de Boaz fez com que ela se sentisse amada. Pelo cuidado de Boaz, Rute sabia que não estaria sozinha na hora da necessidade, pois ele estaria ao seu lado para sustenta-la (Rt.2.14), provendo-lhe tudo o que era necessário. E assim, Boaz agiu para com Rute durante toda a sega da cevada e do trigo (Rt.2.23). Rute estava experimentando a recompensa graciosa do Senhor por ter buscado em Deus refúgio no dia da tribulação (Rt.2.12).

Até o momento, Rute não sabia os detalhes da grandiosa obra que Deus estava realizando em sua vida, pois não sabia que Boaz era seu resgatador. Ao retornar para casa, Noemi viu a farta colheita de Rute e, ainda, a muita comida que trouxera de sua refeição (Rt.2.18). Admirada com aquele feito, Noemi quis descobrir quem era o benfeitor que a deixou colher tanto em seu campo e, ainda, deu-lhe comida em grande quantidade. Ao dizer seu nome, Boaz, Noemi glorificou a Deus, abençoando Boaz por sua bondade para com Rute (Rt.2.20). Então, finalmente, Rute descobriu que ele poderia ser o resgatador da família, trazendo esperança de novos dias para as duas mulheres que aparentemente estavam desamparadas, sem perceberem que Deus estava em todo tempo cuidando delas.

Naquele momento, Noemi reconheceu que havia esperança para elas. O que ela não sabia é que a providência do Senhor não alcançaria apenas as necessidades imediatas de Noemi e Rute, mas todo o povo de Deus, preservando a linhagem messiânica prometida por Deus para salvação do homem. Portanto, mesmo que as tribulações advindas sobre Noemi e Rute tenham causado-lhes tristeza ao coração, todas as coisas estavam colaborando “para o bem dos que amam a Deus” (Rm.8.28), pois nada era tão importante quanto a redenção do povo de Deus. Elas só precisavam confiar no Senhor e ter paciência, procedendo com fidelidade a Deus em todo tempo, pois o Senhor estaria realizando sua obra com poder e graça. Rute passou alguns meses conhecendo melhor Boaz enquanto colhia em seu campo. Ela precisou ter paciência até chegada da hora em que o Senhor a abençoaria com um novo lar.

Às vezes fortes tribulações nos alcançam, exigindo que tomemos alguma decisão: seguir em frente olhando para o Senhor ou desistir olhando para traz. Aqueles que optam por olhar para Cristo e seguir em frente são conduzidos pelo novo e vivo Caminho, guardados e amparados pelo Senhor. Nem sempre seremos capazes de entender o agir de Deus em nossa vida, mas é certo que o único Caminho pelo qual o Senhor nos conduzirá é Cristo Jesus. E mesmo que demore, sempre valerá a pena esperar no Senhor, pois a vontade de Deus é “boa, perfeita e agradável” (Rm.12.2). Boaz e Rute esperavam pela boa vontade de Deus, guardando-se para o dia em que Deus lhes constituiria uma família. E por esperarem em Deus, o Senhor os abençoou com um lar, uma linda família para a glória do Senhor.

Enquanto esperamos em Deus, devemos "arregaçar as mangas" e trabalhar para a glória do Senhor. Desistir entregando-se ao desânimo não resolverá os problemas da vida. É necessário olhar para Jesus e seguir em frente lutando, pois o projeto redentor do Senhor é muito maior que nossa pequena vida aqui. Deus tem algo extraordinário para seus filhos, nunca visto pelo homem, mas é preciso perseverar até o fim, para herdar a concretização de todas as promessas de Deus. Satanás tentou Jesus oferecendo-lhe o mundo e suas riquezas, mas Cristo recusou tudo, olhando para os céus, para a glória de Deus (Mt.4.8-11). Portanto, é preciso buscar “as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus” (Cl.3.1), a fim de estar pronto para os dias maus.


Além disso, o capítulo dois de Rute fornece um modelo de relacionamento entre um homem e uma mulher. Boaz e Rute amavam e temiam a Deus, e possuíam um caráter íntegro. Boaz tratava Rute com cortesia, como parte mais frágil, protegendo-a e sustentando-a com amor e carinho, fazendo com que ela encontrasse nele amparo e força em meio às dificuldades da vida. Enquanto isso, Rute era trabalhadora, dedicada, humilde e submissa, disposta a obedecê-lo em tudo, respeitando-o em todo tempo, sendo-lhe fiel companheira em diálogos. Desta forma, Boaz foi benção para Rute e encontrou em Rute uma auxiliadora que o abençoava, também. No comportamento cheio de temor de ambos, encontraram um no outro a perfeita companhia para dividir a vida em suas alegrias e tristezas, servindo de instrumento para a glória de Deus.

(continua...)

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