“Disse, porém, Rute: Não me instes para que
te deixe e me obrigue a não seguir-te; porque, aonde quer que fores, irei eu e,
onde quer que pousares, ali pousarei eu; o teu povo é o meu povo, o teu Deus é
o meu Deus” (Rt.1.16).
Em Cristo, há esperança mesmo que estejamos no “vale da
sombra da morte” (Sl.23.4), pois a esperança do homem não se encontra em sua
capacidade para resolver os problemas ao seu redor, mas na poderosa graça
divina que “trabalha para aquele que nEle
espera” (Is.64.4). O livro de Rute, um pequeno e lindo romance do Antigo
Testamento, mostra-nos a superabundante graça de Deus agindo em meio ao caos de
um povo submerso no pecado, a fim de preservar seu projeto redentor,
revelando-nos que nada pode impedir o cumprimento das promessas de Deus.
O livro começa situando o leitor com respeito ao caótico
contexto histórico em que a trama se desenrola. O leito é conduzido à leitura
do livro de Juízes, a fim de compreender a realidade daqueles dias (Rt.1.1). Ao
ler o livro de Juízes, antes de prosseguir com a leitura de Rute, temos a
impressão que a história de Israel está fadada à extinção, pois o povo quebrou
a aliança do Sinai em todas as gerações em que julgavam os juízes (Jz.2.11-23),
durante quatrocentos e cinquenta anos (At.13.20), suscitando constantemente a
ira de Deus.
Por causa dos pecados do povo, Deus suscitava castigos, a
fim de corrigi-lo e atrai-lo para a prática da Escritura Sagrada. Em um desses
momentos de disciplina divina, Deus trouxe fome sobre a terra (Rt.1.1),
conforme profecia proferida por Moisés em seu canto final registrado no livro
de Deuteronômio (Dt.32.24). A fome na terra não era uma expressão do juízo
divino, mas uma demonstração de sua graça corretiva, a fim de atrair o povo
rebelde de volta para o bom Caminho do Senhor.
Contudo, em vez de Elimeleque, esposo de Noemi, voltar seus
olhos para Deus, a fim de clamar por graça e misericórdia, sabendo que o Senhor
é “Deus compassivo, clemente e longânimo
e grande em misericórdia e fidelidade” (Ex.34.6), ele procura abrigo numa
terra inimiga do povo de Deus, a terra de Moabe (Rt.1.1). Desta forma,
Elimeleque trocou o auxílio do Senhor Todo-Poderoso, o Deus de Israel, pelos
fracos braços de um povo que diversas vezes se voltou contra o povo de Deus.
Elimeleque trocou o verdadeiro é único Deus por um ídolo, buscando neste ídolo
a salvação para sua vida e família. Assim, Elimeleque pecou contra o Senhor.
Moabe não era apenas um povo diferente de Israel. O Senhor
havia proibido Israel de conquistar a terra de Moabe, povo descendente de Ló,
sobrinho de Abraão (Dt.2.8-9). Portanto, os israelitas não deveriam fazer da
terra de Moabe sua herança. Quando Israel estava caminhando rumo a Canaã,
proibido de tomar a terra de Moabe, passou ao lado. Todavia, Balaque, o rei dos
moabitas, contratou Balaão, um homem capaz de amaldiçoar e abençoar (Nm.22)
para amaldiçoar o povo de Deus. Desta forma, Moabe agiu traiçoeiramente contra
Israel, sem qualquer razão para se voltar contra o povo de Deus. Não
conseguindo amaldiçoar o povo de Israel, os moabitas convenceram Balaão para
fazer o povo pecar contra o Senhor (Nm.25.1-3), usando a Palavra de Deus contra
Israel, a fim de que o próprio Deus trouxesse juízo sobre a nação, pois em
pecar contra Deus, Israel traria condenação sobre si mesmo (Ex.20.1-6). Além de
todos os pecados de Moabe contra Israel, os moabitas travaram guerras contra os
israelitas e, vencendo, dominaram sobre o povo de Deus por dezoito anos,
fazendo-os servi-los (Jz.3.12-31). E ao levar a família para longe do ambiente
da graça, Elimeleque acrescentou aos seus pecados mais um: deixou seus filhos
se casarem com mulheres pagãs da terra de Moabe (Rt.1.4).
Ao buscar auxílio em Moabe nos dias em que Deus trouxe
castigo sobre seu povo por causa de seus muitos pecados, Elimeleque traiu seu
povo e desprezou seu Deus. O Senhor os havia livrado de circunstâncias muito
piores quando Israel fora escravo na terra do Egito (Ex.3-14). Deus não seria
capaz de livrar seu povo da fome? Elimeleque saiu do seio do povo do Senhor
para buscar abrigo numa terra estranha; ele deixou o ambiente da manifestação
da graça de Deus para buscar socorro num povo pagão idólatra. Elimeleque deixou
que as circunstâncias difíceis da vida o guiassem para longe de Deus, fazendo o
caminho inverso ao que Rute, uma moabita, fará no desenrolar do enredo do
livro.
Porém, Elimeleque não conseguiu fugir do castigo que Deus
trouxera sobre o povo de Israel. Estando em Moabe, Elimeleque morre, deixando
sua esposa e filhos. Ninguém pode se esconder dos olhos do Senhor nem fugir de
sua presença. O pior, temido pela família, sobreveio sobre aquele lar
incrédulo. Além da morte de Elimeleque, por razão desconhecida, morrem também
seus dois filhos: Malom e Quiliom (Rt.1.5). Desta forma, Noemi e suas noras Rute
e Orfa ficaram desamparadas, sem aqueles que eram provedores do sustento da
família. Elimeleque saíra da terra de Israel com medo de faltar provisão para
seu lar, e Noemi tem que voltar para Israel porque aqueles em quem depositara a confiança da provisão haviam morrido em terra estranha. Desta forma, durante
o livro, Deus revela que a única fonte de todo bem é o Senhor e que devemos
confiar a vida somente em sua graciosa e poderosa mão.
A família não confiou na fidelidade e poder de Deus para o cumprimento
da história redentora, por isso trocou sua participação no ambiente da graça,
onde a história redentora se desenrolava, por “um prato de comida” (Rt.1.1).
Deus havia escolhido Israel, descendente de Abraão, para que dele viesse a
salvação (Gn.12.1-3) do povo de Deus, e mesmo que todos os adversário tentassem
impedir o cumprimento da promessa divina não conseguiriam anular a promessa do
Senhor nem obstruir seu perfeito cumprimento. Semelhante a Esaú que vendeu seu
direito de primogenitura por um prato de comida (Gn.25.29-34), Elimeleque trocou
sua participação na história redentora pela autoconfiança em prover o sustento
de sua família, saindo do meio do povo de Deus.
Elimeleque havia ido para Moabe em condições boas, fugindo
da possibilidade de empobrecer em Israel (Rt.1.21). Contudo, Noemi volta para
sua terra natal pobre, sem marido, sem filhos e sem esperança no coração. Noemi
provou o amargo gosto de confiar na inteligência e força do homem. Ela é
obrigada a voltar para a terra que traiu; obrigada a voltar para os braços
daquele contra quem ela havia virado as costas: O Deus de Israel. Porém, é
nesse contexto triste e desesperador que o Senhor revela sua graça
superabundante e sua fidelidade à promessa redentora. Deus recebe de braços
abertos aquela que havia desprezado sua graça corretiva e enche de alegres
cantos de salvação o coração de uma pobre viúva estrangeira que resolveu buscar
socorro no Deus de Israel, abandonando seu povo para viver no seio do povo de
Deus: Rute (Rt.1.16-17).
Noemi estava arrasada com a perda de seu marido e filhos, em
tão pouco tempo (Rt.1.3-5). Sem poder sustentar-se na terra de Moabe, Noemi
decide voltar para sua terra natal, e, então, chama suas noras, a fim de despedir-se delas (Rt.1.6-9). Noemi não tem a fé de Abraão que deixou sua terra
e parentela para ir para um lugar apontado por Deus (Gn.12.1). Abraão trocou o
conforto de sua terra pela peregrinação em terra estranha, pois confiou na
promessa divina, “porque aguardava a
cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador” (Hb.11.10).
Porém, Noemi tinha seu coração nesse mundo e nas coisas que ele pode oferecer.
Sua falta de fé fez com que preferisse a volta de suas noras para o paganismo
idólatra do povo moabita (Rt.1.15) a mantê-las a seu lado na esperança de
que Deus suscitasse graciosa e poderosa salvação para elas. Noemi teve a
oportunidade de resgatar duas mulheres do império das trevas, a fim de que
caminhassem no meio do povo de Deus, mas a dureza de seu coração não lhe permitiu
isso.
À primeira mão, ambas as noras de Noemi preferiram seguir
junto à sogra. Estavam dispostas a sofrer as consequências de optar pelo
abandono da velha vida em Moabe rumo a uma nova vida em Israel e servir a um
único Senhor, o Deus de Israel (Rt.1.10). Porém, com a insistência de Noemi,
Orfa demonstra que seu coração era semelhante ao solo rochoso que não tendo
profundidade não permite que a boa semente cresça (Mt.13.1-23). Orfa, então,
volta para a casa de seus pais, e para seus deuses, na esperança de casar
novamente e seguir uma vida tranquila. Porém, Rute se mantém imóvel ao lado de
Noemi. Por isso, sua sogra insiste mais uma vez, a fim de convencê-la a voltar
para a casa de seus pais, também (Rt.1.15). Contudo, Noemi recebe uma resposta
não esperada. Rute estava disposta a pagar o preço da nova vida, e, então,
profere uma das mais belas confissões de fé revelada nas Escrituras Sagradas: “Disse, porém, Rute: Não me instes para que
te deixe e me obrigue a não seguir-te; porque, aonde quer que fores, irei eu e,
onde quer que pousares, ali pousarei eu; o teu povo é o meu povo, o teu Deus é
o meu Deus” (Rt.1.16).
A semente havia encontrado uma boa terra e estava crescendo
firme em Rute. Ela estava disposta a trocar o aconchego da vida na casa de seus
pais pela pobreza ao lado da sogra, a fim de desfrutar da presença do Deus de
Israel (Rt.1.17). A ideia da morte no seio do povo de Deus lhe era mais
agradável do que a vida longe da graça do Senhor. O pouco que Rute ouvira sobre
o Deus de Israel fora suficiente para dar-lhe nova vida, e, agora, Rute era uma
crente no Senhor, disposta a pagar o preço de sua nova vida. Desta
forma, voltam ambas para a terra de Belém, terra natal de Noemi (Rt.1.19),
pobres e desamparadas, sem qualquer perspectiva para o presente e futuro, mas
com algo novo e grandioso em seu meio: a fé de Rute no Deus de Israel.
Noemi, como de costume, mantem seus olhos presos às
circunstâncias, murmurando dia e noite por causa da infelicidade que a alcançou
(Rt.1.20-21). A falta de confiança no Senhor impossibilitava-lhe ver quão
grandes coisas Deus poderia operar em sua vida. Ela pensava em seus dias de
fartura, pois “ditosa” havia chegado
a Moabe, mas agora voltava para Israel pobre (Rt.1.21). Mas, não via que
endurecida de coração saíra de Israel e agora, quebrantada, estava pronta para
ver as grandes coisas que o Senhor operaria em sua vida por meio de Rute, a
mais crente de todas as mulheres no meio do povo de Deus.
E você como tem olhado para as circunstâncias da vida? A
incredulidade e idolatria impedem que o homem veja a graça e poder de Deus para
a salvação. Nos momentos de luta, Deus convoca seu povo a confiar nEle, a fim
de não andarmos ansiosos com coisa alguma, pois nossas petições devem ser
colocadas diante de Deus “pela oração e
pela súplica, com ações de graças” (Fp.6.4). Deus é fiel a sua Palavra e
prometeu que “não há de rejeitar o seu
povo, nem desamparar a sua herança” (Sl.94.14), pois “perto está o SENHOR de todos os que o invocam, de todos os que o invocam
em verdade.” (Sl.145.18). Portanto, nos dias de aflição dobre seus joelhos
diante de Deus e deposite suas necessidades diante do Pai, pois “bem-aventurado aquele que tem o Deus de Jacó
por seu auxílio, cuja esperança está no SENHOR, seu Deus, que fez os céus e a
terra, o mar e tudo o que neles há e mantém para sempre a sua fidelidade.”
(Sl.147.5-6).
Todas as vezes que você deposita sua confiança em pessoas,
coisas ou instituições comete o pecado da idolatria, fazendo dessas coisas sua
salvação. Os problemas econômicos de nossos dias não serão resolvidos se você
passar num concurso público nem mesmo seriam resolvidos se você ganhasse uma
fortuna por acaso (Lc.12.16-21), pois outros problemas podem acometê-lo. Quando
você deposita sua confiança na suposta estabilidade do concurso público peca
contra Deus, troncando o poder provedor de Deus pela suposta estabilidade
estatal. Além disso, o cristão que confia no mundo para dele tirar sua
provisão, como se dele dependesse sua vida, está trocando a salvação do Deus
Criador e Redentor pelo socorro de um mundo que odeia o Senhor e seu povo,
agindo de forma semelhante Elimeleque.
Este princípio vale para todos os problemas da vida, e a
única forma de curar o homem deste mal é por meio da fé em Jesus Cristo. Somente por
meio da conversão o homem abandona seus ídolos (1Ts.1.9-10; Ex.20.1-6), a fim
de amar e servir ao único Deus (Dt.6.4-5; Sl.31.6). O povo de Deus deve estar
atento às possíveis manifestações da idolatria em seu meio. Todo amor demasiado
a algo ou alguém tende a substituir Deus como fonte de toda alegria e razão de
nosso viver. Esse fenômeno costuma está presente na relação entre pais e
filhos, namorados, marido e mulher, irmãos e amigos conduzindo o ser humano à
infelicidade e desespero, pois aqueles que são alvo do amor idólatra são
incapazes de preencher o vazio do coração humano e suprir todas as necessidades
da alma. Por causa desse amor idólatra, mães e pais entram em depressão com a
perda de um filho, maridos e esposas se desesperam com a perda do cônjuge etc.
Para que isso não ocorra, o ser humano precisa depositar
todo seu amor em Deus, o Criador e Senhor de nossa vida, pois Ele é o único que
permanece para sempre e jamais desampara seu povo. Aqueles que amam unicamente a
Deus “de todo o teu coração, de toda a
tua alma e de toda a tua força” (Dt.6.5) estão prontos para as intempéries
da vida, como os apóstolos que mesmo em face a morte não desanimaram nem
desistiram da caminhada cristã. Portanto, lance seu coração sobre Deus e
deposite nEle toda sua confiança, pois Ele é fiel e sempre está pronto para
ouvir nosso clamor, a fim de prover para seu povo graciosa e poderosa salvação.
(continua...)
(continua...)
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