“Mas o alimento sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal.” (Hb.5.14)
Tenho uma apreciação muito especial pela belíssima imagem de um sereno homem idoso de olhar terno e firme, voz mansa e convicta, palavras íntegras e sábias, ouvidos atenciosos que ponderam tudo e gestos objetivos, mas repletos de significado, capazes de conduzir até um exército inteiro com um simples olhar. Esse magnífico quadro é muito difícil de ser vislumbrado em nossos dias, pois a sociedade está cultivando algo muito diferente: a eternização da infância ou síndrome de Peter Pan.
Tornar-se adulto é algo, aparentemente, natural para todas as pessoas, afinal, a menos que ocorra um infortúnio que interrompa a vida, todos devem crescer e ter o corpo naturalmente desenvolvido, passando por cada estágio biológico: infância, puberdade, fase adulta e velhice. Mas, será que ser adulto é apenas uma questão de corpo? É possível alguém ter o corpo desenvolvido, mas não o seu coração? O que caracteriza, realmente, a fase adulta?
Ser adulto não é apenas uma questão biológica, pois a maturidade não cresce junto com a barda do homem ou com as curvas da mulher. Por isso, José, o penúltimo filho de Jacó, mostrou-se mais maduro que os demais irmãos e ainda mais sábio do que faraó e todos os conselheiro e magos do Egito, sendo ainda tão novo (Gn.37,41). Às vezes, pessoas idosas de nossos dias são as que mais dão trabalho nas famílias, nas igrejas, nas empresas etc., criando a fama de que pessoas idosas são cabeça dura, pois não sabem ouvir os outros nem reconhecer seus erros.
Mas, por que pessoas desenvolvem o corpo sem amadurecer o coração? Ou seja, por que encontramos pessoas com corpo de adulto e cabeça de criança? Isso acontece porque aprenderam durante a infância, a adolescência e a juventude que ser adulto é, meramente, conseguir muito dinheiro, ter casa e carro, poder ter relação sexual com alguém e ser livre para fazer o que quiser (inclusive comer doces à vontade).
Essa mentalidade é alimentada desde cedo pela sociedade pagã materialista, sendo forjada dentro de cada família que aderiu ao materialismo moderno. Podemos ver essa pseuda educação no simples fato de pais se preocuparem tanto em pagar as escolas mais caras para que seus filhos sejam preparados para entrar em boas universidades, a fim de se tornarem profissionais bem-sucedidos enquanto não dedicam o mínimo esforço nem mesmo para que os filhos saibam fritar um ovo. Ou seja, os pais ensinam, desde cedo, aos filhos, que a vida é medida pelo status social (quantidade de dinheiro e bens que se tem). O restante não é importante: ser um bom marido ou uma boa esposa, ser um bom pai ou uma boa mãe, ser um bom cidadão ou boa cidadã.
Por essa razão, há diversos adultos infantis que são empresários ricos ou políticos poderosos enquanto vivem como maus maridos ou más esposas, pais irresponsáveis e cidadãos egocêntricos. Em muitos casos, quase podemos ver, no comportamento desses adultos infantis, uma criança batendo o pé e fazendo cara feia por não ter suas vontades satisfeitas. Só que os adultos têm uma forma mais horrorosa de agir e costumam ir muito mais longe no mau comportamento quando não conseguem aquilo que querem. Por isso, profetizou o profeta Isaías:
“Os opressores do meu povo são crianças, e mulheres estão à testa do seu governo. Oh! Povo meu! Os que te guiam te enganam e destroem o caminho por onde deves seguir.” (Is.3.12)
Ao desvincular a maturidade das virtudes atribuindo-lhe um caráter meramente materialista, a sociedade tornou o ser humano em um animal qualquer. Animais também passam por etapas biológicas indo do estágio de bebê até a velhice do corpo. Todavia, animais não possuem virtudes, por isso permanecem agindo por instinto em todos os estágios de desenvolvimento de seu corpo, vivendo apenas pela luta por sobrevivência individual e coletiva, pois “os mais fortes sobrevivem”. Desse modo, o materialismo reduziu o homem a um animal, sem causa nem propósito além da sobrevivência.
Tornar-se adulto não é simples desenvolvimento biológico do corpo, não é apenas adquirir certa idade. Nem mesmo significa ter um diploma profissional, uma conta bancária gorda e, até, uma família (cônjuge e filhos). É preciso ser maduro, pois a principal característica da fase adulta é a maturidade. Mas, o que é ser maduro? A maturidade bíblica significa o desenvolvimento das virtudes divinas. Quanto mais madura for uma pessoa mais parecida com Deus ela será, ou, mais precisamente, mais semelhante a Cristo, o varão perfeito (Ef.4.13). Por isso, Paulo exorta as pessoas mais velhas a mostrarem a maturidade correspondente à fase adulta:
Quanto aos homens idosos, que sejam temperantes, respeitáveis, sensatos, sadios na fé, no amor e na constância. Quanto às mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias em seu proceder, não caluniadoras, não escravizadas a muito vinho; sejam mestras do bem, a fim de instruírem as jovens recém-casadas a amarem ao marido e a seus filhos, a serem sensatas, honestas, boas donas de casa, bondosas, sujeitas ao marido, para que a palavra de Deus não seja difamada” (Tt.2.2-5)
Quando uma criança briga por nada, se mostra egoísta com as outras crianças, não dá ouvidos aos ensinamentos de seus pais (e outros adultos), faz intriga entre outras crianças, quer ser melhor do que as demais, começa fofocas entre grupinhos ou coisas semelhantes, os adultos entendem que a precariedade do estado das virtudes nessas crianças é própria da fase infantil, pois as virtudes ainda não foram exercitadas, já que seu desenvolvimento deve alcançar a maturidade na fase adulta, após terem sido cultivadas dentro do ambiente familiar (1Tm.4.7; Hb.5.14; 12.11).
Na prática, podemos dizer que ser maduro é saber que a vida não é feita apenas de vontades, mas, sobretudo, de responsabilidades. É assumir os devidos papeis na família, na igreja e na sociedade, por ser a coisa certa a fazer, mesmo que nem sempre seja o mais vantajoso ou o mais prazeroso para a pessoa. É trabalhar quando gostaria de estar dormindo; é fazer o almoço da família quando gostaria de se entreter com o celular; é participar da vida da igreja quando gostaria de estar passeando pelo shopping. Ser maduro é saber esperar o tempo certo para tudo; é agir em acordo com a mais sublime virtude: o amor, mesmo quando o coração está marcado por rancor, frustração e raiva. Ser maduro é ter prazer em servir, não em ser servido; é ser sempre bom, não maligno; é perdoar, não se vingar; é ser humilde ainda que tenha inúmeras razões para ser orgulhoso, soberbo e arrogante. Isso é ser adulto!
Precisamos lutar contra a síndrome do Peter Pan, aquele menino que não queria crescer nunca. A eternização da infância serve apenas aos malignos propósitos dos dominadores deste mundo, pois viabiliza a manipulação da sociedade. Ao contrário, para Deus, quanto mais maduro for uma pessoa, mais parecida com Ele ela será, pois a maturidade é o desenvolvimento das virtudes divinas no ser humano.
Quando chega a maturidade, o bom conhecimento adquirido ao longo de anos através do aprendizado da Verdade ganha a forma de ações cotidianas que expressarão o fruto do Espírito: o amor, a bondade, a longanimidade, a honestidade, a imparcialidade, a mansidão entre outras virtudes (Gl.5.22-23). Homens e mulheres maduros constituem famílias sólidas; cristãos maduros formam igrejas saudáveis; cidadãos maduros formam civilizações fortes.
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