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segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Vida e obra de Paulo

O Senhor lhe disse: Vai, porque este é para mim um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de Israel; pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome.” (At.9.15-16)

Os evangelhos, principalmente o evangelho de Lucas, nos revelam uma porção da vida de Jesus, focando os três anos de seu ministério. Além dele, nenhum outro personagem do Novo Testamento recebe tamanho destaque nem nos são reveladas tantas informações sobre a vida, afinal seu ser e obra são o coração de toda a Escritura. Nos mesmos evangelhos, conhecemos um pouco da vida dos doze apóstolos que acompanharam Jesus durante seu ministério. Contudo, aprouve a Deus que outro personagem ganhasse certo destaque no novo Testamento. Ele não possuía nada de especial, e sua vida passada carregava a marca de ter perseguido a igreja de Jesus. Porém, nenhum outro dos apóstolos possui, espalhado pelas páginas do Novo Testamento, a quantidade de informações sobre a vida e ministério como Paulo. Tais informações, nos ajudam a reconstruir um pouco da vida do apóstolo “nascido fora do tempo” (1Co.15.8), que percorreu o mundo pregando o evangelho da graça de Deus que lhe fora revelado por Jesus, lançando o fundamento da igreja, Cristo, sobre o qual um grande número de igrejas foram erguidas e fortalecidas.
Paulo nasceu em Tarso, na Cilícia (At.21.39), mas desenvolveu seu intelecto e coração dentro da seita dos fariseus na qual se tornou notável (Gl.1.14). Apesar de Paulo ter nascido em cidade grega, Tarso, considerado cidadão romano por direito de nascimento (At.22.24-29), foi criado em Jerusalém e formado aos pés de Gamaliel, onde deve ter adquirido maior zelo por sua nação e religião. Paulo tinha orgulho de sua descendência judaica e desejava, profundamente, que seus compatriotas se convertessem ao evangelho do Senhor Jesus (Rm.9.3; 11.1). Ele foi educado em Jerusalém, recebendo os ensinamentos que o formariam em toda a cultura judaico-farisaica. Apesar de não ser possível saber ao certo com quantos anos Paulo se mudou de Tarso para Jerusalém, provavelmente, em seu discurso perante os judeus de Jerusalém (At.22.1-21), ele se refere a toda sua vida de aprendiz desde a mais tenra idade, já que o termo traduzido por criado, ou educado, (anatrefo), usado por Lucas em Atos 22.3, é o mesmo utilizado nos apócrifos e também no Novo Testamento para se referir à criação, ou educação, desde o berço (4 Macabeus 10.2; 11.15; Sabedoria 7.4; Atos 7.20,21). Em Lucas 4.16, alimentar, criar, crescer (trefo) é usado para se referir à infância de Jesus em Nazaré. Portanto, provavelmente, Paulo foi educado em Jerusalém desde sua tenra idade, recebendo a educação que o formaria em toda a cultura judaico-farisaica, até se tornar um zeloso defensor de seu povo e religião. Além disso, por duas vezes, ele faz referência à sua origem identificando-se como “hebreu” (2Co.11.22; Fp.3.5), uma designação mais específica que parece distinguir o judeu de família tradicional dos demais.
Em seu discurso perante o rei Agripa, Paulo descreve a rigidez da seita à qual pertencia (At.26.4-5). Paulo era de família farisaica, razão pela qual os pais logo cedo o fizeram ingressar na escola de sábios do famoso fariseu Gamaliel. Por três vezes, Paulo trouxe sua tradição passada à lembrança dos ouvintes. Na primeira ocasião (At.23.6), Paulo fez uso de sua tradição farisaica para conseguir o favor dos fariseus que estavam presentes, dividindo a opinião do Sinédrio, composto de fariseus e saduceus, diante dos quais seria ouvido e julgado. No segundo momento (At.26.4-5), Paulo expõe sua rica tradição judaica, introduzindo sua defesa perante o rei Agripa. Seu privilegiado berço, tanto judaico quanto romano, o serviu por diversas vezes, concedendo-lhe vantagens que não seriam dadas para um judeu “comum” (At.21.39; 22.25-30; 23.10,27; 28.30). Em Filipenses, Paulo, que já havia se revelado romano quando foi açoitado pelas autoridades (At.22.25-30), agora revela também seu prestígio entre os judeus, por ser de família tradicional abastarda (Fp.3.5). O zelo de Paulo pela tradição judaico-farisaica representa bem a seita a qual pertenceu, ainda que nem todos os fariseus tivessem comportamento semelhante (Mc.15.43; Jo.3.1-2; At.5.34; 15.5).
Mas, os dias de fariseu chegariam ao fim, pois a graça irresistível de Deus transformaria sua vida por completo. Se Paulo tentou resistir durante algum tempo a Verdade de que Jesus era de fato o Messias prometido por Deus, na estrada de Damasco ele não pôde mais resistir. Paulo caiu aos pés do Senhor Jesus como um soldado vencido. Cristo foi ao seu encontro enquanto Paulo o perseguia em seu ódio pela igreja de Jesus. Seu sentimento contra Jesus e a igreja era forte e ele estava decidido a destruí-la por completo. A fúria da multidão que matou Estevão parece ter aumentado ainda mais a revolta de Paulo contra os cristãos e, então, passou a assolar as casas aprisionando cristãos, independentemente de idade e sexo. Com esta aversão impetuosa, Paulo amplia sua perseguição para além das fronteiras de Jerusalém, a fim de extinguir por completo o cristianismo conhecido como a seita do Caminho (At.9.2). Seu ódio feroz e sua hostilidade selvagem moviam suas ações que, como um animal, eram desprovidas de qualquer correta reflexão. Todo seu conhecimento das Escrituras do Antigo Testamento não o levara à presença do Senhor, pois o véu ainda estava posto sobre ele.
A descrição dada por Lucas acerca do estado de Paulo antes de sua conversão demonstra quão grande foi a graça de Deus na vida daquele fariseu, e quão poderoso foi o agir do Espírito de Deus no coração e mente daquele que agia como um animal. O próprio apóstolo reconhece a magnitude da graça divina na sua vida ao se considerar o “principal” dos pecadores, pelo qual Jesus evidenciou sua completa longanimidade (1Tm.1.12-16). Antes que Paulo fizesse um estrago na igreja, Jesus interveio indo ao seu encontro no caminho para Damasco e, além de salvar os irmãos que haviam fugido para lá, mudou o rumo, conceitos e sentimentos do implacável perseguidor da igreja.
Paulo chega a Damasco humilhado, confuso, carregado pelos companheiros de viagem. Durante o tempo que ficou em Damasco, Paulo refletiu seus conceitos, sua compreensão sobre os textos do Antigo Testamento, sua motivação do coração, sua vida. Ele se consagrou a Deus em Jejum e oração, foi batizado, professando sua fé naquele que o aparecera, e, pouco tempo depois, tendo aprendido os fundamentos da fé cristã com os discípulos que o receberam em Damasco, Paulo começou sua jornada de pregação do evangelho de Jesus. O ex-perseguidor da igreja se via dentro da comunhão com o corpo de Cristo, vivendo entre os irmãos que antes perseguia. O coração odioso se encheu do amor de Deus e estava pronto para pagar o preço de ser discípulo de Jesus. Paulo, que havia sido enviado para prender cristãos, foi comissionado outra vez. Contudo, desta vez sua missão é anunciar o evangelho da graça de Deus que o alcançou.
O início do ministério de Paulo foi difícil, pois a igreja demorou um pouco para acreditar que de fato ele havia sido convertido (At.9.13,14,21,26). Após algum tempo, o último apóstolo de Jesus se retirou para a Arábia onde passou uma longa temporada sobre a qual não temos informações. Despois desse período, Paulo voltou para Damasco e retomou seu ministério de pregação da Palavra (Gl.1.17). O primeiro contato dele com os demais apóstolos ocorreu somente três anos após a sua chegada em Damasco (Gl.1.18). Neste encontro, Paulo é abençoado por eles para que continuasse a pregação do evangelho entre os gentios (Gl.2.9-10) . O evangelho que Paulo ensinava não foi aprendido diretamente com os discípulos de Jesus, que estiveram acompanhando o mestre durante seus três anos de ministério, mas mediante revelação direta de Cristo (Gl.1.12). É provável, apesar de não podermos afirmar com certeza, que Paulo tenha recebido diversas de suas revelações na Arábia, para onde ele se retirou sozinho.
Paulo tinha plena convicção de seu chamado da parte de Deus e ofereceu algumas características que o assemelhavam ao ministério dos profetas do Antigo Testamento: 1) Autoridade ministerial relacionada ao chamado divino (Gl.1.1,16-17//Is.6.1-8); 2) Separação para o ministério desde seu nascimento (Gl.1.15//Jr.1.5); 3) Consciência do caráter divino da mensagem veiculada (Gl.1.6-9//Ez.1.3); 4) Reconhecimento do ministério e mensagem por parte da igreja (Gl.2.6-10//Ed.5.1). Além disso, por causa das muitas acusações de seus adversários, ele defendeu a legitimidade de seu apostolado, pois à semelhança dos demais apóstolos, ele, também, foi separado por Deus para proclamar o evangelho com autoridade divina recebida do Senhor Jesus que o chamara pessoalmente para o ministério apostólico (At.9.1-9), tornando-o uma testemunha ocular do Cristo ressurreto (1Co.9.1). Sua mensagem não fora recebida de homens, mas do próprio Senhor Jesus que a revelara para ele (Gl.1.10-17).
Enviado pela igreja de Antioquia, Paulo acompanha Barnabé em sua primeira viagem missionária. Foi uma viagem curta, em relação às demais que ele faria. Consciente da primazia dos judeus com respeito ao evangelho, em cada cidade que Paulo ia, procurava uma sinagoga onde encontraria judeus praticantes e prosélitos. Na sinagoga Paulo teria a oportunidade para pregar o evangelho, provando-o pela Escritura do Antigo Testamento, explicando a vida e obra do Messias, “demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos; e este, dizia ele, é o Cristo, Jesus, que eu vos anuncio.” (At.17.3).
Porém, muitos dos judeus não só rejeitavam a mensagem como, também, o repudiavam de forma que, sendo rejeitado pelos judeus, Paulo se voltava para os gentios que estavam recebendo o evangelho com alegria. Muitos gentios se convertem no curso desta primeira viagem missionária e, assim, igrejas foram plantadas em diversas cidades, contribuindo com o avanço do evangelho pelo mundo. Aos poucos o cristianismo-judaico estava se tornando um cristianismo-gentílico. Paulo compreendeu que esse era seu ministério: pregar o evangelho para os gentios. Esse fenômeno promoveu ciúmes nos judeus-cristãos que não haviam se desvencilhado dos rituais da Lei mosaica, como exigências para a salvação. Assim, além de contribuir com o avanço do cristianismo, a viagem missionária de Barnabé e Paulo, também, teve um importante papel no amadurecimento do cristianismo que em sua primeira reunião conciliar realizada em Jerusalém (At.15.1-29), decide que os gentios não deveriam ser incomodados com as exigências da Lei mosaica, como critério para a salvação.
Paulo e Barnabé retornam para a igreja em Antioquia levando a boa notícia da decisão do concílio em Jerusalém (At.15.22-31). Pouco depois, Paulo decide retornar às igrejas, fortalecendo-as. Mas nesta segunda viagem, Ele e Barnabé decidiram seguir caminhos diferentes. A partir da segunda viagem missionária, o apóstolo levaria consigo outros companheiros na obra do Senhor, e Silas foi o primeiro deles. Suas viagens se tornaram cada vez mais amplas e difíceis. Em todas as viagens de Paulo, os judeus se opuseram ao seu trabalho missionário, criando problemas e trazendo sofrimento para o apóstolo.
Contudo, Paulo não desistiu, cumprindo três papeis fundamentais em suas viagens missionárias: 1) Ele ampliou os horizontes do cristianismo, levando o evangelho cada vez mais adiante. Por meio de suas viagens, a igreja alcançou além das fronteiras de Roma. Além disso, o evangelho veiculado por ele alcançou tanto plebeus quanto reis, tanto homens quanto mulheres, tanto escravos quanto livres. Com seu comportamento amável e exemplar, sua dedicação ímpar e preocupação com todas as pessoas, seu amor à Verdade e esperança da vida eterna, Paulo conseguia dialogar com qualquer pessoa, e conseguia fazer Cristo conhecido com clareza e sabedoria. 2) Ele, também, cumpriu um importante papel no fortalecimento das igrejas ao supervisionar os cristãos, acompanhando-os, de perto e de longe, cuidadosamente; garantindo a manutenção da vida cristã em todas as igrejas, a fim de que aqueles que creram se mantivessem firmes na fé, no amor e na esperança do Senhor Jesus. Suas treze cartas são o resultado de todo o cuidado que ele tinha com as igrejas não as deixando, mesmo que não pudesse acompanha-las de perto. 3) Por fim, Paulo preparou e elegeu presbíteros para pastorear as igrejas e lutar contra as diversas formas de heresias que estavam surgindo dentro e fora do ambiente eclesiástico (At.20.17-38). Paulo tinha o cuidado de deixar sentinelas prontas para lutar pela fé, resistindo os falsos profetas que tentavam perturbar a igreja. Portanto, a contribuição do apóstolo Paulo fez o cristianismo crescer e, também, se fortalecer, tornando-se capaz de resistir aos constantes ataques dos falsos mestres.
Outra indispensável contribuição do apóstolo Paulo é seu legado escrito. Em número de cartas, Paulo foi quem mais escreveu no Novo Testamento. Por meio de suas epístolas, Paulo pastoreou as igrejas, lutou contra feras, amou seus filhos na fé e educou os cristãos para uma fé madura e uma conduta coerente com o evangelho no qual tinham crido. Paulo nos deu uma visão geral do evangelho ao ensinar toda a doutrina da salvação, desde a realidade universal de que todos os homens são pecadores indispostos para com Deus. Ele demonstrou com maestria a incapacidade da Lei para salvar o pecador e apontou com precisão o único caminho para a salvação: Jesus. Além disso, Paulo confortou a igreja ensinando a graciosa eleição do Senhor que se manifesta na conversão dos pecadores amados por Deus em Cristo Jesus. Assim Paulo trouxe luz sobre o Antigo Testamento, explicando com detalhes o projeto redentor de Deus, que desde Gênesis é paulatinamente revelado a nós.
Paulo trouxe para o cristianismo a revelação dos mistérios de Deus que estavam ocultos no passado. Ele explica o advento escatológico de Cristo e sua implicação para o mundo, principalmente para os que creem. Por meio das cartas paulinas, é possível se compreender a dimensão do Reino de Deus, que “não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo” (Rm.14.17). Além disso, ele aplica a chegada do Reino à vida da igreja, preparando-a para o desfecho deste período presente chamado de “últimos dias” (2Tm.3.1): a volta de Cristo. Nenhum outro dos apóstolos trouxe para o cristianismo tantas contribuições. Não é, portanto, sem razão que a vida e obra de Paulo são tão estudadas desde os primórdios, motivando cristãos para as missões, esclarecendo teólogos com respeito aos mistérios revelados por Deus, desafiando a igreja a viver uma vida para a glória do Senhor. E um dos propósitos de toda esta contribuição é motivar você a viver uma vida mais intensa com Deus.

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